Dias após o primeiro turno das eleições deste ano, com a divulgação de que haveria uma segunda votação entre Lula e Bolsonaro, Maria Alice “Neca” Setubal declarou, em entrevista à Folha de S. Paulo, que seu voto será para o ex-presidente Lula. Afirmou, procurando justificar a sua posição, que “Não tem a menor chance de um governo Bolsonaro que priorize a educação”, criticando, de maneira geral, a atuação do atual presidente nos últimos 4 anos.
O anúncio de Neca, herdeira do Banco Itaú e dona de uma fortuna de mais de um bilhão de reais, chamou muita atenção tanto na esquerda, quanto na direita, uma vez que teria significado que o Itaú, um dos principais representantes dos capitalistas no Brasil, estaria apoiando a candidatura de Lula. Todavia, estaria correta essa avaliação?
Palavras não enchem a barriga de ninguém
Apesar da enorme campanha proveniente da esquerda pequeno-burguesa que, na recusa do materialismo histórico, defende que são as palavras o principal motor da humanidade, fato é que declarações, por si só, não significam absolutamente nada. Afinal, se levarmos em consideração o que Alckmin, por exemplo, fala, chegaríamos à conclusão de que se trata de um dos maiores esquerdistas dos últimos anos. Algo simplesmente absurdo.
O que a campanha de Lula pode fazer com o apoio abstrato de Neca? Nada, ainda mais levando em consideração que a base que apoia Lula é completamente desgostosa de capitalistas como a herdeira do Itaú. Nesse sentido, a declaração em questão mais prejudica do que beneficia a candidatura de Lula!
Finalmente, coisas concretas movem o mundo e, hoje em dia, isso significa, necessariamente, capital, dinheiro. Se Neca tivesse doado, digamos, 1 milhão de reais à campanha de Lula – algo que, levando em consideração que tal quantia representa cerca de 0,1% de sua fortuna, seria, para ela, troco de pão -, poderíamos começar a considerar como um verdadeiro apoio à campanha do petista.
Entretanto, com o montante que destinou a isso (0 reais), a campanha de Lula não pode produzir nenhum panfleto, pagar as contas que precisa, contratar mais pessoas, enfim, não pode fazer nada que vá, de fato, impulsionar a sua mobilização em torno das eleições. Consequentemente, não é um apoio de fato, mas sim, uma promoção de sua própria figura.
O caso de Alckmin, inclusive, mostra isso claramente. Como figura política, o tucano, assim como o PSDB, como um todo, está completamente falido. Logo, se aproximou de Lula que, acima de qualquer coisa, é um dos políticos mais populares de toda a história brasileira e, certamente, o mais popular dos dias de hoje. Aparecer ao lado de Lula, então, representa um grande ganho a Alckmin, uma chance de reviver politicamente e continuar o seu massacre contra a classe operária no Brasil.
O Itaú já firmou um compromisso com o identitarismo
Fica claro, portanto, que é preciso analisar cada caso separadamente e fazê-lo de maneira concreta, levando em consideração, acima de qualquer coisa, os interesses de classe que estão envolvidos na questão. Caso contrário, é possível chegar às mais absurdas conclusões, como a de que Alckmin e Tebet – que também “apoia” a campanha de Lula – seriam figuras de esquerda. O mesmo vale para Neca.
Toda a linha política dos representantes do Itaú e do próprio banco, nas últimas décadas, resumiu-se a fazer demagogia com questões como o meio ambiente, a condição de vida das mulheres e dos negros, a cultura etc. Tudo muito bem embasado por um discurso identitário, seguindo a orientação do imperialismo. Não é à toa que a principal figura política apoiada por Neca é justamente Marina Silva (Rede) que, pelos mesmo motivos citados anteriormente, também apoia a candidatura de Lula.
Se Neca Setubal resolvesse apoiar Bolsonaro neste segundo turno, toda sua política cairia por terra já que o atual presidente é veementemente repudiado pela esquerda pequeno-burguesa, a base fundamental de figuras como Neca e Marina Silva. Com isso, a família Setúbal é praticamente obrigada a apoiar Lula caso não queira que toda a sua demagogia barata seja prontamente desmascarada como puro oportunismo político – o que, de fato, o é.
Aqui, não é preciso conjecturar. A própria Neca admite que esse é o motivo de seu apoio à candidatura de Lula em evento com a campanha do ex-presidente:
“Eu acho que as pautas que eu defendi a minha vida toda são as pautas da educação para todas as crianças e jovens desse País, o enfrentamento das desigualdades sociais, raciais, territoriais, de gênero, e a defesa do meio ambiente com uma economia de baixo carbono. Só com Lula presidente e Haddad governador nós vamos poder fazer uma grande concertação democrática”, colocou a herdeira.
Não pode haver declaração mais clara do que essa. No final, o Itaú e seus herdeiros não apoiam Lula na prática, mas sim, na teoria. Caso contrário, não se limitariam à meras palavras, efetivamente injetando capital na candidatura do ex-presidente. Antes de tudo, figuras como Neca surfam nas costas de Lula para que sejam consagradas, dentre os mais desavisados, como defensores da democracia. Uma grande farsa para que continuem massacrando o povo pobre no Brasil e no mundo.