Colômbia: um peão do Império

Colômbia fecha fronteiras em antecipação à greve geral

O fechamento de fronteiras e acionamento das forças de segurança pelo governo colombiano para atuar durante a greve geral sinaliza um medo de desestabilização e risco para os EUA.

Ivan Duque, presidente da Colômbia, fez pronunciamento nessa terça-feira para informar sobre medidas do governo após confirmação da greve nacional marcada para ter inicio na quinta-feira, dia 21 de novembro: fechamento de todas as suas fronteiras fluviais e terrestres[1], que deve vigorar a partir da meia-noite de quarta-feira até as 05:00 da manhã de sexta-feira; suspensão do porte de armas; e controle de imigração[2].

A verdade é que o governo colombiano está muito preocupado com a greve, com a possibilidade de que, seguindo o exemplo do Chile, haja uma desestabilização política (e econômica) do país, o que implica que o imperialismo correria risco real de perder de vez o controle na região, uma vez que a Colômbia é o país mais alinhado e submisso aos EUA no continente latino-americano.

Os riscos (e o medo) de que essa greve descambe para enfrentamentos violentos não é despropositado. A Colômbia tem uma longa história de violência contra o seu povo e de ‘apoio’ norte-americano na repressão dos seus cidadãos, mas os conflitos internos, a luta pelo poder, são parte integrante da história do país.

A Colômbia só perde para o Brasil em termos de biodiversidade e de extensão na região amazônica. Além de minérios e petróleo, o país detém, portanto, potencial enorme de exploração, sendo alvo de biopirataria. Embora o interesse norte-americano, do imperialismo, venha de longe, assim como sua ingerência no país, o povo colombiano tem tradição de luta.

Um país de conflitos e guerras

Entre 1948 e 1953, o país experimentou uma guerra civil não declarada conhecida como “La Violencia”[3], resultante do confronto entre entre o Partido Conservador e o Partido Liberal. Ambos partidos da burguesia: o primeiro representante da oligarquia Rural e o segundo de setores urbanos com um projeto modernizador e de desenvolvimento nacional. Em 1948, com o assassinato de Jorge Eliécer Gaitán, do partido Liberal, que contava com apoio de operários e camponeses[4], e após intensa agressão aos camponeses de diferentes regiões do país, tem-se início uma infinidade de manifestações sem todo o país, descambando numa verdadeira guerra civil.

O movimento revoltoso, graças à Guerra Fria, foi ótima desculpa para que os Estados Unidos se apresentassem e apoiassem os Conservadores, iniciando assim um período de repressão (La Violencia) que levou 200 mil pessoas à morte. Quase seis anos de guerra civil, não impediram que a concentração de renda aumentasse, produzindo uma maior desigualdade social.

É nesse contexto que, por outro lado, fortalece-se a resistência popular-armada, a partir de grupos de camponeses que fugiram de suas terras e se confinaram na selva para se proteger da violência partidária, surgiram movimentos de autodefesa. Esses grupos, em 1964, darão origem às Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colômbia (Farc) e ao Ejército de Liberación Nacional (ELN), já influenciadas pelo socialismo cubano.

Plano Colômbia

Os Estados Unidos continuaram a apoiar e financiar o combate à guerrilha durante o resto do século XX, no final do qual propõem o Plano Colômbia (2000), com a desculpa de combater o narcotráfico, um problema gerado pelos próprios interesses “ilegais” do capitalismo com o tráfico de drogas[5].

O Plano Colômbia[6]  é um acordo bilateral entre os governos da Colômbia e dos Estados Unidos, com objetivos declarados de: criar uma estratégia para eliminar o narcotráfico no território colombiano; por um fim ao conflito armado na Colômbia[7]; promover o desenvolvimento social e econômico.

Álvaro Uribe (2002-2010) deu seguimento ao Plano, dando-lhe um caráter mais efetivo de securitização, ou seja a ênfase foi para as questões de segurança. Os custos do Plano Colômbia foram pagos pela comunidade internacional (União Europeia e Estados Unidos).

Aproveitando o ambiente criado pelos atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos, o presidente Uribe decidiu requalificar o conflito colombiano como guerra contra o terrorismo, distinguindo-o da situação de conflito interno ou guerra civil.

Desde então, com a desculpa de combater ‘narcoterroristas’, o governo colombiano desobrigou-se de promover políticas de combate à desigualdade ou de qualquer outra política de cunho social, e questões como concentração de renda e riqueza, por exemplo, foram obscurecidas por uma guerra sem fim, alinhada com a visão norte-americana de “guerra mundial contra o terrorismo”.

