Em delação premiada à Polícia Federa, o ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, o tenente-coronel do Exército Mauro Barbosa Cid relatou ter presenciado reuniões entre Bolsonaro e a cúpula das Forças Armadas parar tratar do golpe militar. O plano, segundo a delação de Cid divulgada pelo jornal golpista O Globo (“Em delação, Mauro Cid revela que Bolsonaro fez reunião com cúpula militar para avaliar golpe no país”, Bela Megale, 21/9/2023), era impedir a troca de governo, o que não ocorreu. Ainda segundo a colunista, a delação de Cid indica que o almirante Almir Garnier Santos, na época comandante da Marinha, teria apoiado os planos golpistas, diferente do comando do Exército, que na ocasião, se opôs. Sendo criminoso o teor da conversa (como quer fazer crer a imprensa burguesa), mesmo os militares que supostamente não apoiaram a realização de um golpe teriam de denunciá-lo, o que não foi feito e os torna passíveis de responder por prevaricação.
Comprovando-se os eventos narrados por Cid, fica a dúvida: o regime irá prender a cúpula militar? Ou toda a histeria criada pela suposta “defesa da democracia” serve apenas para pobres, como o ex-funcionário da Sabesp, a manicure e outros participantes do 8 de janeiro da mesma estirpe social?
Na ânsia por manter o controle do regime político, os setores mais poderosos da burguesia tem empreendido uma verdadeira caçada à extrema-direita, buscando alijar o campo de suas lideranças e assim, trazê-los de volta ao seu domínio. Ocorre que como aprendizes de feiticeiro ineptos, acabaram longe demais e agora, precisam dar uma definição para a política adotada no último período: manter a perseguição a Bolsonaro, sendo para isso obrigada a prender generais da cúpula das Forças Armadas, ou parar onde está e buscar outros meios para enquadrar o bolsonarismo.
A primeira opção é problemática por diversos fatores: já em agosto, os generais reclamaram da “instabilidade e insegurança nas Forças Armadas”. Para não afirmá-lo diretamente, os militares usaram o espaço da colunista do Estado de S. Paulo, Monica Gugliano, para expressar que “a PGR estaria ‘tripudiando’ e que essas ações têm um limite, a partir do qual não seria fácil acalmar nem o oficialato e nem tampouco os militares abaixo da linha de comando” (“Militares veem Justiça esticando a corda e gerando instabilidade e insegurança nas Forças Armadas”, 18/8/2023).
A reação dos quartéis fora causada pela prisão de militares pedidas pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que em 18 de agosto, prendeu sete membros da cúpula da Polícia Militar do Distrito Federal, incluindo o comandante da PM em Brasília, Klepter Rosa Gonçalves. Ainda na coluna supracitada, os generais declaram que “entre os militares, existe a percepção é de que há exagero e descontrole nessas prisões”.
A outra opção da burguesia – parar a perseguição a Bolsonaro -, no entanto, não é mais fácil. Uma pesquisa do Datafolha divulgada no último dia 15 mostra que mesmo submetido a uma intensa campanha e perdendo os direitos políticos, o ex-presidente continua sendo o principal nome da direita brasileira, sendo preferido por 25% dos eleitores entrevistados pelo órgão de pesquisa.
Como não se pode afirmar categoricamente nada a respeito dos dados, tais pesquisas não merecerem muito crédito pelo que dizem, mas pelo que indicam e aqui, é preciso ter claro que se o Datafolha coloca quase um terço do eleitorado brasileiro no bolsonarismo, é evidente que a direita nacional continua apoiando o ex-presidente. Parar a caça a Bolsonaro, a essa altura, deixaria o falido centro político (capitaneado sobretudo pelo PSDB) em uma crise ainda maior.
A evolução da conjuntura política coloca a burguesia em um impasse, entre abrir uma crise com os militares cujo desfecho é imprevisível ou revelar a farsa da campanha em defesa da democracia, e com isso, se ver obrigada a render-se ao bolsonarismo, colocando a pá de cal que faltava na direita tradicional. Ao contrário do que apregoa um setor da esquerda, os trabalhadores não devem seguir os distintos campos da burguesia em disputa, mas se opor às arbitrariedades cometidas até aqui.
Mais do que isso, as organizações de luta dos trabalhadores devem ter a clareza de que a crise atual obrigará uma ação da classe trabalhadora, que deve desde já estar mobilizada para não ser esmagada quando a direita e a extrema-direita chegarem a um acordo. Independentemente do desfecho do impasse, seu custo recairá sob as costas do proletariado.