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Ricardo Rabelo

Ricardo Rabelo é economista e militante pelo socialismo. Graduado em Ciência Econômicas pela UFMG (1975), também possui especialização em Informática na Educação pela PUC – MINAS (1996). Além disso, possui mestrado em sociologia pela FAFICH UFMG (1983) e doutorado em Comunicação pela UFRJ (2002). Entre 1986 e 2019, foi professor titular de Economia da PUC – MINAS. Foi membro de Corpo Editorial da Revista Economia & Gestão PUC – MINAS.

Regime imperialista

Alguns aspectos importantes da “Democracia” Ocidental

Todos os países da União Europeia são sabidamente uma negação e, portanto, dificilmente se pode encará-los como uma democracia

A maior campanha orquestrada pelo imperialismo estadunidense é a que o mundo assiste hoje uma guerra entre as democracias ocidentais e as autocracias. Quando se questiona que nestes regimes ditos autocratas, há eleições periódicas, como na Rússia de Putin e na Venezuela de Maduro, se afirma que não basta haver eleições para se caracterizar um regime como democrático. Vamos esquecer então este tópico por um momento. Será que uma característica plausível de autocracia está no fato de a polícia poder investigar sem limites os cidadãos de um país, invadir seus computadores e celulares e acionar as câmeras dos celulares sem que seus proprietários saibam?

Pois bem. Existe um país em que tudo isso é possível, e talvez mais do que isso. É a França, terra da propalada democracia ocidental. No dia 5 de julho de 2023 passado, os deputados franceses aprovaram uma nova lei que prevê o acionamento remoto de celulares, computadores, microfones e câmeras telefônicas sem o conhecimento de quem está sendo vigiado. A medida torna possível que a polícia faça isso para geolocalizar uma pessoa, ou para gravar sons (escuta) e imagens. O que a lei não explicita é o que se faz quando se constata que os crimes alegados, como terrorismo ou crime organizado, não são confirmados.

A questão é muito grave porque a polícia pode ouvir também as conversas de terceiros, em bares ou no ônibus. E pode levar estas conversas para novas investigações. Ou seja: a polícia da “democrática” França está implantando uma ditadura típica do romance 1984.

Na verdade, como esclarece o ministro da Justiça francês, Éric Dupond-Moretti, essa eliminação dos direitos democráticos dos cidadãos, como a presunção de inocência, já acontece na prática há muito tempo, inclusive a colocação de rastreadores sob um carro para persegui-lo onde ele vá. Alega-se que isso se faz só contra suspeita de crimes graves, o que não engana ninguém.

Esgrime-se o argumento de que estes procedimentos devem ser autorizados por um juiz, como se estes dignos senhores tivessem uma natureza mais democrática que a polícia, quando, na verdade, atuam em absoluta coordenação e cumplicidade. Portanto, diríamos que a França, embora realize eleições periódicas, é uma sociedade arbitrariamente despótica, monitorada e controlada, em que seus cidadãos tem sua conduta vigiada a cada passo.

Poderia se argumentar que essa é uma questão ligada às liberdades formais, mas o que realmente importa é que os países ocidentais são senhores de seu destino, que possuem total soberania nos atos de seu governo. Há um exemplo recente que mostra que isso também não é verdade. A Comissão europeia é um fator principal da conformação da unidade dos países europeus. Isso tem sido elogiado até por Lula, apontando a União Europeia um exemplo de união e soberania de seus povos.

Fiona Scott Morton é um exemplo perfeito do que podemos chamar de um agente do imperialismo estadunidense. Além de membro do governo Obama, ela foi lobista de empresas “made in USA” como Amazon, Apple e Microsoft. Lobista, como se sabe, é uma profissão muito digna de defesa dos interesses de uma empresa, mesmo que frequentemente para exercê-la seja necessário usar de alguns procedimentos geralmente denominados como suborno, trapaça, extorsão, e até mesmo alguma violência, mesmo que, em geral, seja apenas verbal. Pois bem, a Comissão Europeia nomeou-a para, nada mais nada menos, que Diretora-Geral do departamento de concorrência, onde terá a tarefa de justamente encontrar uma maneira de favorecer os interesses da sua pátria, em pleno solo europeu, fingindo que faz imparcialmente “a regulação dos monopólios tecnológicos”.

Não adiantou os líderes dos quatro principais grupos políticos do Parlamento Europeu denunciarem o “conflito de interesses”, bem como a ingerência dos Estados Unidos.

A Comissão Europeia, cônscia do seu dever de favorecer a submissão completa aos gringos da União Europeia, afirmou que “não vê razão para reconsiderar” a contratação do americano. “A decisão foi tomada. Não vemos razão para reconsiderá-lo”, disse democrática e soberanamente a porta-voz da Comissão, Dana Spinant, em entrevista coletiva. Isso apesar de saber que, entre maio de 2011 e dezembro de 2012, Morton foi chefe da divisão antitruste do Departamento de Justiça dos Estados Unidos e, por sua vez, assassina de aluguel de monopólios de tecnologia.

Em carta dirigida à Comissária da União Europeia para a Concorrência, Margrethe Vestager, os eurodeputados afirmaram que “numa altura em que as nossas instituições estão sujeitas a um intenso escrutínio face à ingerência estrangeira, não compreendemos porque são cogitados candidatos não europeus para um cargo tão estratégico e de alto nível”. Apesar que a função de Direção-Geral da Concorrência seja zelar pelo bom funcionamento da concorrência na União Europeia e investigar, nomeadamente, os abusos de posição dominante por parte dos gigantes digitais, o que está feito, está feito. Isso é muito significativo, uma vez que, na Europa, aumentam os processos de sanções contra os gigantes da tecnologia dos Estados Unidos, que nos últimos anos resultaram em multas recordes.

A indicação de Morton para esse cargo chave mostra que também no aspecto soberania, todos os países da União Europeia são sabidamente uma negação e, portanto, dificilmente se pode encará-los como uma democracia. Aqueles que são eleitos (ainda) para o parlamento europeu nada podem contra a verdadeira ditadura exercida pela burocracia da Comissão Europeia, que foi se instalar em Bruxelas para ficar o mais distante possível da pujante democracia das massas que recentemente se manifestou em Paris e outras cidades francesas. Essa infiltração de um estadunidense na Comissão Europeia se dá exatamente quando a União Europeia deve implementar uma nova legislação para regular o setor e é obra pessoal de Ursula von der Leyen, o verdadeiro cavalo de Troia dos Estados Unidos na Comissão Europeia.

Artigo publicado, originalmente, em 20 de julho de 2023.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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