Dois dos principais jornais da burguesia no País publicaram, nesse domingo (20), editoriais que abordam o mesmo tema. Lendo-os, nota-se um fato, no mínimo, curioso ― Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo opinam em defesa da liberdade de imprensa. A mensagem é claramente endereçada ao Supremo Tribunal Federal (STF). Expliquemos o caso.
Em 1995, o Diário de Pernambuco publicou uma entrevista em que o delegado Wandenkolk Wanderley acusou o ex-deputado Ricardo Zarattini Filho de ter participado do atentado a bomba no Aeroporto dos Guararapes, em Recife, em 1966. O ex-parlamentar entrou com uma ação de indenização, alegando que a informação não era verdadeira e que foi impedido de exercer o direito de resposta. A ação chegou ao STF, que deve concluir o julgamento nesta semana que se abre, e como o caso foi qualificado como de “repercussão geral”, para além da decisão do caso concreto, o STF estabelecerá o regramento para todos os demais casos similares, definindo se e em quais casos um órgãos de comunicação pode ser condenado a pagar danos morais quando o entrevistado veicula informações caluniosas ou difamatórias. Isto é, em que medida a imprensa é responsável pelo conteúdo da fala dos seus entrevistados.
Eis que de repente, não mais que de repente, a imprensa burguesa relembra o STF da defesa que a Constituição Federal faz da liberdade de imprensa, da proibição da censura e por aí vai. Isso depois de promover abertamente há tempos uma campanha em defesa dos limites da liberdade de expressão, de defender a censura, cassação e até a prisão de políticos e personalidades por falarem isto ou aquilo.
O cinismo é realmente um traço fundamental dos monopólios da imprensa capitalista. A defesa da liberdade de imprensa e expressão só convém à burguesia quando o que está em jogo são centenas de processos contra as calúnias e mentiras que essa burguesia, por meio de seus órgãos de imprensa, professa cotidianamente. Quando há risco de que seus interesses possam ser ameaçados, eis que os jornalões dos capitalistas vestem a capa de paladinos das liberdades democráticas e professores do funcionamento democrático.
Trata-se de uma defesa de ocasião, pura e simplesmente. Hoje, Folha e Estadão publicam editoriais defendendo a liberdade de expressão e alertando o STF para que não se esqueça das normas constitucionais. Amanhã, quando os interesses da burguesia assim exigirem, elaborarão todo tipo de argumentos e raciocínios para defender que a liberdade de expressão tem limites e que este ou aquele indivíduo cometeu um crime gravíssimo porque emitiu uma opinião indesejável. A própria Folha abre o jogo quando afirma que “nenhum veículo de comunicação escaparia da falência se precisasse pagar danos morais por ofensa à honra a todo político implicado em escândalos de corrupção”.
A manobra de ocasião não pode confundir o panorama político. Os monopólios capitalistas da imprensa estão desenvolvendo uma forte campanha de ataques contra os direitos democráticos em geral e a liberdade de expressão em particular. Não se pode perder de vista que essa é a tendência geral da burguesia no momento. O próprio tom cauteloso da defesa da liberdade de imprensa presente nos editoriais deixa isso claro.
A defesa intransigente das liberdades democráticas cabe à classe operária e aos setores explorados da população. A imprensa capitalista não pode fazer tal defesa porque os interesses da classe dominante à qual serve se chocam com a existência dessas mesmas liberdades.