Nesta segunda-feira, o jornal O Globo publicou uma coluna assinada por Miguel de Almeida e intitulada “Lula abraça Bolsonaro”. Tendo como mote a recente reunião de Celso Amorim e Vladimir Putin em Moscou, o colunista se dedicou a satirizar a política externa do governo Lula, opondo uma suposta intenção de Lula em ganhar o Prêmio Nobel da Paz e seu apoio a “diferentes regimes autoritários”. Um dos pontos mais extravagantes do texto foram as comparações de Amorim e Putin com Stálin e Franco, onde o autor faz uma ponte bem criativa entre a operação militar russa na Ucrânia e a Guerra Civil Espanhola.
Segundo o colunista d´O Globo a situação na Ucrânia “poderia lembrar” a Guerra Civil Espanhola da década de 1930, onde Franco teria derrubado “o governo eleito” e Stálin facilitou sua vitória contra a resistência armada ao mandar matar os “simpatizantes trotskistas”. Uma sequência de simplificações para embasar as comparações que visam nada mais do que caluniar o representante de Lula. Sobre a Guerra Civil Espanhola, a simplificação dos fatos é menos grave, pois no final das contas a política do stalinismo foi fundamental para a derrota do levante revolucionário dos trabalhadores espanhóis, desde a política de frente ampla com setores da burguesia quanto a perseguição a combatentes revolucionários na própria frente de batalha.
Por outro lado, a comparação da Ucrânia de hoje com a Espanha da década de 1930 é um completo disparate. Seria como se uma democrática Ucrânia estivesse resistindo ao assédio russo, que visava submeter sua população a uma exploração capitalista mais acentuada, e isso por meio de uma ditadura. Amorim entraria nessa fábula como um falso aliado da Ucrânia, que trataria de minar as bases da “resistência” ucraniana.
Até para o exemplo encaixar, o cenário teria que ser bastante diverso do quadro real. O golpe de Estado na Ucrânia, onde o “governo eleito” foi derrubado aconteceu em 2014, quando teve início uma resistência popular principalmente na região do Donbass, que faz fronteira com a Rússia e tem população culturalmente russa. Somente após longos oito anos e com diversas movimentações do governo ucraniano no sentido de agredir militarmente a própria Rússia que o governo Putin agiu. Uma ação defensiva contra um governo financiado e orientado pelo imperialismo norte-americano, como já ficou público, mesmo que os monopólios das comunicações tratem de omitir as informações inconvenientes.
A ação stalinista na Espanha foi uma traição aos trabalhadores espanhóis, uma atividade profundamente reacionária, que impediu o progresso político do povo espanhol poucos anos após a crise provocada pela quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929. No sentido completamente oposto, se coloca a intervenção militar russa, que desbaratinou um sistema de treinamento militar de diversos grupos de extrema-direita na Ucrânia. Desmontou laboratórios de armas biológicas, impediu a instalação de mais mísseis nucleares da Otan nas suas fronteiras e interrompeu o massacre das populações que vivem no leste ucraniano.
Nesse sentido, a visita de Amorim aos russos aponta para um fortalecimento da luta contra o imperialismo. O mesmo imperialismo que apoiou Franco na Espanha, Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália, entre muitos outros inimigos do progresso da humanidade.
Celso Amorim é uma figura politicamente moderada, que integrou o governo Itamar Franco quando ainda estava no PMDB. Porém, comparado a Stálin pode ser considerado um grande revolucionário. Além de não estar enterrando movimentos revolucionários recém-nascidos como fez o líder da burocracia soviética, Amorim age na área até agora mais progressista do governo Lula, que é sua política externa de independência do imperialismo. Nesse momento de crise da dominação imperialista, a atuação de Brasil ao se aproximar de outros países atrasados é imensamente progressista com poder de influência no quadro internacional. Por isso a imprensa golpista tenta de todas as formas caluniar essas ações.