Aliados do governador de São Paulo, João Doria, manifestaram suspeitas sobre o sistema eletrônico de votação por celular chamado Prévias do PSDB ─ produzido exatamente para fazer a contagem de votos nas primárias tucanas.
Pessoas próximas do político engomadinho que disputa a candidatura à presidência da República pelo PSDB dizem que o formato de votação por aplicativo não é confiável. Como alternativa, sugeriram o retorno do voto com o uso de cédulas de papel. A fração aliada de Doria aguarda um parecer da consultoria Kryptos para decidir se leva adiante uma queixa à direção nacional do partido.
Uma das argumentações contra o aplicativo Prévias do PSDB é que ele pode apresentar falhas ou ser manipulado, o que significa fraude eleitoral. O principal adversário de Doria é o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. Ambos afirmam que têm maioria partidária para aprovar as respectivas candidaturas. Voltamos ao tema da lisura e transparência dos processos eleitorais com sistema eletrônico, um debate que parecia estar encerrado.
O que é irônico nessa discussão é o fato de que o PSDB se destacou, meses atrás, na defesa da “inviolabilidade” e “transparência” do voto eletrônico. Esses argumentos eram centrais no debate contra os defensores do voto impresso, que por sua vez argumentavam que era necessário aumentar a transparência e facilitar a fiscalização nas eleições.
João Doria e a direita sabem que as urnas eletrônicas são passíveis de fraude, embora repitam o mantra da inviolabilidade em público. A adesão da esquerda pequeno-burguesa à argumentação da inviolabilidade das urnas é que deixa o assunto trágico no que diz respeito ao direito de representação política popular. A direita sempre fraudou as eleições para manter o controle do regime político e tem um leque de recursos para fazê-lo, que podem passar pela urna ou não. Mas o fato é que o sistema é perfeitamente passível de ser fraudado.
Diante de uma disputa interna acirrada no principal partido da burguesia e do imperialismo no Brasil, os direitistas apelam para o voto impresso e até mesmo para o sistema de cédulas. Pelo visto, a fraude nos olhos dos outros é refresco.
O Congresso Nacional dominado pelos partidos da direita golpista (PSDB, MDB, União Brasil, Progressistas, Republicanos, PTB, PL, SD) não aprovou a PEC do Voto Impresso por uma questão de conveniência política. Eles não querem de forma alguma que o sistema seja mais fácil de ser fiscalizado pela população. A fiscalização deve ser monopólio das instituições do regime (TSE, Forças Armadas, STF) e o conhecimento necessário deve estar nas mãos de uma pequena camada de especialistas, capazes de decifrar o misterioso “código-fonte”. Vale destacar que a quase totalidade da população sequer tem ideia do que significa um código-fonte e não domina a informática, inclusive as parcelas mais escolarizadas.
O voto impresso é um avanço e permite que a população tenha um mecanismo de fiscalização sobre a veracidade de seu voto. Em outras palavras, é um direito democrático dos eleitores que não é garantido em apenas 3 países dos 15 que adotaram a urna eletrônica.Trata-se de uma garantia a mais, um mecanismo adicional de fiscalização. Em todo caso, uma observação se faz necessária: os representantes do imperialismo defendem a urna eletrônica, apesar de os principais países imperialistas não o utilizarem.
Caso os eleitores tenham dúvidas, é possível cruzar os votos impressos com os dados das urnas eletrônicas. Portanto, o voto impresso é progressivo e o presidente fascista Jair Bolsonaro (ex-PSL, sem partido) somente o propôs por força de contradições em virtude de seus próprios interesses que, neste aspecto em particular, se chocam com a posição dos partidos dominantes da burguesia.
A posição dos partidos burgueses e da imprensa capitalista decididamente contra o voto impresso deveria levantar suspeitas em toda a esquerda e no povo. Contudo, quando se trata de suas disputas políticas, os direitistas vazam que o sistema é fraudulento e manipulável e solicitam o retorno ao voto em papel. A posição dos aliados de Doria nas prévias do PSDB é inequívoca.
A esquerda não considera que o Estado burguês é em si mesmo uma fraude. A essência da democracia burguesa consiste em distorcer a representação popular e fazer com que os piores carrascos do povo se apresentem como “democraticamente eleitos pela vontade popular”. Afinal, como dizem, se o povo os escolheu pelo voto livre, democrático, universal e eletrônico, o que fazer então? Sob este ponto de vista, a responsabilidade recai sobre o próprio povo em relação à sua miséria. No entanto, as suspeitas de Doria demonstram que algo pode estar errado nessa equação e que o bilhete pode estar sendo…falsificado.