Farra da vaca
Petrobras, empresa que poderia ser parte integrante do desenvolvimento das forças produtivas no País, especialmente para fornecer outros bens básicos como saúde e educação, hoje é marcada pela especulação sem precedentes desde o golpe de Estado de 2016, como a agitação histórica em torno da distribuição de dividendos. O segundo trimestre foi um verdadeiro período de festa no “mercado”, sendo classificada como a maior empresa pagadora de dividendos do mundo, pelo Índice Global de Dividendos da gestora Janus Henderson [1]. Enquanto o País estava em período eleitoral, o “mercado” participava de uma verdadeira jogatina com a principal riqueza nacional, o petróleo.
A Petrobras atingiu esse patamar desbancando as 1.200 maiores empresas globais por valor de mercado, incluindo gigantes como Nestlé, Mercedes e até mesmo a Microsoft. Após a farra com a alta do petróleo, a Petrobras caiu no ranking, mas é a terceira colocada, de acordo com a 36ª edição do ranking. Os últimos resultados mostraram pagamentos cerca de US$ 9,7 bilhões em dividendos da Petrobras entre julho e setembro, o terceiro trimestre de 2022. No acumulado de 2022, a companhia remunerou US$ 19,4 bilhões em proventos.
A petroleira gigante construída com trabalho do povo brasileiro foi desbancada desta vez pela China Construction, banco chinês que atua no ramo de mineração e de petróleo, isto é, ratificando a posição fundamental do petróleo neste século. Outro dado relevante do ranking oficial do “mercado” é que a Petrobras é a única empresa brasileira do top 10 dos dividendos. No segundo trimestre do ano, a empresa lucrou R$ 54,3 bilhões (alta de 26,8% em relação ao mesmo período do ano anterior). Trata-se de uma verdadeira garfada sem distribuição ao País, pois a Faria Lima e a Wall Street vão abocanhar os dividendos após aval do Tribunal de Contas da União (TCU), e a Petrobras reiterou que os dividendos serão pagos em duas parcelas, em janeiro e dezembro.
Quando o lucro bateu na porta dos acionistas (corporações capitalistas), vai distribuir dividendos pois obtiveram lucro, pois os proventos são justamente uma fração desses ganhos. Com essa qualificação, a Petrobras se torna uma vaca leiteira, ao mesmo tempo que expõe as contradições brasileiras, mas não serve para corar as bochechas gordas e rosadas do “mercado”, que agora visa desestabilizar novamente o país com toda essa margem especulativa. Neste momento usam a eleição de Lula como forma de diminuir o valor da empresa e capacidade de distribuição dos lucros e dividendos à sociedade. Em nome da palavra “incerteza” empresas nacionais de investimentos, como o Bradesco BBI, recomendando papeis de compra “neutro” e preço alvo de R$ 53 para $25 [2].
‘A Petrobras não será fatiada’
Lula afirmou que a Petrobras não será fatiada e anunciou Fernando Haddad, homem de sua confiança, para organizar a Fazenda. A ideia é fazer com que a empresa possa ser indutora do desenvolvimento das forças produtivas no país, e, quiçá, atender a um velho desejo do núcleo duro econômico do PT, que visava distribuir os royalties do pré-sal para a saúde e educação. Sem dúvida, esse foi o principal motivo do duro golpe de Estado contra o País, ou seja, com grandes lucros decorrentes das grandes reservas brasileiras e da capacidade produtiva de uma das melhores empresas em refino de petróleo, os capitalistas não querem distribuir os lucros para investimento na educação.