Isso foi pensado para continuar a receber apoio (inclusive financeiro) dos EUA e também da União Europeia que, a essa altura, já replicava a alucinada política de segurança do Estado reformatada pelos norte-americanos, que coloca em segundo plano até o desenvolvimento econômico, assim como o bem-estar da população e, claro, os direitos humanos.

A militarização foi reforçada, com os maiores aportes orçamentários para as forças armadas[8] que o país já tinha conhecido, assim como da política. O país se tornou um modelo do que o imperialismo deseja da América Latina.

Colômbia: “el peón más sumiso” dos EUA

Com a entrega das armas por parte das FARC[9], em 2016, o Plano Colômbia foi substituído pelo programa Paz Colômbia. Na ocasião, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, anunciou a concessão de um apoio econômico de mais de 450 milhões de dólares. De forma que, a Colômbia mantém-se fiel ao imperialismo e ao que ele pode comprar.

Uma greve geral, no atual contexto de conflitos no continente, contra a política neoliberal produzida e promovida pelo imperialismo, poderia significar, na tradição dos colombianos, o início de um longo conflito que facilmente poderia transformar-se em uma guerra civil, apenas mais uma entre as tantas que o país já conheceu. O medo do governo de Ivan Duque é procedente e o momento, para os norte-americanos, com seus problemas internos pipocando, pode ser fatal.

 


NOTAS:

[1] Isso afeta 12 pontos da fronteira: Equador, Venezuela, Brasil e Peru.

[2] Foram baixadas também “instruções em matéria de ordem pública” para prefeitos distritais e municipais.

[3] A Colômbia, no entanto, têm uma história plena de violência e embates. Em 1930, o liberal Enrique Olaya Herrera chegou ao poder – após um período de domínio do Partido Conservador e a celebração dos liberais foi feita com massacres, assassinatos, saques e a destruição de propriedades e queima de igrejas (maiores em Santander e Boyacá).

Antes disso, temos a guerra civil de 1884-1885, cujos combates iniciaram em Santander (1884) e depois na região de Cauca (1885). Posteriormente, Alguns generais próximos ao Partido Liberal se rebelaram, em Outubro de 1899, na cidade de Socorro, e deram seguimento ao que ficaria conhecido como a Guerra dos Mil Dias, somente encerrada em 1902.

Enquanto os liberais tiveram apoio de setores liberais da Venezuela, Equador, Guatemala e Nicarágua, os conservadores receberam a ajuda dos Estados Unidos e dos conservadores venezuelanos.

Os conservadores, que contaram com a colaboração dos fuzileiros navais dos Estados Unidos, acabaram se impondo e venceram a guerra, cujo saldo chega a cerca de 100 mil mortes. Em 1903, o Panamá separa-se da Colômbia, apoiada pelos Estados Unidos.

[4] Isso se deveu ao fato de que o Partido Liberal tinha um discurso e uma prática ‘populista’ que era muito mais atrativa para os trabalhadores do que a do Partido Conservador.

[5] Nos anos de 1970, iniciou-se na Colômbia o plantio da maconha, para logo ser introduzido o cultivo da coca, tirando da Bolívia e do Peru a primazia. Além desses houve também a introdução da papoula, antes um monopólio asiático.

Apesar de uma grande produção de maconha, foi o cultivo da folha de coca, seu processamento e o tráfico da cocaína as atividades mais. Segundo dados do Departamento de Estado dos EUA, 2000 foi o ponto mais alto da produção de cocaína na Colômbia, atingindo uma área de cultivo de 163 mil hectares, e remessa de cocaína para o exterior de cerca de 700 toneladas/ano. O país chegou a controlar quase 60% do negócio no mundo.

[6] Inicialmente denominado Plano pela Paz da Colômbia, conforme proposta do presidente Andrés Pastranas (1998-2001).

[7] Em 1999, a guerrilha já durava 40 anos. O Plano Colômbia, então, tinha objetivo claro de desestruturar os grupos guerrilheiros, em particular as FARC.

[8] Durante o governo Uribe, o Plano Colômbia destinou ao desenvolvimento social e ao reforço das instituições apenas 26% dos recursos disponíveis. Para o reforço das Forças Armadas e da Polícia, foram destinados 74% dos recursos. Entre 2001 e 2008, foram repassados cerca de 1,3 bilhões de dólares à Colômbia, no âmbito do Plano.

[9] .  Um acordo de paz entre o governo colombiano e as FARC que mostrou-se uma armadilha para a guerrilha.

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