O trabalhador não tem um dia de descanso, mas o que rolou em Minas Gerais vai além do normal. Um ex-funcionário de uma rede de mercados foi indenizado porque, antes do serviço, tinha que descer até o chão, dançando e rebolando, à medida que soltava uns gritos de guerra da empresa; ou seja, uma espécie de haka pós-moderno e corporativista.
Como todo funcionário do sistema capitalista, o homem explorado também já tinha trabalhado mais horas do que o acertado em contrato, obviamente, sem receber por hora extra, então entrou na justiça também por este motivo. O Tribunal Regional do Trabalho, entretanto, julgou apenas a primeira parte da matéria, até porque, convenhamos, é muito mais divertido julgar um caso relacionado a balançar a bunda do que mais um – dentro de milhares – que tenha a ver com empresas não pagando seus funcionários. Ora, onde já se viu querer receber por aquilo que trabalhou no capitalismo?
O rebolador do mercado recebeu R$1.000,00 de indenização, que é aproximadamente o valor que o dono de um supermercado gasta comprando cigarro em meio mês. Segundo testemunha, os funcionários eram obrigados a dançar e gritar e, quem não comparecesse, era chamado no microfone para cumprir suas funções. A melhor parte é que a mesma pessoa afirmou que “eram passados os números de vendas, era cantado o grito de guerra e depois cada um ia para o setor”, ou seja, havia basicamente um ritual para fazer com que se vendesse mais e o haka era, na realidade, um ritual para a obtenção de lucro.
(Nota: a parte do ritual não necessariamente é verdade, mas fica mais legal sendo.)
O funcionário que processou a empresa, entretanto, o fez não pela humilhação de ter que dançar, mas sim porque em uma certa parte da coreografia este tinha que rebolar – e descer até o chão não é algo que ele queria fazer. Essa matéria demonstra, sobretudo, a escatologia que é o meio de trabalho, onde os funcionários deixaram de ser chamados de trabalhadores para atenderem por “colaboradores”. A ideia burguesa de considerar o trabalho como uma espécie de família, como se fosse um ambiente descontraído e entre amigos, nada mais é do que uma tentativa escandalosa de iludir e manipular os trabalhadores. Se você acreditar que seu chefe é seu amigo, você pode se tornar mais suscetível de ser explorado, como se fosse uma espécie de amizade tóxica: um lado abusa e o outro agradece por ser abusado.
Do que adiantou chamar os funcionários de colaboradores? A resposta é a mesma tanto para essa pergunta, quanto se aplicarmos em todas as pautas identitárias: não adiantou de nada, assim como chamar o negro de afrodescendente ou o gay de homossexual. Se um grupo sofre uma opressão, essa opressão em nossa sociedade se dá pelo capital e o seu combate deve ser travado, de forma direta, na luta pelo socialismo. Não adianta defender que os negros apenas ascendam no modelo capitalista, porque isso nunca vai acontecer: serão sempre oprimidos por aqueles que estão no topo e que tentarão, sempre, dar migalhas para mostrar sua benevolência e seu poder. Não adianta, também, defender que as empresas devem agir como famílias, porque elas não são um ambiente familiar e nem podem ser.
Mas, no fim, se as empresas privadas forem famílias, certo estava o Itachi.