Por quê estou vendo anúncios no DCO?

Entrevista

Lejeune Mirhan ao DCO: “EUA destruíram o Estado iraquiano”

Após 20 anos de invasão, o analista internacional e sociólogo Prof. Lejeune Mirhan teme que o Iraque nunca mais consiga se reconstruir. A seguir, a entrevista exclusiva ao DCO

Os Estados Unidos “destruíram o Estado nacional iraquiano, pilharam o seu petróleo e privatizaram a sua economia: empresas estatais foram entregues para companhias americanas a preço de banana”, denuncia Lejeune Mirhan.

Analista internacional especializado na política do Oriente Médio, Lejeune é comentarista fixo da TV 247, da TVT e da DCM TV e tem sido convidado do programa Análise Internacional, no canal do DCO no Youtube. É autor do livro, entre outros, “Iraque: cronologia de uma ocupação (2002-2007)”.

Nesta entrevista ao DCO, ele analisa alguns aspectos da invasão e posterior ocupação norte-americana do país árabe e condena os crimes cometidos pelo imperialismo contra o povo iraquiano.

Diário Causa Operária: Os EUA acabaram de divulgar o relatório sobre a situação dos direitos humanos no mundo. Mas no Iraque os EUA demonstraram que são os campeões de violações dos direitos humanos. Como o senhor vê isso?

Lejeune Mirhan: Esses relatórios são farsas. Os EUA são os maiores violadores dos direitos humanos no mundo. O maior exemplo disso é a prisão de Guantánamo, em território cubano que os EUA ocupam, contrariando a legislação internacional. Lá eles torturam os presos até à beira da morte para arrancar informações. E isso é generalizado no mundo inteiro. Sempre onde os EUA têm bases militares e centros de informação, ocorrem denúncias de violações de direitos humanos. Portanto, esses relatórios são uma farsa.

DCO: Os EUA cometeram violações dos direitos humanos também no Iraque?

LM: As violações de direitos humanos no Iraque pelos EUA são amplamente documentadas. Hoje mesmo eu li um artigo em um site conservador, muito aprofundado, que relembra o estupro das mulheres iraquianas pelas forças armadas dos Estados Unidos. Relembra ainda o maior escândalo da ocupação ocorreu na prisão de Abu Ghraib em 2006, onde os soldados estadunidenses torturavam os presos iraquianos, não davam alimentação aos presos, que chegavam a ficar em cima de latas durante horas, recebendo choques elétricos. E isso foi um escândalo mundial naquela época. Então, em relação ao Iraque, particularmente, os EUA não têm moral nenhuma para falar em violação dos direitos humanos. Essa onda sobre os direitos humanos é uma forma de ingerência interna em assuntos de países governados por opositores do imperialismo, porque onde os EUA têm amigos no governo, como na Arábia Saudita, eles não falam absolutamente nada sobre violações de direitos humanos.

DCO: A mesma farsa a gente vê com relação às tais fake news. Os EUA seriam seus grandes combatentes, mas a invasão do Iraque surgiu de uma grande fake news, não é?

LM: Eu acho que a campanha de mentiras pode ser considerada o aspecto-chave deste século XXI. Mesmo que se consiga desmentir uma mentira, como é que se recupera o estrago já feito sobre a imagem de uma pessoa, de uma instituição, de um partido, de um governo quando essa mentira já se tornou generalizada? O caso mais escandaloso é o do próprio presidente Lula, que teve contra si cerca de 80 horas no Jornal Nacional e 70 capas da revista Veja propagandeando mentiras contra ele. Não há um consenso de como você regula essas falsidades. Nas redes sociais também. O governo do presidente Lula pretendo regulamentar esse tema através de uma lei federal. 

DCO: Mas quando os EUA invadiram o Iraque, praticamente ainda não havia redes sociais. Os EUA conseguiram vender suas mentiras contra Saddam com ajuda principalmente dos canais de TV como a CNN, foi muita mentira da imprensa americana e internacional, não?

