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Antônio Vicente Pietroforte

Professor Titular da USP (Universidade de São Paulo). Possui graduação em Letras pela Universidade de São Paulo (1989), mestrado em Linguística pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo (2001).

Cinema

Cristo parou em Eboli

Quando um médico pequeno-burguês ganha consciência política

            

              O filme “Cristo parou em Eboli”, de Francesco Rossi, foi lançado na Itália em 23 de fevereiro de 1979. Nele, Gian Maria Volonté faz o papel de Carlo Levi, médico e escritor perseguido pelo fascismo; o filme é inspirado em livro do mesmo nome, compondo-se das memórias de Levi quando esteve exilado. No caso, não se trata de exilar os opositores do regime em outros países fora da Itália, mas em territórios distantes dos grandes centros, por isso a ironia do título referindo-se a Cristo, quem teria parado na comuna de Éboli e nunca chegara na longínqua vila camponesa do exílio de Levi.

              Em meio aos temas desenvolvidos no filme, vale a pena se deter em dois deles, isto é, a tomada de consciência do protagonista, quem questiona os valores pequeno-burgueses levados consigo, e o verdadeiro papel da medicina na vida social. Na trama, Levi é um cidadão pequeno-burguês, formado em medicina, quem nunca exercera a profissão, preferindo pintar quadros, escrever poemas etc.; ao chegar além de Éboli, ele vive em pequenas pensões, dividindo o quarto com outros hóspedes, integrando-se, com o passar dos meses, na comunidade de camponeses. Levi não é revolucionário, opondo-se ao fascismo ao negá-lo politicamente; na vila, porém, há militantes comunistas revolucionários entre os exilados, tratados diferentemente dele, quem merece considerações das autoridades locais, inclusive do prefeito, simpatizante de Mussolini.

              No exílio, longe não apenas dos centros urbanos, mas distante dos amigos e dos valores burgueses, Levi, paulatinamente, deixa-se modificar pelos costumes locais, das reuniões entre os companheiros, regadas a ceias e cantorias, às relações sexuais com a governanta da casa, posteriormente alugada por ele, vivida por Irene Papas. Sua tomada de consciência, embora gradualmente realizada ao longo da trama, tem o momento marcante quando, durante uma das visitas da irmã Luisa Levi, vivida por Lea Massari, a moça lhe sugere exercer a medicina naquele lugar carente de tantas benesses, dando função social à sua formação profissional, antes negligenciada; Carlo, acatando o conselho, termina, por meio da verdadeira prática da medicina, habilitando-se para conhecer a poesia e a arte próprias daquelas pessoas.

              Nessa questão, o filme deveria servir de lição para os médicos capitalistas, habilidosos, isso sim, em lucrar com o sofrimento e as dores alheias. Em sua voracidade, o espírito capitalista domina todas as esferas da sociedade humana, da indústria automobilística à indústria cultural, da distribuição dos alimentos à distribuição das moradias, da educação à saúde, convertendo tudo em moeda, inclusive a vocação humana, orientada não pelo talento e propensões pessoais, mas por especulações em torno das práticas profissionais. Dessa maneira, formam-se nichos, para não dizer máfias, cuja principal ocupação é zelar pelo valor monetário das horas de trabalho.

              Quando um aluno de medicina cursa o ensino público, ele precisa se conscientizar de que seu suposto mérito pouco vale diante dos impostos pagos pela população, esses sim, garantidores de sua formação; tais estudantes, uma vez graduados, antes de exigirem altas remunerações por consultas ou salários elevados nos hospitais, deveriam saber que uma porcentagem do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços pago por todos, o ICMS, é utilizada para financiar o ensino superior público e gratuito, por isso mesmo, é responsabilidade do médico prestar contas deste dinheiro àquela população, atendendo-a devidamente. Caso contrário, que pague por sua faculdade, pois antes da exata restituição a quem realmente financiou seus estudos, o diploma não lhe pertence, pertencendo ao povo pagador dos impostos. Infeliz e vergonhosamente, quantos médicos, recém-formados no ensino público e gratuito, com o diploma debaixo do braço, não se evadem do Brasil para ganhar dinheiro no exterior, com a formação paga pelos brasileiros?

              Por fim, há, escandalosamente, prefeitos, governadores e reitores de universidades públicas formados em medicina, que não hesitam em invocar tropar de choque, treinadas com desumanidade, para ferir as pessoas, espancar estudantes e trabalhadores, semeando dor e sofrimento.

            

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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