Confirmando o que já havia dito na semana anterior, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP – AL), afirmou novamente nesta terça-feira (25) que o Projeto de Lei nº 2.630/2020 (o PL das “Fake News”) será colocado em pauta para votação no plenário da casa legislativa ainda essa semana.
A primeiro momento, Lira pretende que seja votado o regime de urgência do projeto de lei. Uma vez aprovado esse rito especial, o PL seria pautado para a votação diretamente no plenário da Câmara, sem a necessidade de passar por deliberações em comissões legislativas específicas.
Em outras palavras, Arthur Lira (com o apoio de inúmeros parlamentares) está se utilizando do mecanismo antidemocrático do regime de urgência para blindar o PL das “Fake News” de qualquer debate público, até mesmo um debate no âmbito do Congresso Nacional. Ou seja, está tentando aprovar o projeto de lei ao alvedrio de qualquer controle democrático, por parte da população.
Muito embora este Diário tenha ciência das limitações da Câmara dos Deputados como órgão representante dos interesses da população, e dos mecanismos utilizados para a elaboração e aprovação das leis brasileiras, o fato é que o regime de tramitação de urgência é utilizado para impedir o debate. É utilizado para aprovar leis na calada da noite, pelas costas do povo brasileiro.
E é isto que está sendo feito agora, com o PL das “Fake News”.
Mas por que razão fazer isto?
O projeto de lei em questão é um gigantesco ataque contra a liberdade de expressão e manifestação do pensamento, direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988, e conquistado pela humanidade após séculos de lutas travadas, suor vertido e sangue derramado pelos povos explorados de todo o mundo.
Deixando mais claro, o PL das “Fake News” irá instituir um regime de estrita censura e vigilância nas redes sociais, pavimentando o caminho para um futuro regime fascista no Brasil.
Em seus artigos, o projeto literalmente determina que as companhias donas das redes sociais, as Big Techs, serão obrigadas a fornecerem ao Estado Burguês brasileiro informações detalhadas sobre seus usuários que agirem de forma “irregular” (é deixado em aberto o que seria irregular), devendo fazer “relatórios de transparência” trimestrais. Dispõe ainda que as informações poderão ser utilizadas para fins de investigação criminal e instrução processual penal.
E qual é a justificativa utilizada pelos defensores do PL das “Fake News”? Dizem que a liberdade de expressão não é absoluta.
Que é preciso estabelecer limites.
Desde que o projeto foi elaborado, utilizaram várias desculpas diferentes para justificar os limites a essa liberdade de expressão.
À época, em 2020, havia a pandemia da COVID-19. Todos deveriam aceitar calados a política do “fica em casa” e a confiabilidade das vacinas. Não se podia questionar, pois questionar era ser contra a “ciência”, era ser negacionista, era ser bolsonarista. Assim, a burguesia conseguiu instituir um regime de relativa censura. E o que a esquerda fez? Apoiou e ajudou a burguesia a intimidar aqueles que se opunham, como, por exemplo, este diário.
Como o arrefecimento da pandemia, mas com o aprofundamento da polarização social e o crescimento da extrema direita, a burguesia e a direita tradicional viram a necessidade de travar uma relativa perseguição a elementos secundários do Bolsonarismo, cerceando seus direitos democráticos e aprofundando o regime de censura que já começava a vigorar no Brasil. A desculpa? Combate ao fascismo. Novamente, este diário alertou a todos que essa política repressiva deveria ser combatida, que a liberdade de expressão deve valer para todos, caso contrário é um privilégio. Alertou, inclusive, que o aprofundamento da repressão iria se voltar contra os trabalhadores e suas organizações. O que a esquerda fez? Apoiou a burguesia na sua política de censura.
