Na última quarta-feira (03), antes do início da partida entre América-MG e Athletic, válida pela 2ª rodada do campeonato mineiro e vencida pelo América por 1 x 0, o técnico Lisca Doido, do Coelho, aproveitou o momento em frente às câmeras de TV e fez um desabafo em relação à continuidade do calendário do futebol brasileiro em meio ao agravamento da pandemia do coronavírus no Brasil. A declaração do treinador repercutiu no meio futebolístico e social do país, atraindo concordâncias e divergências.
Lisca, que de doido tem só o apelido, clamou pelo bom senso à Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que, no dia anterior, fez o sorteio dos confrontos da Copa do Brasil. Para quem não está familiarizado, a Copa do Brasil é a maior competição em termos de participação do Brasil. E, devido ao seu modelo de mata-mata, torna-se também o mais competitivo e democrático, contando com a participação de equipes de todos os estados brasileiros e de divisões diferentes. Ao todo, 80 clubes disputam a competição. O próprio América de Lisca, mesmo disputando a série B do campeonato brasileiro, chegou às semifinais da edição de 2020, derrotando equipes poderosas como Internacional e Corinthians com um futebol muito bem jogado. Acontece que devido à natureza da competição, os clubes fazem grandes deslocamentos, geralmente em voos comerciais, o que põe em exposição uma grande quantidade de pessoas (o próprio treinador cita o número de 30 pessoas por delegação). Para se ter como exemplo, o América enfrentará o Treze, tradicional clube da Paraíba, estado que está com mais de 80% de ocupação dos leitos de UTI para a Covid-19.
É nesse cenário que Lisca denuncia os descaso da CBF e suas autoridades com as vidas dos profissionais de futebol no Brasil. No futebol, assim como na sociedade em geral, há diferentes níveis econômicos e políticos. Por exemplo, um clube de futebol é composto por jogadores, comissões técnicas, equipes de saúde etc. Há também funcionários que, em boa parte, são menos remunerados e dependem de transporte público para deslocamento ao trabalho. Além disso, entre os clubes há gritantes diferenças econômicas. Alguns recebem mais verbas de patrocínio, outros não conseguem nenhum recurso para além de fechar a folha de pagamento. Nesse sentido, que tipo de segurança os profissionais de clubes menores têm como garantia? Caso se contaminem no exercício da profissão, quem se responsabilizará?
É isso que Lisca trouxe ao jogo corretamente. A CBF, empresa envolvida em inúmeros escândalos de corrupção durante sua história, não está nem aí para o futebol brasileiro. A ela interessa apenas os seus lucros, e, para isso, depende da manutenção do calendário esportivo deste ano. É importante salientar que o futebol brasileiro movimenta bilhões de reais anualmente. São diversas empresas de grande porte que põem dinheiro nos eventos, investimentos que devem dar retorno aos capitalistas, haja o que houver. A Globo, empresa que propaga um discurso extremamente demagogo durante a pandemia, não tem o mínimo interesse na paralisação do futebol brasileiro, pois corre o risco de perder audiência, logo, dinheiro de publicidades.
Do mesmo modo, os banqueiros têm imenso interesse na continuação do futebol. Além de muitos deles patrocinarem os principais times (como Flamengo, São Paulo, Vasco, Corinthians, Palmeiras etc), os clubes possuem empréstimos milionários com os bancos. Ou seja, se o futebol para e a situação financeira (que já é calamitosa) dos times se agrava, corre-se o risco de uma profusão de calotes milionários.
Diante disso tudo, é preciso repercutir e defender o posicionamento de Lisca Doido, técnico que demonstra não apenas ter boa performance na montagem de suas equipes, mas um posicionamento correto e corajoso fora dele.
