Hoje (22) completam-se duas semanas da prisão de nove indígenas guarani, caiouá e terena, da retomada Iwu Vera, em Dourados (MS). Os índios foram presos pela Polícia Militar na manhã do dia 8 de abril, logo após realizarem a retomada chamada Nova Iwu Vera, ocupando uma pequena parte do terreno em disputa com um fazendeiro por motivo de quebra de acordo após a empresa Corpal Incorporadora e Construtora comprar o terreno e começar a construir um condomínio de luxo na terra reivindicada pelos índios.
A PM acusa os índios de ameaçarem com arma de fogo um caseiro do terreno, portarem arma de fogo, invadir propriedade privada e causar dano ao patrimônio. Contudo, outra versão indica que o suposto caseiro na verdade era outro índio que havia se embriagado e brigado em um bar. Em seguida, ele teria se dirigido à delegacia para fazer um boletim de ocorrência. Logo após, os agentes da PM foram à retomada e acusaram os indígenas que lá estavam, apesar de o índio embriagado não ter acusado aqueles índios de terem brigado com ele.
As famílias dos indígenas que lá se encontravam, no momento da chegada da PM, acusam os agentes de enganar os seus familiares, induzindo-os a entrar, ingenuamente, nas viaturas, para que, supostamente, conversassem com o delegado.
Como este diário mostrou ontem, as famílias também dizem que os presos, que foram encaminhados para a Penitenciária Estadual de Dourados, estão sendo servidos com comida crua, passando frio e dormindo no chão.
Até o momento apenas o Partido da Causa Operária (PCO) e o Comitê de Luta das Retomadas se mobilizaram em apoio aos indígenas. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e os jornais A Nova Democracia e Brasil de Fato publicaram as denúncias. O CIMI também disponibilizou um advogado para acompanhar o caso.
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI), chefiado pela indígena Sônia Guajajara, ainda não se pronunciou a respeito. A direção nacional da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que tem a ministra como principal liderança pública, igualmente ainda não se manifestou oficialmente. Contudo, o coordenador da APIB no Mato Grosso do Sul, Simão Guarani Caiouá, comprometeu-se, em nome da organização, em abordar a situação em reunião com Sônia Guajajara e Eloy Terena, secretário executivo do MPI, neste final de semana.
Qual a sua avaliação sobre a prisão desses indígenas?
Nós ficamos sentidos em ver os nossos parentes [termo utilizado para se referir a companheiros e amigos indígenas] presos, espero que sejam soltos o mais rapidamente possível. Eles podem até mesmo ser torturados dentro da cadeia e, quando saírem, podem ficar na condição de processados. Isso me parece uma perseguição. A PM não tem provas para dizer que eles são bandidos. Estão presos por mera politicagem. Eles foram enganados pelos policiais. Estão lutando pelo direito deles, pela terra, e estão sofrendo uma injustiça. A perseguição do governo do estado do Mato Grosso do Sul é muito ruim. Estamos vendo o que esse governo faz com os indígenas, principalmente os guarani-caiouá.
A polícia disse que eles portavam armas e ameaçavam um caseiro…
Não, eles foram enganados pela polícia. A PM usa essa mentira apenas para incriminar essas nove lideranças. A PM disse aos indígenas que eles deveriam falar com o delegado e então os prendeu quando chegaram à delegacia. Também prendeu o Magno [de Souza, candidato ao governo do MS pelo PCO em 2022], que nem estava na retomada e não tem nada a ver com o caso. É uma injustiça, o prenderam sem provas nem argumentos.
Vocês estão preocupados com a situação deles na prisão?
Estamos muito preocupados, porque não podemos saber exatamente o que está passando com eles na cadeia. Podem estar sendo torturados, maltratados, podem não estar sem comida, sem cobertas. etc.
Outros índios já foram presos de forma arbitrária nesta região?
Sim. Por exemplo, três em Laranjeira Nhanderu e um aqui na região de Caarapó, chamado Leonardo de Souza (acusado de ser chefe de quadrilha), que está preso ainda hoje, condenado a 18 anos e 7 meses de prisão [tem quase 60 anos, está preso desde 2017 e tem dois filhos que morreram em consequência de ataques]. Alcídio Fernandes também está preso por perseguição e hoje ninguém mais fala sobre a necessidade de soltá-lo. Criminaliza-se as lideranças para fazer isso com elas. Estamos vendo uma possibilidade, como guarani-caiouás, de ajudar os nossos parentes.
O que a APIB pretende fazer?
Vamos escrever uma carta para o desembargador de São Paulo e, junto com o MPI (que já encaminhou esse pedido para ele), vamos pedir a soltura dos nove presos. Vamos mobilizar e ajudar os parentes que estão sendo criminalizados em qualquer lugar do País.