
O conhecido aforismo de Friedrich Nietzsche, em um fragmento de 1887, onde afirma que “não existem fatos, apenas interpretações”, deve ser entendido como a submissão do real ao simbólico, a ideia de que a verdade não existe como um ente absoluto e positivo e, acima de tudo, como um alerta crítico de que a verdade não é definitiva, muito menos imutável, e que o que consideramos verdade hoje merece ser criticado e sofrer o devido contraditório. Muitas vezes estas verdades sólidas se desmancham no ar, necessitando para isso apenas a passagem do tempo. Afinal, o que é uma mentira? Se houvesse uma Verdade Absoluta – e portanto mentiras definitivas – quem decide sua essência e como ela se configura? Quem são os vestais, acima do bem e do mal, que podem objetivamente decidir o que é verdadeiro e o que não é?
É disso que se trata agora, quando tantos afirmam serem favoráveis à censura para barrar as mentiras disseminadas pelas redes sociais. Quanto mais você retira essa decisão do povo e a coloca sob o escrutínio das instituições do Estado burguês – um sistema de poder criado para calar as ambições populares – mais a esquerda será penalizada, mesmo que circunstancialmente a extrema direita possa estar sofrendo seu ataque.
A censura sempre vai favorecer os poderosos, e negar isso significa não compreender a origem e a estrutura da própria democracia liberal. Estimular a censura (mesmo quando maquiada de democracia e até quando bem intencionada) é uma estratégia conservadora, que fatalmente acaba se voltando contra as aspirações do povo. A lei anti terror, a lei da ficha limpa, a lei contra fake News…. todas elas foram aparentemente bem intencionadas e chegaram até ser usadas para punir membros da direita, mas todas – mais cedo ou mais tarde – acabaram sendo usadas para atacar as forças políticas populares e de esquerda. Lula, por exemplo, foi atacado, punido e impedido de concorrer às eleições de 2018 pela lei da ficha limpa. Poderíamos pensar que, talvez, desde o início ela foi pensada para, eventualmente, ser usada contra a esquerda em uma situação limite – como a volta de um líder popular ao governo do Brasil.
Não podemos ser vítimas dessa farsa… mais uma vez.
Artigo publicado, originalmente, em 01 de fevereiro de 2023.