Ontem, quinta-feira (17), foi transmitida mais uma aula, a terceira, da Universidade Marxista Brasil, 500 anos de história. Dessa vez, o tema apresentado pelo companheiro Rui Costa Pimenta, presidente nacional do Partido da Causa Operária, foi a história de Portugal. Mais especificamente, sua formação inicial bem como seu processo de unificação.
Para tal, como introdução, Pimenta explicou a necessidade e a importância de estudarmos a história portuguesa, iniciando com uma breve polêmica envolvendo o etnocentrismo.
A picaretagem intelectual por trás das críticas ao “etnocentrismo”
Nas últimas décadas, uma concepção particularmente demagógica surgiu dentre os intelectuais da esquerda pequeno-burguesa: a crítica ao etnocentrismo. Basicamente, consiste na crítica ao estudo do desenvolvimento social da humanidade que coloca como central o problema da Europa.
Rui Pimenta explica que, por si só, essa já é uma ideia sem sentido. Afinal, de qualquer forma você estaria errado, segundo essa lógica identitária, por contar a história de uma maneira unilateral. Uma vez que é necessário contar a história com base em algum ponto de vista, aqui, não existem vazios. Entretanto, Rui continua, o problema do etnocentrismo é mais fundo do que isso.
Provindo das obras de Lévi Strauss, antropólogo francês, a tese do etnocentrismo atribui um caráter moral à história. “Se você é eurocêntrico, você é mau. Se você for ‘tupicêntrico’, você é bom. Porque o Tupi é bom, e o Europeu é mau. Mas por que esses grupos seriam bons ou ruins?”, disse Rui.
Nesse sentido, a análise histórica é resumida a uma luta entre o bom e o mau, sempre baseado na moral vigente do analista. Ou seja, um anacronismo por definição. Finalmente, a história deve ser estudada com base no desenvolvimento das sociedades sob uma ótica econômica. Esse é o método do materialismo histórico, do marxismo.
Logo, quando vamos estudar a história do Brasil, é preciso estudá-la do ponto de vista europeu, porque a Europa era, de maneira absoluta, o centro dinâmico do planeta Terra.
“O mundo que vivemos é o capitalismo, que é uma grande porcaria mas que é uma evolução muito grande […] Os países foram atraídos para a órbita do capitalismo. E tudo isso se deu na Europa”, explica Pimenta
Ademais, Rui mostra como essa é uma questão fundamentalmente religiosa, moralista. Afinal, é a tentativa de mudar a história do mundo para mudar a justificativa de determinado grupo:
“Não faz sentido mudar a história do mundo para mudar uma justificativa besta do porquê um senhor de escravo fez o que fez […] A escravidão não foi uma questão do bom contra o mal, uma questão de fraqueza de determinado grupo. Mas sim, uma questão econômica.”
A importância do estudo da história de Portugal para o Brasil
Vemos, então, que a recusa ao que é europeu na história provém de uma campanha ideológica do identitarismo que visa, em última instância, apagar a história de determinado povo. Por isso é importante que conheçamos a história de Portugal. Dessa maneira, sabe-se como se deu o processo histórico-social no Brasil, as duas coisas estão absolutamente conectadas.
“Existe um clima de que o brasileiro tem vergonha de ter vindo do português. Isso é uma campanha ideológica que visa apagar a história do Brasil, pois a história de Portugal é, também, a história do Brasil”, mostrou Rui.
A história de Portugal
Para entender a história de Portugal, é preciso conhecer aspectos fundamentais da formação inicial do que seria um país.
Formação territorial inicial
Rui começou a questão falando justamente sobre a questão étnica de Portugal. Note que não existe uma raça portuguesa. Portugal é composto de uma miscigenação imensa. Ou seja, não existe uma concepção de raça pura, tal qual existe nos EUA e na Alemanha. Mas qual a razão disso?
“Portugal é um braço de mar, é uma praia. Um dos motivos da miscigenação muito intensa no país é que as pessoas vinham brigando de dentro do continente europeu e, chegando em Portugal, não tinham mais pra onde correr, por conta do mar, e ficavam lá”, explicou Rui Pimenta.
Essa característica física, por sua vez, foi determinante para uma série de fatores característicos do desenvolvimento econômico português. Não é à toa que Portugal, o nome, significa “Grande Porto”. Vem, na realidade, do que hoje é a cidade do Porto, explicou o companheiro Rui:
“Ele [o reino de Portugal] não se organizava como acontecia na França, num interior rural. Ele se organizava a partir do Porto, ou seja, uma economia mais de tipo capitalista. A cidade era tão importante como ponto econômico que deu nome ao país.”