Entre 2002 e 2015, o orçamento do MEC saltou R$ 18,01 bilhões para R$ 126,14 bilhões. Com o golpe de Estado, os recursos à educação reduziram, conforme Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2023 [3]. No total, a proposta aprovada para o MEC em 2023, desconsiderada a complementação ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), apresenta redução de R$ 7,8 bilhões (-7,6%) em relação a 2022. Em suma, “o que foi projetado em R$ 137,9 bilhões para este ano, após o anúncio de cortes no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) já no mês de maio, começou a ser modificado. O MEC foi informado que haveria um bloqueio de R$ 3,2 bilhões, que atingiu institutos e universidades federais, mas o que ocorreu foram mais cortes, que ultrapassaram R$ 621 milhões. É o equivalente a 7,2% de todo o orçamento previsto para as instituições federais em 2022”. [4]
O que é possível construir na educação superior com o fim das privatizações
Os cortes no Ministério da Educação, em termos de educação superior foi de cerca de R$ 400 milhões. A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) alertou em junho para o arrocho no orçamento de 2022. Pelo menos 17 universidades federais correm risco de fechar até o fim do ano devido a bloqueios orçamentários feitos pelo governo. Apesar da tentativa do governo em arrochar ainda mais, o orçamento do MEC deve passar de R$ 134,7 bilhões para R$ 147,4 bilhões em 2023. O aumento de R$ 12,7 bilhões se deve à complementação obrigatória da União ao Fundeb, conforme estabelecido em lei aprovada pelo Congresso em 2020. Contudo, o governo bloqueia cerca de 30% no orçamento discricionário (não obrigatório) das instituições federais de ensino superior, todos os anos.
As universidades e institutos federais estão em ritmo de sucateamento, o orçamento nos últimos anos não tem coberto o básico, endividando as instituições de ensino e permitindo evasão constante. Ao longo do ano, foram enfrentados diversos bloqueios. Nas últimas semanas, o governo bloqueou R$ 344 milhões das universidades e R$ 122 milhões dos institutos federais. Após sucessivos bloqueios, uma Medida Provisória será publicada quinta-feira (15), liberando R$ 2 bilhões, cerca de 10% dos dividendos do trimestre “mágico” do “mercado”.
Com base no Portal Transparência, informações a respeito do orçamento, somente a Universidade Federal do Rio de Janeiro demandaria orçamento anual de R$ 3.967.768.338,00. O custo total para manutenção básica das universidades federais é de cerca de R$ 50 bilhões, valor menor que os dividendos do trimestre de ouro da Petrobras, de R$ 53 bilhões. Quatro trimestres de dividendos da Petrobras sustentariam quatro vezes mais universidades anualmente, ou, fortaleceria em 4 vezes cada uma das universidades existentes. Considerando que o prédio mais caro entre todas as universidades federais, o da Universidade Federal da Integração Latino-Americana, projetado por Oscar Niemayer, e que está parada custaria R$ 350 milhões para 10 mil estudantes, somente com o lucro de um trimestre teríamos a possibilidade de construir aproximadamente 142 edifícios que abrigariam 1.420.000 alunos. Evidentemente que essa estimativa não inclui a contratação de recursos humanos. Porém, dá para se ter uma ideia do desenvolvimento que o Brasil terá, caso Lula nacionalize tudo que foi entregue nos últimos anos e coloque o projeto de desenvolvimento da educação como investimento. O petróleo nacionalizado é povo alimentado, é povo instruído e organizado.
Referências
[1] https://www.janushenderson.com/en-no/investor/jh-global-dividend-index/
[2] Ibovespa B3. https://www.b3.com.br/pt_br/market-data-e-indices/indices/indices-amplos/ibovespa.htm
[3] BRASIL – Congresso Nacional. Projeto de Lei do Congresso Nacional nº 32 de 2022. Disponível em: https://www.congressonacional.leg.br/materias/materias-orcamentarias/ploa-2023
[4] BARRETO, Marcelo Menna. Orçamento do MEC pode perder R$ 7,8 bilhões em 2023. Em: Extraclasse. Disponível em: https://www.extraclasse.org.br/educacao/2022/10/orcamento-do-mec-pode-perder-r-78-bilhoes-em-2023/
[5] Lista de universidades federais do Brasil por orçamento. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_universidades_federais_do_Brasil_por_or%C3%A7amento