E o próximo capítulo da censura do Estado Burguês brasileiro? Censurou o Partido da Causa Operária, derrubando todas suas redes sociais, com centenas de milhares de seguidores, às vésperas das eleições presidenciais de 2022. Inseriu-o no inquérito das “Fake News”, processo sigiloso do qual o partido nunca teve conhecimento de seu conteúdo. Qual foi a desculpa utilizada? O partido propôs uma reforma institucional, pela dissolução do Supremo Tribunal Federal, e isto seria um ataque ao Estado Democrático de Direito. Suas redes permaneceram suspensas até março desse ano de 2023, quando foram restauradas, sem mais nem menos. O dano já estava feito, contudo. Neste caso, vários setores da esquerda manifestaram sua solidariedade de condenaram a censura. Contudo, alguns se calaram.
Agora, cá estamos. A tentativa de aprofundar um estado de censura e a vigilância segue a todo vapor. Quais são as justificativas da vez? O 8 de janeiro e, principalmente, os ataques às escolas.
Segundo aqueles que justificam a necessidade de se censurar e vigiar as redes sociais, as pessoas que invadiram o palácio do planalto no dia 8 de janeiro, e as pessoas que cometeram os ataques às escolas só conseguiram fazer isto por terem sido previamente estimuladas e coordenadas através das redes sociais.
Assim, as redes sociais teriam que ser postas sob constante censura e vigilância por parte do Estado. Aliás, as próprias empresas donas das redes teriam que realizar essa censura e essa vigilância, prestando contas ao Estado.
A burguesia colocou em moção todo seu aparato para aprovar o PL das “Fake News”. Na imprensa, a defesa do projeto, de sua tramitação de urgência e de sua aprovação é diuturna. Em editorial publicado hoje (25), o jornal o Globo é expresso ao emitir sua posição: “Os eventos do 8 de janeiro e os ataques recentes em escolas deixaram claro que é preciso agir com presteza. O Brasil não pode permitir que as redes sociais continuem a ser usinas de desinformação e violência“
E a esquerda, o que diz? Bem, o relator do projeto é Orlando Silva, deputado federal pelo PCdoB. Em outras palavras, a burguesia está se aproveitando pelo menos uma pessoa aparentemente de esquerda para facilitar aprovação de um gigantesco ataque aos direitos democráticos do povo brasileiro.
Outra pessoa que tem aparência de esquerda perante a sociedade, e que tem defendido com unhas e dentes a censura nas redes sociais, e o aumento da vigilância estatal é o Ministro da Justiça, Flávio Dino, o que é extremamente grave, pois é um porta voz oficial do governo Lula.
Ao aparecer como defensor de um Projeto de Lei de caráter ditatorial, o presidente Lula tende a perder apoio popular, o que deixa seu governo mais frágil do que já está perante os ataques da direita.
Vendo a oportunidade, a extrema-direita já partiu para o bote. Estão em uníssono condenando o PL das “Fake News”. Mas não são apenas eles. Elementos execráveis da direita tradicional, altamente oportunistas, aproveitaram suas chances para se lançarem contra o governo, e passaram a falar contra o projeto de lei. Sergio Moro e Rosângela Moro disseram que é uma medida antidemocrática, que o governo tenta criar um “Ministério da Verdade” (em alusão ao livro 1984, de George Orwell).
Estas últimas declarações são extremamente sintomáticas. Se até os Moro estão posando de democráticos, é porque o governo está cometendo um grave erro em não se opor de forma veemente a ao PL das “Fake News”.
Quando a população começar a sentir as consequências dessa lei, os golpistas irão capitalizar contra o presidente Lula, a esquerda e todas as organizações populares.
Por falar no restante da esquerda, como ela está se posicionando? Não está. No período anterior, ajudou a pavimentar o caminho da censura que estamos vivenciado. Agora, está calada. Apenas um grupo ou outro se posiciona contra o aumento da repressão estatal, da censura e da vigilância nas redes. Nessa toada, o projeto será aprovado, e se tornará lei, assim como aconteceu com a lei antiterrorismo. E a tragédia se repetirá como farsa. Aliás, se repetirá como uma tragédia potencializada.
Assim, para que se evite esse desenlace é necessário que toda a esquerda, todas as organizações populares se mobilizem em uma ampla campanha em prol dos direitos democráticos da população, em especial o direito à irrestrita liberdade de expressão e manifestação do pensamento.
Não à censura e à vigilância.
Não ao PL das “Fake News”!