Há 221 anos, em Salvador, um grupo de revolucionários liderados pelo médico e filósofo Cipriano Barata distribuiu panfletos nas portas das igrejas conclamando a uma insurreição popular pela independência de Portugal, proclamação da República e libertação dos escravos, abertura dos portos. A sedição seria traída e brutalmente reprimida pela Coroa portuguesa, com execução de alguns de seus líderes. O episódio também ficaria conhecido como Conjuração bahiana, Revolta dos Alfaiates ou Revolta dos Búzios.
No final do século 18, a cidade e a Capitania da Bahia como um todo vivenciava uma crescente crise política. Se a mudança da capital da América Portuguesa de Salvador para o Rio de Janeiro em 1763 reduzira a capacidade administrativa da metrópole no local, o comércio da cana-de-açúcar e do tabaco estava aquecido, dando mais poder às oligarquias locais.
Além disso, iniciara-se um novo e definitivo ciclo das revoluções burguesas, com a independência das colônias inglesas e a Revolução Francesa, os ideais republicanos espalhavam-se também no Brasil, conforme a própria Inconfidência Mineira, ocorrida dez anos antes, atestava. Livros como as obras de Voltaire ou a Encyclopédie de Diderot e D´Alembert circulavam ilegalmente nas camadas letradas da sociedade colonial, como o clero, a burguesia, os militares.
Na Bahia não foi diferente, e a crise política culminou na eclosão da insurreição, primeiro com onze panfletos colados em locais de grande movimento público da capital, Salvador. Um deles vaticinava: “Animai-vos Povo baiense que está para chegar o tempo feliz da nossa Liberdade: o tempo em que todos seremos irmãos: o tempo em que todos seremos iguais” – escrito talvez por um dos principais líderes, o ilustrado fazendeiro formado em Coimbra, Cipriano Barata (1762-1838). A principal base popular da revolta, porém, eram os milicianos recrutados à força com baixos salários para servir à repressão da Coroa, bem como a pequena burguesia local, oprimida pelos altos impostos e pelas leis restritivas ao comércio.
Sem capacidade de organização efetiva, mal-armados, denunciados por membros do próprio movimento, os inconfidentes acabaram debelados e condenados. Centenas de pessoas foram denunciadas, 49 foram presas, quatro líderes considerados menores – negros, mulatos, pobres – foram condenados à morte e enforcados em 8 de novembro de 1799. Muitos de seus dirigentes, porém, se manteriam politicamente ativos. O próprio Barata participaria da revolta republicana de Pernambuco em 1817 e seria deputado constituinte nas Cortes de Lisboa em 1821, pugnando sempre pela liberdade da colônia.
As insurreições da pequena-burguesia ilustrada no Brasil do final do século 18 mostra as limitações dos movimentos revolucionários carentes de organização e base popular, ou apoio real de verdadeiras forças políticas. Não bastam ideias para derrubar a classe dominante, para libertar o povo do jugo opressor. É necessário ter à mão forças reais capazes de dar combate à reação.