Mais à frente da formação das províncias romanas Galécia e Lusitânia, berços da sociedade portuguesa, bárbaros (alemães) invadiram a Península Ibérica e, com isso, destruíram as instituições políticas vigentes. Dando lugar, portanto, a uma espécie de feudalismo. Entretanto, veremos qual a diferença entre esse feudalismo e o do resto da Europa.
Depois, seria a vez dos árabes que, formando um dos maiores impérios de todo o mundo, conquistaram quase toda a Península Ibérica. Foi o exército de Carlos Magno que impediu que os árabes conquistassem toda a Europa o que, mais tarde, engendrou a queda do império muçulmano.
Fica claro, então, que houve uma variedade muito grande na formação de Portugal. Diversos povos participaram desse processo o que, mais pra frente, contribuiu para a peculiaridade do desenvolvimento econômico português.
O início de Portugal como nação
A essa altura do campeonato, a região onde hoje se encontra Portugal era composta por Portugal e a Galiza, províncias do reino espanhol de Leão. Na luta contra os árabes, após a sua expulsão, mais de 60% da península ibérica fica nas mãos dos cristãos, dos europeus. Para tal objetivo, os espanhóis tiveram a ajuda de várias nacionalidades, principalmente os franceses.
Com isso, a filha do Rei de Leão é enviada para se casar com uma das casas nobres francesas importantes, chamada de Borgonha. Como herança para a filha, o Rei deixa o condado de Portugal. Então, surge o país Portugal.
“O filho dessa mulher vai se aliar aos comerciantes do condado. Depois que seu pai morre, vai travar uma guerra contra a própria mãe que era apoiada pelos nobres da Galícia e, com isso, vai tornar o país independente […] Quem fez isso foi o Afonso Henriques, considerado o fundador de Portugal”, colocou Pimenta.
Depois que Afonso estabelece o seu domínio sobre o condado, ele leva adiante uma guerra contra os Árabes e vai reconquistar a parte Sul do país, formando, basicamente, o que conhecemos hoje como Portugal. Oficialmente, Portugal se torna país quando o Papa reconhece sua independência.
A importância da unificação portuguesa
Seguindo sua exposição na Universidade Marxista, o companheiro Rui Costa Pimenta explica as consequências econômicas e políticas da unificação de Portugal em relação com demais países europeus:
“Portugal vai ser um dos primeiros estados unificados da Europa. Ou seja, é um desenvolvimento político e econômico muito precoce. Enquanto a Espanha estava dividida em vários reinados, Portugal já era unificado, apesar de pequeno, sob um governo único. E esse governo tinha uma vantagem sobre os outros governos, que era, em parte, resultado da ocupação árabe. Os árabes não estabeleceram na Europa um sistema feudal. Eles deixavam o comércio e a pequena agricultura se desenvolverem de maneira privada e cobravam um imposto. Portugal herda a política desse imposto […] Isso é importante, pois não vamos ter em Portugal um feudalismo como no resto da Europa, uma vez que predominavam os pequenos agricultores. Ou seja, o país já tinha uma base mais democrática”, explicou Rui.
Mais uma vez, a questão geográfica impõe condições muito específicas a Portugal. Além de já nascer com uma herança cultural e política muito grande por conta de sua história, além de ser o primeiro país unificado da Europa, sua economia será muito diversificada: os portos serão centros de comércio muito intensos, resultando, no final, em um país com um processo econômico bastante evoluído.
Diferente do que ocorria no resto da Europa, que baseava a sua atividade comercial no Mar Mediterrâneo, por meio de um comércio com o Norte da África, Portugal tem a possibilidade de um comércio pelo outro lado do continente, o que é uma alavanca importantíssima para o seu desenvolvimento. Ademais, os próprios produtos portugueses serão diversificados:
“Os reis portugueses, depois da unificação do país, vão se preocupar com o povoamento do interior e com o desenvolvimento da agricultura. A agricultura que eles vão desenvolver não é de subsistência, mas sim de produtos finos, como por exemplo o vinho e o azeite de oliva. […] Entretanto, o vinho, o azeite e o queijo não são um produto em si, mas sim formas de conservação de um produto agrícola. Você perde a oliva e a uva após poucos dias, enquanto que o azeite e o vinho são muito duradouros […] Nesse sentido, os reis não estavam só impulsionando a agricultura, mas sim uma indústria de produtos finos, uma produção industrial”, apontou Rui durante sua análise.
Inscreva-se hoje mesmo!
As inscrições para o curso Brasil, 500 anos de história ainda estão abertas. Ou seja, não perca mais nenhuma aula e acesse agora mesmo o site da universidade marxista por meio deste link.
Além disso, a primeira aula do curso está disponível gratuitamente pelo canal no YouTube Causa Operária TV (COTV). Confira, abaixo, o vídeo na íntegra e descubra o que lhe aguarda: