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ONGs levam R$1,5 bi em 2 anos

Bolsonaro usa ONGs para privatizar saúde indígena

Organizações Não Governamentais atuam em territórios indígenas supostamente para atender à saúde dos índios, mas recebem dinheiro do governo e não fazem seu papel

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─ Murilo Pajolla, Brasil de Fato ─ O governo de Jair Bolsonaro (PL) planeja aumentar a influência privada na saúde indígena, perpetuando um modelo já considerado ineficaz para garantir atendimento às comunidades mais vulneráveis e isoladas geograficamente.
 
Organizações dos povos originários apontam a intenção da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Ministério da Saúde, de terceirizar a entidades privadas funções estratégicas que seriam, por lei, de responsabilidade do estado.

O alerta soou após a Sesai divulgar em novembro uma proposta de edital de contratação de ONGs que vão fornecer mão de obra – técnicos, enfermeiros, médicos e outros – para atuar nos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) espalhados pelo Brasil.

A Mobilização Nacional Indígena (MNI), espaço de articulação de mais de 100 organizações indígenas, indigenistas e ambientalistas, elaborou uma nota técnica classificando a medida como “um avanço na privatização da saúde indígena”.

“Nos parece que o chamamento público está transferindo a entidades privadas um conjunto de atribuições da Sesai, principalmente quanto ao planejamento, coordenação, supervisão, monitoramento e avaliação das ações”, afirma o documento.

“Mais alarmante é indicar que dimensões políticas como a articulação interfederativa com gestores municipais, estaduais e federais está sendo repassada para entidades privadas, que não possuem assento nas instâncias intergestoras do SUS e não terão respaldo para negociar a integralidade da atenção”, prossegue a nota.

Críticas à terceirização 

Atualmente, de acordo com o Ministério da Saúde, 800 mil indígenas são atendidos por 15 mil profissionais da saúde, metade deles também indígenas.

O serviço é intermediado por oito entidades beneficentes de assistência social, a maioria ligadas a igrejas. Juntas, elas receberam quase R$1,5 bilhão da União nos últimos dois anos 2021, segundo o Portal da Transparência do Ministério da Saúde.  

“A privatização vai ser um prejuízo muito grande. Se está difícil agora, vai ficar muito mais. O comando das coisas privadas é o lucro”, criticou o coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) Alberto Terena. 

“Quando falam que vai milhões para a Sesai, eu acredito. Mas falta a gestão com seriedade de secretários, de coordenadores, para que esses milhões que relatam cheguem onde é necessário”, afirmou.

Na experiência de Terena, quanto mais as entidades privadas se apropriam da gestão da saúde, mais difícil fica cobrar a melhoria da qualidade e a ampliação do atendimento à população. 

“Quando você terceiriza, ela [a Sesai] diz: ‘não conversa comigo porque não é mais comigo, é com a conveniada que está prestando serviço para nós. O que acontece é o negacionismo do atendimento ao nosso povo”, afirma.

Perseguição e precarização 

Trabalhadores terceirizados que atuam na saúde indígenas afirmaram ao Brasil de Fato que o modelo baseado na contratação de mão de obra por meio de entidades filantrópicas afeta em cheio a qualidade dos atendimentos de saúde. 

Segundo eles, há casos em que as conveniadas não se responsabilizam como deveriam pela qualidade dos profissionais contratados, e as equipes possuem rotatividade alta, prejudicando a continuidade do serviço. Falta o Ministério da Saúde exigir a elevação dos indicadores de saúde. 

“A gente observa uma carência muito grande de profissionais qualificados com leitura de perfil epidemiológico, com perfil mais resolutivo. O que a gente faz não é só atenção básica, mas em todos os níveis de complexidade”, conta um funcionário ouvido sob anonimato.

Outro fator que interfere na qualidade do atendimento são as condições de trabalho, mais precarizadas em comparação às dos servidores contratados diretamente pelo Estado. Faltam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), e as avaliações anuais de saúde – clínicas e psicológicas – das equipes nem sempre são realizadas. 

