
Diz-se que na segunda Grande Guerra a opção pelo extermínio em larga escala de judeus, ciganos, gays, eslavos, russos, etc., ocorreu por dois grandes motivos. O primeiro foi de ordem econômica, já que a guerra se prolongava por mais tempo que o previsto e as balas dos fuzis eram muito mais necessárias no front de batalha do que nos campos de concentração. Não era admissível gastar tanta munição em prisioneiros esquálidos e desimportantes para a grande economia de guerra. A segunda razão, descoberta mais tarde pelos estudiosos do fenômeno nazista, foi preservar a sanidade mental dos soldados alemães.
Sim, a banalização da morte acontece em qualquer guerra, e um nível de isolamento emocional é sempre essencial para manter a sanidade. Corações empedernidos suportam melhor os horrores dos combates. Criamos uma redoma de proteção psíquica para poder sobreviver à carnificina e ao absurdo do extermínio de semelhantes de forma cotidiana. Até os médicos e enfermeiras, que lidam com a morte no seu dia a dia, precisam desse recurso para não destruir seu aparelho psíquico com cada óbito que testemunham em seu labor diário. Entretanto, esse tipo de proteção afetiva e emocional tem suas falhas e com o tempo se deteriora e se torna ineficiente. Quando somos o vetor da destruição de dezenas ou centenas de inocentes não há isolamento emocional seja suficiente para sustentar tamanha desgraça. Com o tempo os soldados dos pelotões de fuzilamento nazistas acabavam tendo crises emocionais graves e muitos deles apelaram ao suicídio para se livrar da dor insuportável de serem os algozes dos prisioneiros.
As perdas de jovens soldados alemães acabaram mostrando ser impossível manter este tipo de aniquilação sem pagar um custo elevado entre as próprias tropas nazistas. A decisão pelas mortes “por atacado” foi muito baseada na necessidade logística dos comandantes alemães de eliminar o máximo possível, no menor período de tempo e com o menor custo psicológico entre os próprios combatentes.
Hoje, com a banalização das mortes de civis na Palestina, ainda usando as mentiras surradas e antigas de crianças sendo usadas como “escudos humanos” ou que o “Hamas bombardeou o próprio povo”, podemos estar testemunhando o mesmo fenômeno, agora do lado sionista. Eu tento entender o que acontece com as emoções de um jovem piloto sionista ao receber a ordem de bombardear um hospital, uma escola, um edifício de moradia sabendo que suas bombas vão matar e mutilar centenas de crianças, mulheres, velhos e profissionais de saúde. Como esse sujeito volta para casa para abraçar sua mulher e seus filhos? Como suporta ser o veículo de tanta dor, tanta desgraça, tanta desumanidade? Até quando vai suportar o peso de sua culpa? Com o tempo o peso dessa barbárie começa a pesar sobre os ombros dos próprios israelenses. Muitos já são os reservistas que preferem ir para a prisão à participar de operações do IDF que são verdadeiras chacinas. Outros resolvem se tornar ativistas pela paz e até se unem em organizações pró Palestina. Não há como manter-se são quando suas mãos estão manchadas do sengue de crianças.
Espero que a mesma dor sentida pelos jovem atiradores alemães atinja também os matadores de hoje, e que ela seja capaz de transformar suas consciências ado(rm)ecidas. A grande revolução na Palestina também vai contar com o que resta de humanidade entre os israelenses.