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Dívida pública: entenda como os banqueiros roubam o Brasil

Marcelo Marcelino, coordenador da Auditoria Cidadã da Dívida Pública em Curitiba, concedeu uma entrevista exclusiva ao Diário Causa Operária (DCO)

Nessa quinta-feira (24), Marcelo Marcelino, coordenador da Auditoria Cidadã da Dívida Pública em Curitiba, concedeu uma entrevista exclusiva ao Diário Causa Operária (DCO). Na ocasião, esclareceu alguns questionamentos econômicos que se tornam cada vez mais comuns à medida em que a imprensa burguesa tenta pressionar Lula para que governe conforme os interesses dos patrões. Campanha que se materializa, principalmente, por meio do chamado “mercado”.

Além disso, Marcelo denunciou a demagogia dos capitalistas com o teto de gastos, demonstrando que, na prática, serve apenas para os gastos relacionados ao povo. Uma vez que não existe limite no orçamento público para o pagamento dos juros relativos à dívida pública, nas mãos, principalmente, dos banqueiros.

“No governo FHC, foi criada a Lei de Responsabilidade Fiscal, que está dizendo claramente o seguinte: para investimentos públicos, sociais e infraestrutura além da máquina estatal, existe um teto, pagamento de funcionários etc. Mas, para [o pagamento] de juros da dívida pública, não há limite. Parece inacreditável, mas está na lei bem claramente, para pagamento de juros não há limite do orçamento estatal”, afirmou o companheiro.

Confira, abaixo, a entrevista na íntegra e, ao final, acesse o canal no YouTube do DCO e assista à entrevista gravada também em sua totalidade.

Diário Causa Operária Vemos que existe uma pressão muito grande sobre o Lula por parte do chamado “mercado”. A imprensa burguesa, fazendo essa campanha, está noticiando que esse tal mercado está desaprovando completamente a postura de Lula em relação a questões do orçamento público, dos gastos que o seu governo vai fazer nesse próximo ano. É uma coisa que está sendo comentada quase todos os dias.

Em primeiro lugar, Marcelo, você pode falar o que é o “mercado”? Sempre falam de mercado, mas nunca deixam claro quem são essas pessoas. O que é isso? Como é que você entende essa questão?

Marcelo Marcelino – Olha, eu vou tentar utilizar uma linguagem adequada às pessoas que necessariamente precisam compreender essa temática fora do quadrante universitário, que usa uma linguagem muito academicista e muito excludente para a maioria da população.

O tal do “mercado”, nada mais, nada menos, significa que os interesses dos grupos privados nacionais e internacionais, isto é, as grandes empresas brasileiras e de fora do País também, principalmente, levando em consideração os bancos, os grandes conglomerados de grandes empresas estratégicas; elas têm um interesse muito grande numa fatia enorme do orçamento público. E se esse orçamento público não for destinado principalmente aos interesses do mercado financeiro nacional e internacional, ele está fora daquele tal cercadinho, que não é o do Bolsonaro, mas aquele cercadinho de interesses estratégicos de acumulação do capital, dos lucros dos banqueiros, dos agiotas internacionais e nacionais que têm muito interesse em que o governo destine uma maioria de parte estratégica do seu orçamento público para o pagamento de juros da dívida pública para esses especuladores e rentistas daqui do Brasil e de fora dele.

Esse que é o tal do “mercado”, são os interesses privados de grandes grupos econômicos e principalmente dos grandes bancos nacionais e internacionais.

Diário Causa Operária Vimos que um dos focos dessa campanha, do chamado “mercado”, que utiliza a imprensa burguesa para fazer isso, é a questão do teto de gastos, que é algo que o próprio Lula já se mostrou contra em diversas ocasiões nesse último período. O que é o teto de gastos? Qual é a importância dele?

Marcelo Marcelino – Trata-se do seguinte: desde a Constituição de 88, a tal Constituição Cidadã da República, no artigo 166, ela contém uma exigência de preferência para pagamento de juros [sobre] quaisquer outras medidas econômicas a serem adotadas.

Para vocês terem uma ideia do tamanho do absurdo que, desde a Constituição de 88, se criou no Brasil. Não que os absurdos não existissem antes, claro que eles sempre existiram. Só que ao longo do capitalismo neoliberal, eles foram se acentuando cada vez mais. E aí, em 88, se criou um dispositivo através desta lei 166 que assegura o pagamento dos juros como uma prioridade do Estado brasileiro. Aí veio o Plano Real.

