É quase inacreditável a propensão que alguns setores da esquerda têm em cair em conversa mole. Já tem gente elogiando a latifundiária, senadora que votou em tudo com Bolsonaro, Simone Tebet. Esse é um dos efeitos dessa onda identitária. Para os seguidores desse modismo, basta uma mulher falar em feminismo que já está automaticamente autorizada, mesmo que se trate de uma golpista que não defenda os interesses das mulheres, principalmente das trabalhadoras.
Onde estava a defesa da mulher quando a senadora votou pelo impeachment de Dilma Rousseff, especialmente quando todos sabiam que não havia crime?
Em uma matéria assinada por Ricardo Nêggo Tom, no Brasil 247, o autor afirma que Tebet “mostrou que sua candidatura pode ser útil ao debate político e social. Principalmente, quando se declara feminista e diz que o feminismo não pertence à esquerda ou direita. Falou com firmeza, clareza e tranquilidade, e conseguiu se dirigir a todos os brasileiros”.
A única “utilidade” que a candidatura de Simone Tebet poderia ter é nos dar a possibilidade de desmascarar o identitarismo, que não passa de uma ideologia burguesa introduzida na esquerda para causar divisão e confusão no movimento.
A burguesia quer tirar Bolsonaro do poder e colocar alguém ainda pior, o mesmo movimento que foi feito nos EUA. Tiraram um presidente horrível, Donald Trump; e colocaram em seu lugar um terrível, Joe Biden. Na ocasião, com exceção deste Diário, houve comemoração em quase toda a esquerda. Como se a civilização tivesse vencido a barbárie. Difícil ligar Biden à civilização, um sujeito que, apenas para citar um exemplo, é um dos grandes responsáveis pela invasão ao Iraque.
Bolsonaro é um presidente improvisado, difícil de domesticar porque tem uma base social que o obriga a não pisar fundo demais no acelerador. A burguesia quer alguém fácil de controlar e está apostando suas fichas em Simone Tebet. Ela é a candidata do imperialismo, Bolsonaro continuará como plano B.
O truque para eleger Biden, esse crápula, foi fazer o falso jogo de “civilização x barbárie”; apresentar seu adversário como espantalho e, claro, apelar para as ‘pautas identitárias’, como colocar uma mulher negra na vice-presidência e montar um gabinete bem colorido. A esquerda caiu feito um patinho na conversa. Apoiaram Biden e a primeira coisa que ele fez no poder foi bombardear a Somália, só par mostrar o quanto ele se preocupa com os negros.
No Brasil estão usando os mesmos estratagemas: civilização x barbárie; Bolsonaro espantalho; candidata mulher com vice cadeirante… um prato cheio para o identitarismo. Não espanta que determinados setores da esquerda aplaudam uma senadora bolsonarista, afinal, trata-se de uma mulher, latifundiária, mas mulher.
Teto de gastos
Simone Tebet defende o teto de gastos. Quem defende essa proposta neoliberal está se preocupando com os bancos, com sistema financeiro, não com a população, ainda que tentem vender sua imagem como “mãe dos pobres”.
Não se pode investir em políticas públicas quando se obedece o teto de gastos. É retirado dinheiro da Saúde, o que é fundamental para as mulheres, que é o setor da sociedade que mais sofre nos momentos de crise. Dá para notar com isso o quanto a senadora defende as ‘pautas feministas’.
Quando Tebet afirma que o ‘o feminismo não pertence à esquerda ou direita’, está afirmando com todas as letras que é uma direitista. É preciso ser muito ingênuo ou desavisado para cair nessa conversa mole. A direita não defende os direitos das mulheres, antes o contrário.
Golpista
Será que essa gente se esqueceu que Simone Tebet é uma golpista? Qual foi o resultado do golpe? Bolsonaro é resultado do golpe. As perdas dos direitos trabalhistas e previdenciários são resultado do golpe. As mulheres trabalhadoras estão vivendo melhor agora? É preciso confrontar o resultado do golpe, do qual Simone Tebet faz parte, com esse discurso vazio. Não dá para elogiar essa tremenda demagogia.
A dificuldade de os identitários fazerem uma leitura política dos fatos, é que enxergam o mundo do ponto de vista da moral. Para um moralista, toda mulher é oprimida e, portanto, deve ser protegida. Ora, será que uma latifundiária que ajuda a tirar da presidência outra mulher que não cometeu crime pode ser classificada como oprimida?
Bastou Simone Tebet se dizer feminista para isso automaticamente ser tratado como verdade. Uma inimiga das mulheres, é disso que se trata essa senadora.
A esquerda precisa entender o quão pernicioso é o identitarismo. Uma mulher não pode falar em nome das mulheres pelo simples fato de pertencer ao mesmo sexo. Isso vale para negros, indígenas etc. É preciso estar de fato inserido dentro da luta pelos direitos para se ter autoridade. Para defender os direitos das mulheres é lutar pela universalização da saúde, pelo direito ao aborto, pela equiparação salarial, pela criação de creches para que a mulher possa ter tempo de trabalhar e estudar. Não basta apenas dizer que é preciso ter mais mulheres na política, pois latifundiárias não farão outra coisa que ajudar a oprimir ainda mais a classe trabalhadora, o que inclui as mulheres.
Bolsonaro de saias
Simone Tebet, se eleita, com certeza nos deixará com saudade de Bolsonaro, que é um verdadeiro lixo. Ele entregou a Eletrobrás, e deixou os preços dos combustíveis subirem às alturas. Tebet, no entanto, servirá para aprofundar ainda mais essa política entreguista, pois o imperialismo exige.
Assim como Biden, apoiado pela esquerda identitária, está sendo um verdadeiro flagelo na política dos EUA, temos que esperar o mesmo para a Bolsonaro de saias, Simone Tebet. Por isso, é crucial denunciar as manobras que estão fazendo para elegê-la.
Neste momento, a esquerda precisa colocar força total na campanha de Lula e jogar para escanteio toda essa lenga-lenga identitária, que só serve para fazer regredir a luta pela conquista dos direitos sociais. Elogiar Tebet é jogar contra os interesses da classe trabalhadora.
