Matéria escrita por três jornalistas (Amanda Lemos, Daniel E. de Castro e Natália Portinari) denuncia a ditadura e o estado policialesco pelo qual passa o Brasil. O título da matéria é contundente: “Morar em favela do Rio é agravante em condenação por tráfico de drogas”. Ser pobre, ser obrigado a viver na favela que além de ter condições horripilantes de saneamento básico, assassinatos a todo o tempo (massacres e execuções como modus operandi das polícias), agora também já é crime.
Em relato, a matéria fala sobre um jovem de 20 anos, morador de Manguinhos, Zona Norte do Rio, que foi preso, pois correu quando a polícia perseguia (presumidamente) traficantes. Não portava drogas e não portava armas: era pobre e do morro.
Foi preso preventivamente (situação que mantém 44% dos encarceirados brasileiros “esquecidos” na prisão sem mesmo terem sido julgados) e condenado a sete anos e seis meses de prisão pelo crime de associação ao tráfico. Qualquer razão é o bastante para pôr pobre e favelado na cadeia e isso agora é uma máxima comprovada.
O que afirma a sentença: “O local da prisão é conhecido como sendo de tráfico de drogas, sendo realizado por facção criminosa, no caso o Comando Vermelho”.
O agravante de associação ao tráfico aumenta, em média, em dois anos a pena do condenado.
De mais de 82 mil mandados de prisão por tráfico de drogas no Rio de Janeiro, em 41% dos casos o réu era acusado ou foi condenado também por crime de associação ao tráfico.
Emanuel Queiroz Rangel, coordenador de defesa criminal do Rio de Janeiro afirma”
“O Ministério Público pergunta ao policial: essa área é dominada por facção? Sim. Já bastou, o cara tomou mais três anos como se associado ao tráfico fosse. Isso é rotina”
Para o defensor, a acusação dupla é uma estratégia da Polícia Civil e do Ministério Público para inviabilizar pedidos de liberdade provisória, uma vez que penas acima de oito anos são inicialmente cumpridas em regime fechado.
O depoimento de um policial (agente criminoso oficial do Estado) já basta como elemento de prova para a condenação criminal: o inimigo do povo já basta para prender o povo. Dois pobres andando juntos na favela já são criminosos com duas penas: traficantes e integrantes de quadrilha, já que a ligação com apenas mais uma pessoa já dá o agravante de três a dez anos de reclusão. Junte-se a isso a pena por tráfico (de cinco a quinze anos) e o sujeito está preso sem provas(por relato de seus inimigos e por morar na favela) para sempre.
Não existe julgamento, não existe defesa, não existe advogado, lei, constituição, democracia para o favelado. Existe depósito humano, “cadeião”.
“A lei cita as circunstâncias do local da prisão e a circunstância social do réu [como critério do que é tráfico e o que é consumo], então depende pura e simplesmente do local onde você foi preso.”