O Plano Real tornou-se a maior estratégia muito bem sucedida do capitalismo rentista, aquele do mercado financeiro, em utilizar a política econômica através do Banco Central para os seus interesses próprios, particulares, de grandes grupos, como eu falei agora há pouco, econômicos do capital financeiro nacional e internacional, através do pagamento de juros da dívida pública. Porque a nossa dívida pública era de cerca de R$60 bilhões no início do Plano Real. Agora, ela ultrapassa sete trilhões de reais por causa justamente dos pagamentos de juros escorchantes a esse sistema econômico e financeiro perverso imposto pelo imperialismo das grandes bancas financeiras internacionais.

Começando pelo banco BIS, que é o Banco Central dos Bancos Centrais, criado em 1930, logo após a crise de 29, que passou a intermediar os pagamentos de vários grupos empresariais e de famílias históricas do poder financeiro internacional. E depois da Segunda Guerra Mundial, foram criados outros bancos nesse sentido. Só que, por exemplo, ao Fundo Monetário Internacional coube exigir dos países dependentes, como o Brasil e a América Latina em particular, que se adotassem políticas econômicas neoliberais, privatização de empresas brasileiras, terceirização dos serviços públicos e o achatamento dos gastos públicos.

Em 2000, essa exigência no governo Fernando Henrique Cardoso, no seu segundo mandato, ela chegou no momento do ápice porque foi criada a Lei de Responsabilidade Fiscal, que está dizendo claramente o seguinte: para investimentos públicos, sociais e infraestrutura além da máquina estatal, existe um teto, pagamento de funcionários etc. Mas, para [o pagamento] de juros da dívida pública, não há limite. Parece inacreditável, mas está na lei bem claramente, para pagamento de juros não há limite do orçamento estatal.

E aí, como o absurdo não para por aí, com o golpe de Estado em 2016, o Temer, em dezembro do mesmo ano, leva ao Congresso Nacional, com a exigência desses mesmos, a questão do teto de gastos por 20 anos, [piorando] a condição, que já era muito ruim, da Lei de Responsabilidade Fiscal. E [isso] começa a vigorar em 2017. E aí, claro, houve algumas aberturas diante da pandemia, algumas exceções que foram criadas até para o governo conseguir se salvar diante do caos que foi criado, mas a lei do teto vigora com o máximo de exigência a quaisquer governantes.

E ainda por cima, no governo Bolsonaro foi votado no Congresso Nacional a independência e autonomia do Banco Central que é instituição chave estratégica da política econômica brasileira. Independente do governante que assuma, o presidente do Banco Central não pode ser removido, a não ser por falta gravíssima, que ainda assim deve ser determinada, em última instância, votada pelo Congresso Nacional e não mais pelo Presidente da República.

Diário Causa Operária Já que você entrou nessa questão do juros da dívida pública, vimos justamente isso que você disse num gráfico feito pela Auditoria Cidadã da Dívida Pública, que mostra ali que a esmagadora maioria do orçamento público vai justamente para o pagamento desses juros.

É uma prova, inclusive, da própria demagogia dos banqueiros de que gastar com programas sociais não pode, que isso representaria um ataque ao cofre público. Mas, que nem você disse, é ilimitado o pagamento dos juros dentro desse orçamento.

E esse pagamento da dívida? Você falou que a dívida só aumenta, não é? Aumentou trilhões de reais desde os últimos 20 anos. Como isso funciona? Ela é uma dívida eterna, uma espécie de prisão financeira?

Marcelo Marcelino – Na verdade, dentro desses dispositivos da dívida pública, existe a falácia da amortização. Então, existe uma tabelinha, como qualquer investimento que seja bancário, por exemplo, quando você compra uma casa própria parcelada e daí tem aquelas tabelinhas PRICE, SAC. Eu não quero entrar aqui na estrutura evidentemente normativa rígida de como é que funciona o mecanismo financeiro, mas a amortização é clara nesse aspecto. Quanto mais você paga, você vai abatendo a dívida ao longo do tempo.

