Na matéria “‘Vingadores’ do STF devastam extrema-direita”, publicada no Brasil 247, nesta terça-feira (9), Eduardo Guimarães produz um texto que pode muito bem estar em um filme da Marvel, pois há ali muita ficção.
Segundo o texto, “A política brasileira tem ao menos três ‘vingadores’ que desmontaram o processo golpista e fascista que se abateu sobre nós em 2013 e não parou mais até derrubar Dilma e encarcerar Lula. Através deles, a democracia resiste às ameaças”. A primeira questão a ser colocada é que antes de ‘desmontarem’ o processo golpista – nem isso é verdade –, os membros do STF ajudaram a montar o golpe e o fascismo que se abateu sobre nós.
Após essa introdução quase épica, Guimarães afirma que “A bem da verdade, há que reconhecer que o STF falhou no alvorecer do soerguimento da extrema-direita no Brasil, dando milho aos fascistas com o inacreditável julgamento do ‘mensalão’”. Falso, o STF não falhou, cumpriu exatamente o que a ele foi determinado: eliminar os direitos e garantias constitucionais dos cidadãos para eliminá-los politicamente.
O mito da caverna
Para Guimarães“Demorou mais de uma década, a partir de 2005, para que a então única cabeça lúcida daquele Tribunal, o ministro Ricardo Lewandowski, provasse aos seus pares que havia um processo de fascistização do Sistema de Justiça brasileiro”. Nisso, acredita quem quiser.
Quer dizer que dez ministros do Supremo estavam presos em uma caverna, sem saber o que se passava no mundo real, até Lewandowsky, o único que tinha visto a luz do sol, retorna para salvar os amigos da ignorância? Uma espécie de Alegoria da Caverna com final feliz.
Em seguida, Eduardo Guimarães passa a comentar sobre o escândalo da Vaza Jato, quando se desmascara a quadrilha formada por Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e “procuradores do MPF do Paraná e magistrados do Sul do país que usaram lawfare contra um partido político e seu líder maior”.
“A partir dali, o STF, agora sabendo desse projeto fascista, converteu-se na única barreira contra ele”. Esse é aquele momento do filme que a gente acha que perdeu alguma coisa e precisa voltar um pouco atrás para saber o que estava acontecendo, pois o STF estava atolado até o pescoço nessa história. Faz pouquíssimo tempo que Gilmar Mendes fez um mea-culpa, meio que ‘se arrependendo’ de ter impedido Lula de assumir a Casa Civil no governo Dilma e assim ter entregado a cabeça de Lula numa bandeja para Sérgio Moro. O Supremo, que supostamente deveria zelar pela Constituição, não fez absolutamente nada contra a Lava Jato, até ajudou.
Seguindo o roteiro “o Tribunal foi o que nos impediu de cair no abismo nazifascista que se abriu sob os nossos pés a partir da eleição, como presidente, de um político com perturbadoras ligações com o crime organizado e o neonazismo”. E aqui temos de explicar que esse presidente só foi eleito porque os STF, reduzindo a Constituição a cinzas, votou pela prisão de Lula, e impediu que este se candidatasse à presidência mesmo sub judice. Foi isso, e não disparos massivos de mentiras pelo WhatsApp que elegeram Bolsonaro.
E, como se não bastasse, ainda lemos que “É nesse contexto que surgiram dois outros “vingadores”, no STF, que vêm dando duro e eficiente combate às perversões orquestradas por Sergio Moro, Deltan Dallagnol e Jair Bolsonaro”. Ficou faltando explicar se esses dois chegaram voando de capa e com uma roupa colada no corpo, ou se pegaram uma carona no avião invisível, não da FAB, mas da Mulher Maravilha. Pelo menos dá um certo alívio saber que o trio recém-formado (Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Lewandowski) vencerem o lavajatismo porra-louca de Luiz Fux, Edson Fachin e Luis Roberto Barroso e os fizeram enxergar que esse mesmo lavajatismo era responsável pela fascistização da política brasileira.
Um mal ameça o Planeta
Todo filme de vingadores ficaria incompleto se não tivesse aquela ameça de acabar com a Terra. Por isso que “Os livros de história relatarão esse período vibrante e divisor de águas em um país que ainda se vê ameaçado por um vírus político-ideológico que assusta a humanidade: o recrudescimento do nazismo em escala mundial”. Com a diferença que essa ameaça não é extraterrestre, foi criada nos laboratórios da burguesia, a mesma que controla o STF.
O autor da matéria diz que “Gilmar desmascarou a Lava Jato e reverteu os crimes contra o atual presidente da República, Alexandre de Moraes livrou o Brasil das fraudes eleitorais de Bolsonaro”. Moraes estabeleceu uma ditadura judiciária no País. Proibiu qualquer um de sequer questionar o processo eleitoral, ameaçando com cadeia quem não obedecesse; bloqueou as redes sociais de um partido em pleno ano eleitoral e ainda assim é herói? Não se conhece no mundo nenhum sistema eletrônico à prova de fraudes, mas o Brasil tomou um cala-boca do paladino da Justiça Alexandre de Moraes.
O bem vence mais uma vez
Chegamos naquele momento do filme em que tudo se encaminha para o final feliz. Gilmar Mendes “deu indícios de que o STF não vai parar por aí e que tanto Moro quanto Bolsonaro responderão por seus crimes” e “insinuou que haverá investigação da suposta ‘laranja’ de Moro (sua mulher, Rosangela) e que Bolsonaro deve mesmo ser preso”.
“Moro e Dallagnol estão sendo investigados pelo STF com base nas denúncias de Tacla Duran, e Bolsonaro está sendo investigado por uma montanha de crimes no mesmo Tribunal. E quem acha que tudo isso é vento, vai se surpreender”. E assim o público já fica avisado que virá por aí a continuação, em breve teremos um “Vingadores 2”.
O único ‘mistério’ que fica é entender como que para certos setores da esquerda um Alexandre de Moraes, cuja indicação para o Supremo – feita por Temer –, passou de vilão a super-herói.
A esquerda tem na classe trabalhadora a única força capaz de enfrentar a burguesia. Apresentar uma instituição do Estado burguês como detentora do papel de lutar contra o fascismo é uma inversão de papéis e completa distorção da realidade.