LM: Foram duas as grandes mentiras contra o Iraque, que não eram veiculadas prioritariamente pelas redes sociais, mas sim pelos monopólios de grandes corporações como a BBC, AFP, CNN, ABC, Fox News, Reuters etc. Uma delas é que o Iraque seria portador de armas de destruição em massa. A segunda grande mentira era que Saddam Hussein seria o financiador e apoiador da al-Qaeda. Mentiras que não foram verificadas antes de serem espalhadas como se fossem notícias. E mesmo após ficar claro que não havia provas, os EUA não saíram do Iraque. Mas quem tem essas armas de destruição em massa, inclusive químicas, bacteriológicas e atômicas são os Estados Unidos, que já usaram várias vezes. Todos sabem que dos 19 sequestradores dos quatro aviões em 2001, 18 deles tinham nacionalidade saudita, que era (e é ainda hoje) um protetorado dos EUA. Essas duas mentiras foram responsáveis pela destruição do Iraque, pela matança de entre dois e três milhões de pessoas desde a agressão de 1991 (nos anos 1990, devido ao bloqueio, morreram de fome no mínimo meio milhão de crianças). Estima-se que 15 mil artefatos arqueológicos foram roubados de museus nacionais iraquianos, sendo o Iraque, ele mesmo, uma espécie de enorme museu. E apenas metade desses artefatos foi recuperada. Isso sem falarmos nos três trilhões de dólares que os EUA jogaram fora nessa invasão. 

DCO: Quais os verdadeiros motivos por trás da invasão?

LM: O principal era prender e assassinar o presidente Saddam Hussein. Removê-lo da liderança do Iraque. E conseguiram, após um julgamento farsesco. Um segundo motivo era tomar conta do petróleo iraquiano. Os EUA dissolveram o exército iraquiano e deixaram o país sem governo, colocaram na clandestinidade o Partido mais antigo do país, que governou o Iraque por mais de 50 anos, o Partido Socialista Árabe Baath. Destruíram o Estado nacional iraquiano, pilharam o seu petróleo e privatizaram a sua economia: empresas estatais foram entregues para companhias americanas a preço de banana.

DCO: Os iraquianos resistiram à ocupação?

LM: Sim, houve uma grande resistência. Em um primeiro momento houve resistência do então aparato governamental de Saddam e do Baath, resistência inclusive armada. O grupo minoritário, que se dizia oprimido durante o governo Saddam, os xiitas, tacitamente demonstrou uma certa concordância com a ocupação porque foi a única forma que encontraram de tirar do poder o grupo que os oprimia. Eu não concordo com esse posicionamento, mas ocorreu por um curto período. Os xiitas não ofereceram inicialmente a mesma resistência dos baatistas, mas depois as coisas se inverteram. Todos os governos eleitos (o primeiro deles, alguns anos após a invasão, porque primeiramente os EUA haviam nomeado um interventor-geral que atuava como um vice-rei do Iraque) após a invasão eram xiitas. E os xiitas acabaram por exigir a desocupação do país.

DCO: Como está o Iraque 20 anos depois? É um país democrático, como os EUA supostamente queriam?

LM: Eu não posso dizer que é um país democrático. Não existem as amplas liberdades democráticas no Iraque hoje em dia. As liberdades são parciais. Eu não tenho registros de que o Partido Comunista do Iraque, por exemplo, tenha plena liberdade de atuação, ao contrário do que ocorre na Síria, onde existem dois partidos comunistas legalizados, com membros no Parlamento e inclusive em ministérios do presidente Bashar al-Assad. Eu não vejo o Iraque, hoje, como um exemplo de um país democrático, mas se encaixa na luta contra o imperialismo encabeçada pelo Irã dentro do Oriente Médio.

DCO: O Iraque já conseguiu se reconstruir após a destruição?

LM: Não. E não sei se um dia conseguirá. Porque o estrago foi muito grande. O prejuízo cultural, arqueológico e histórico não tem recuperação. Além disso, o atendimento que o Estado iraquiano concedia à sua população até a invasão de 2003 nunca mais voltou ao mesmo patamar.

Gostou do artigo? Faça uma doação!

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Quero saber mais antes de contribuir

 

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.