“Quando vamos para os territórios recebemos uma ajuda de custo no valor de R$ 35 que ainda é descontada. Já os servidores recebem diárias inteiras e superiores. O valor recebido por nós é para custear a comida e para manter a equipe durante os dias de trabalho, mas ele mal paga os gastos em alimentação”, relata outro trabalhador. 

O trabalho se tornou ainda mais penoso após o início do governo Bolsonaro. Com medo de perseguições e demissões, os funcionários pediram para não ter os nomes ou a região onde atuam revelados. 

“De 2019 para frente as relações com o nível central [Ministério da Saúde] se tornaram hostis. Em alguns casos se observa abuso de poder, orientações sem fundamento que fogem do que determinam as leis complementares da saúde Indígena e a própria Organização Internacional do Trabalho. Sem falar do enfraquecimento da autonomia dos distritos”, atestou um funcionário terceirizado. 

Os Yanomami agonizam 

Uma das maiores vítimas das deficiências do modelo atual são os 35 mil Yanomami, que habitam a mais extensa Terra Indígena (TI) brasileira, na fronteira com a Venezuela. Do mesmo tamanho de Portugal, o território possui taxas de mortalidade infantil e desnutrição mais altas do que a África Subsaariana.

Conforme o Ministério Público Federal (MPF), o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Yanomami não tem profissionais suficientes para atender todo o território, nem garantia de transporte aéreo para conectar comunidades isoladas. Ano a ano, as metas de atendimentos de saúde são descumpridas, alcançando apenas 30% do planejado. 

A responsável pelo atendimento aos Yanomami é a Missão Evangélica Caiuá, criada em Dourados (MS) há quase 100 anos pelo pastor presbiteriano norte-americano Albert Maxwell, com o objetivo de converter indígenas ao cristianismo.

De lá para cá, tornou-se a maior entidade filantrópica a atuar na saúde indígena, mas apresenta os piores resultados, segundo já admitiu durante reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS) o próprio ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, que celebrou convênios com a entidade em janeiro de 2019. 

A ONG atua hoje em nove DSEIs, que abrangem todo o Mato Grosso do Sul, Amazonas, Acre e Roraima. Para tanto, recebeu do governo brasileiro mais de R$ 430 milhões nos últimos dois anos, 30% de todo o orçamento destinado às entidades privadas. 

Em 2012, a ONG foi alvo, junto com a União, de uma ação civil pública trabalhista. O Ministério Público do Trabalho (MPT) exigiu a melhoria das condições de segurança, saúde e higiene para as equipes, e o processo terminou com um acordo entre as partes. 

Os pedidos de esclarecimentos enviados à Missão Evangélica Caiuá não foram respondidos.

Reformulação

Um dos caminhos para sair da crise seria reduzir da terceirização na gestão da saúde, defende o coordenador da Apib. “A Sesai teria que ter os departamentos bem estruturados para que ela própria pudesse cumprir o propósito para o qual foi criada”, diz Terena.

Para os terceirizados, a solução passa pela abertura de concursos públicos e a seleção de funcionários com experiência comprovada com povos originários. Deve-se também exigir mais qualidade nos indicadores e ampliação dos atendimentos em territórios críticos. 

“Assim poderíamos produzir informações que possam gerar políticas eficazes e que atendam às realidades locais. A saúde indígena é linda no papel, mas seu crescimento é lento devido às interferências políticas no processo de amadurecimento da Sesai”, opinou um trabalhador. 

O outro lado 

Questionado pela reportagem, o Ministério da Saúde respondeu que a proposta de edital criticada por entidades dos povos originários é uma “oportunidade de melhoria nesse modelo” e foi submetida à consulta pública. 

“As interpretações distorcidas podem ser facilmente derrubadas olhando-se a documentação da consulta pública e cujo teor será levada ao debate por ocasião da 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena”, diz nota enviada ao Brasil de Fato

“A Sesai esclarece que o atual modelo de convênio para entidades que atuam na saúde indígena remete à criação da própria Sesai (Lei nº 12.314/2010), que herdou essa modalidade da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), conforme política estabelecida por governos anteriores”, pontua o Ministério da Saúde.

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