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Ditadura Militar

Debate na UFPE exige comissão da verdade da universidade

Evento organizado pelo professor Évson Malaquias contou com a participação de partidos políticos e organizações do movimento popular

Na noite da última quarta-feira (12), as poltronas do auditório Carlos Maciel deram lugar a uma plateia revoltada com o passado e o presente. Com o passado, porque cada vez mais se dá conta de que a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde fica o auditório, foi uma das milhares de instituições que a ditadura militar utilizou para levar adiante a sua política truculenta de vigilância e repressão. Com o presente, porque as feridas daquele período seguem abertas até hoje, simbolizadas perfeitamente no nome do próprio auditório, que homenageia um dos homens da ditadura.

E foi o nome do auditório o início de toda a história que culminaria nos acontecimentos daquela noite.

Em 2021, Évson Malaquias, um pacato professor do Departamento de Administração Escolar e Planejamento Educacional, se deu conta de que o auditório do Centro de Educação homenageava um homem hoje desconhecido, mas que havia sido um dos responsáveis por defender os interesses da ditadura militar na UFPE. Carlos Maciel era irmão do reitor imposto pela ditadura, Paulo Francisco Maciel, e primo do político Marco Maciel, um dos principais apoiadores do regime no estado de Pernambuco. Nomeado interventor no Movimento de Cultura Popular (MCP) pelos militares, Carlos Maciel tinha posições abertamente anticomunistas e foi um dos comandantes da perseguição aos métodos implementados por Paulo Freire.

Com o resultado de sua pesquisa, feita sobretudo junto ao Arquivo Público Nacional, ao Arquivo Púbico do Estado de Pernambuco e aos arquivos do DOPS, Évson iniciou um movimento, entre alunos e docentes, para propor à Universidade a mudança do nome do auditório. Antes que o movimento tomasse corpo, Évson foi surpreendido com um processo de sindicância e com uma série de condutas persecutórias por parte da instituição. Conforme o professor já havia denunciado em entrevista à Rádio Causa Operária e à Rádio Cultura de Curitiba, nem mesmo sua advogada teve acesso integral aos processos pelos quais está sofrendo, em um caso de arbítrio semelhante ao modus operandi da Operação Lava Jato.

Foi devido a essa bagagem que o que aconteceu na noite de 12 de abril foi muito além de uma mera atividade acadêmica. Tendo como proposta inicial de ser um debate de título “Ditadura de 64 e seus homenageados em órgãos públicos: o caso do auditório do Centro de Educação da UFPE Carlos Maciel”, a atividade acabou por juntar uma rápida exposição de algumas descobertas de Évson em suas pesquisas nos arquivos públicos sobre a ditadura militar, um debate atual sobre o papel dos militares no regime político hoje, uma demonstração do repúdio da sociedade às homenagens à ditadura, um ato em solidariedade a Évson e, sobretudo, o início de um movimento político com o objetivo de combater a tutela militar nos dias de hoje.

Na fala inicial, Évson já introduziu propostas que indicam um caminho concreto, ainda que limitado, para o movimento. O professor propôs que o evento fosse o início de um movimento por uma Comissão da Verdade da UFPE, que passasse a limpo todos os crimes cometidos pela ditadura e expusesse os defensores do regime e homenageasse suas vítimas. Évson ainda propôs que todos os oradores se posicionassem a favor da mudança do nome do auditório e que o novo nome fosse escolhido em um processo com ampla participação da comunidade.

Após a fala de Évson, seguiram os discursos das organizações e partidos políticos. Mangue Vermelho, PCB, PSTU, POR, UP e PSOL mostraram acordo com as propostas de Évson e procuraram, à sua maneira, relacionar a ditadura militar com problemas políticos do presente. Uma representante da Associação Brasileira dos Advogados do Povo (Abrapo) destacou particularmente o retrocesso que a ditadura trouxe à luta no campo, mencionando as dificuldades que vivem hoje os companheiros da luta pela terra. Cajá, dirigente antigo do PCR cuja prisão durante a ditadura foi tema de um livro de Évson, fez uma longa fala descrevendo os tempos da repressão a partir de sua própria experiência. O escritor Joaquim Magalhães, também presente, por fim discorreu sobre a composição atual das Forças Armadas, detalhando a ditadura dos generais sobre os soldados.

Representando o Partido da Causa Operária (PCO), Victor Assis, membro de seu Comitê Central, destacou que a perseguição a Évson jogava luz sobre a necessidade de a esquerda fazer uma ampla campanha em defesa dos direitos democráticos da população, como a liberdade de expressão. Afinal, políticas repressivas, como a “cultura do cancelamento”, estão contribuindo para instaurar um clima permissivo com a censura cada vez maior que está se estabelecendo na sociedade. O caso de um professor que está sendo perseguido por denunciar uma homenagem a um simpatizante da ditadura militar é o exemplo perfeito de como a censura não tem limites e se volta inevitavelmente contra os setores que contestam o regime. Victor ainda usou como exemplo o caso das redes do PCO, que foram suspensas durante meses simplesmente porque o Partido criticou um ministro do STF.

Em relação à ditadura militar, o dirigente do PCO destacou que a mudança profunda causada pelos generais na estrutura política, econômica e social do País ainda se fazem sentir nos dias de hoje. Problemas crônicos como o clientelismo, o atraso econômico no campo e a desindustrialização são herdeiros diretas da ditadura militar.

Victor concluiu sua fala convidando todas as organizações e pessoas presentes a participarem da III Conferência Nacional dos Comitês de Luta, que será realizada em São Paulo nos dias 9, 10 e 11 de junho, bem como de suas etapas municipal e estadual, que acontecerão, em Pernambuco, nas cidades de Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes, Goiana e Paulista.

Somente no âmbito da denúncia do que aconteceu à UFPE nos tempos da ditadura, há muito a ser feito. Segundo apresentado por Évson no debate, sete estudantes foram mortos pelo regime, que era apoiado abertamente por um dos principais jornais em circulação hoje no estado, o Diário de Pernambuco. Há também farta documentação que mostra o apoio dos usineiros ao golpe de 1964. O professor ainda afirmou que a UFPE tinha uma influência muito grande sobre a gestão de Jarbas Passarinho na Educação, uma vez que tinha um representante direto da universidade no ministério. Documentos disponibilizados por Évson para livre consulta do público durante o debate fornecem ainda outros importantes detalhes e anedotas, como a formação de uma “frente única” dos “anticomunistas” entre estudantes do Recife durante a ditadura militar.

Levar adiante as denúncias, disseminá-las entre a comunidade acadêmica e conectar essa campanha a um movimento mais geral contra a tutela militar do presente são tarefas decisivas para que o debate realizado no auditório Carlos Maciel se concretize em uma oposição real ao avanço da direita no regime. Para isso, a Conferência dos Comitês de Luta oferece as condições ideais e deve, portanto, contar com a participação de todos os que querem organizar uma frente única da esquerda, dos trabalhadores e do movimento popular contra a direita.

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