No caso da dívida pública, vocês podem ver através desses anos todos, dessas, praticamente, três décadas, desde a construção do Plano Real. Nessas três décadas, a dívida só foi explosiva, como eu falei, de 64 bilhões para mais de 7 trilhões de reais. É uma dívida totalmente absurda, inconstitucional, ilegal, mesmo para os padrões da democracia liberal burguesa.

Então, isso é simplesmente um ataque contra a população. Porque você acaba matando o povo de fome, sem política pública nenhuma, sem emprego, sem renda, porque o capital vadi* não quer saber de investir na produtividade, ele quer rentabilidade melhor. E, como o Brasil paga juros muito elevados no mercado internacional – a maior taxa de juros do mundo, inclusive no [governo] Fernando Henrique Cardoso, ela bateu recorde, quase praticamente 50% ao ano de taxa básica – isso faz com que, ao longo do tempo, a dívida só aumente, porque, na prática, não existe amortização, somente na tabela formal do Banco Central e da relação espúria com o Tesouro Nacional, que deveria ser o guardião do orçamento público estatal.

Logo, claro que essa conta não vai fechar nunca e eles [os banqueiros] não querem que a dívida seja paga. Eles querem que a dívida permaneça. Como todo bom banqueiro, para que o Estado, as nações fiquem reféns do capital vadi* nacional e estrangeiro.

Diário Causa Operária Fica claro, então, que, de fato, se trata de um roubo da riqueza do País que é entregue para o imperialismo. Não é isso?

Marcelo Marcelino – Sem a menor dúvida. Inclusive, o Brasil tornou-se, com o Plano Real e ao longo dessas décadas todas que eu mencionei, o país mais estratégico do mundo inteiro no capital financeiro. Veja a loucura. Nenhum país do mundo paga taxas de juros dessa magnitude. Nenhum. É simplesmente um absurdo. Inclusive para países muito menores e menos desenvolvidos que o Brasil. Até mesmo se você pegar uma tabela do salário mínimo dos países da América do Sul, por exemplo, o Brasil está atrás do Paraguai, atrás do Uruguai, que são países muito frágeis em termos de desenvolvimento industrial, o Paraguai praticamente não tem indústria e paga um salário mínimo maior que o do Brasil proporcionalmente à sua moeda.

Então isso tudo ajuda a explicar o grau de dependência do imperialismo. Do imperialismo em conluio com a classe dominante nacional, uma classe dominante colonial secular que age em consonância com a classe dominante emergente do País, que são essas elites financeiras estratégicas do Estado brasileiro.

Diário Causa Operária Para finalizar então, Marcelo, qual é a solução para esse problema? O que vocês propõem no sentido de tirar o Brasil dessa posição de um verdadeiro escravo do capital financeiro, como você discutiu?

Marcelo Marcelino – Precisamos entender o seguinte: para acabarmos com isso, é necessário uma política combativa através de uma enorme mobilização popular. Porque trabalhar com as instituições burguesas do Congresso Nacional, do Judiciário, todos nós sabemos que isso não leva a absolutamente nada. E aí nós temos que trazer o povo para esta discussão, arregimentar forças políticas e explicar a necessidade, através da auditoria cidadã, de fazer um movimento de exigência junto com o Lula para que façamos uma auditoria para marcar o território de uma luta que não é só institucional, evidentemente, mas sim, uma luta política, de classes.

Daí, conseguiremos fazer o seguinte: colocar na agenda a auditoria, verificar quem são os assassinos do povo que trabalham no mercado financeiro com os títulos públicos nacionais, saber quem são esses agiotas.

Então, devemos chegar à conclusão que auditoria só não basta. Ela é um mecanismo para você barrar o pagamento escorchante desses juros, a entrega do patrimônio nacional e estratégico do País. A nossa soberania está sendo colocada em cheque e nós precisamos fazer o seguinte: barrar imediatamente o pagamento de juros e o pagamento dos títulos públicos a esses especuladores nacionais e estrangeiros. Essa é a grande força que nós devemos fazer daqui para frente. E no momento posterior, com bastante força política, quiçá a gente consiga estatizar todo o sistema financeiro. Porque essas lutas, elas precisam cada vez criar mais força popular e política para fazer com que o Estado soberano seja nosso, do povo brasileiro.

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