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Os bandeirantes, o progresso e a luta contra o imperialismo

A unidade territorial é expressão do desenvolvimento econômico e a luta por essa unidade faz parte da luta geral anti-imperialista e revolucionária

O incêndio da estátua de Borba Gato alimentou a discussão a respeito do papel dos bandeirantes na história nacional. A esquerda pequeno-burguesa e seus pseudoativistas e pseudointelectuais louvaram a ação pseudorradical.

Como enfatizado diversas vezes por este diário e pelos órgão de imprensa do PCO, contudo, tal ação, como todas as ações dos grupos identitários, serve não para impulsionar, mas sim para sabotar a verdadeira luta dos oprimidos.

E parte essencial dessa luta é a luta contra o imperialismo. A luta de classes na época dos grandes monopólios que dominam o mundo se resume à luta entre a classe operária e esses monopólios, que formam o imperialismo. Ganha destaque a luta da classe operária dos países de capitalismo atrasado ou semicoloniais, impedidos de se desenvolverem devido justamente à dominação imperialista.

O imperialismo utiliza os grupos identitários ─ forjados nas universidades norte-americanas e europeias ─ para contribuírem com essa dominação. Os ataques contra estátuas e outros símbolos nacionais nos países atrasados, dizem os identitários, são um ataque contra a opressão. Mas esses mesmos grupos são, via de regra, financiados justamente pelos opressores imperialistas! Ao invés de lutarem contra a opressão atual ─ à qual, na verdade, eles servem ─, inventam uma falsa luta contra os alegados opressores do passado. E, para isso, usam e abusam de um discurso anacrônico.

Segundo eles, os bandeirantes seriam os piores demônios que já pisaram em solo brasileiro. Portanto, é preciso remover seus vestígios da história do Brasil, como suas estátuas. É preciso apagar a história, uma vez que ela é uma história “má”. Mas a quem serve apagar a história, seja ela “boa” ou “má”, de um país oprimido pelo imperialismo, cujo conhecimento de sua própria história é ferramenta importante para a sua libertação? Serve exatamente aos interesses de dominação imperialistas.

Se dependesse da vontade do imperialismo, não apenas a história do Brasil seria apagada (como ele tenta fazer através dos grupos identitários), mas inclusive parte de seu território deveria ser apagada do mapa. É o que o imperialismo sempre tentou fazer com a Amazônia ─ daí a ampla campanha política, diplomática e propagandística supostamente a favor do meio ambiente no Brasil.

Agora, por que os movimentos populares, a esquerda e os oprimidos historicamente sempre defenderam que a Amazônia brasileira é brasileira? Por chauvinismo? Não. Porque ela é fonte de grandes recursos naturais para o desenvolvimento do Brasil, um país pobre e atrasado. E porque, se for retirada do Brasil, irá para as mãos do imperialismo, golpeando ainda mais qualquer possibilidade de desenvolvimento e de soberania de um país oprimido.

Nesse sentido, soa um tanto ingênuo o posicionamento de um desses pseudointelectuais da esquerda pequeno-burguesa, que ignoram a luta de um país oprimido contra o imperialismo, como é o caso de Valter Pomar.

Em artigo recente, tentando refutar o posicionamento do PCO, expresso pelo presidente nacional do Partido, Rui Costa Pimenta, o dirigente da Articulação de Esquerda (corrente oportunista dentro do PT), questiona a noção de progresso e desenvolvimento econômico ─ embora se autointitule marxista!

A tese central de Pomar é que os bandeirantes foram grandes opressores (aqui não se difere dos identitários) e que (agora algo novo!) o seu trabalho para a expansão territorial do Brasil seria algo irrelevante, ou, pior ainda, condenável. Afinal, se foram monstros que não deveriam sequer ter existido, a expansão do Brasil para além do Tratado de Tordesilhas conduzida por eles também seria algo abominável.

Nosso marxista de gabinete busca ridicularizar a ideia de que, para o imperialismo, seria melhor que o Brasil fosse um país pequeno, pois mais fácil de ser dominado. Esse é o pensamento de Pomar que fica implícito quando diz que a “elite de São Paulo” ensina os “lugares comuns” de que os bandeirantes foram instrumentos de progresso e que o progresso consiste em ser grande. Pomar não concorda.

Perguntemos a ele: se o Brasil se resumisse ao Nordeste, Sudeste e metade de Goiás, ele teria o mesmo nível de desenvolvimento que tem atualmente? Por acaso o desenvolvimento não interessa aos oprimidos, mas apenas aos opressores?

Voltemos ao caso da Amazônia. Se ainda vigorasse o Tratado de Tordesilhas ─ acordado entre as coroas portuguesa e espanhola e violado pelos bandeirantes ─, Amazônia, Pantanal e o Aquífero Guarani, por exemplo, não pertenceriam ao Brasil. Talvez nem mesmo os índios brasileiros ─ tão falsamente adorados pelos identitários ─ tivessem sobrevivido, pois teriam ficado a mercê dos espanhóis, que devastaram os impérios Inca, Asteca e Maia ─ muito mais evoluídos do que os brasileiros.

Para a esquerda pequeno-burguesa, como Valter Pomar, assim como para os identitários impulsionados pelo imperialismo, a história do homem não é uma história de progresso, de desenvolvimento das forças produtivas e de constante luta de classes. Ao contrário do que pode pensar o dirigente petista, o posicionamento que apresenta em sua crítica a nossas posições não tem nada a ver com marxismo. Pelo contrário, é antimarxista.

Em artigo publicado em fevereiro de 1850 na Nova Gazeta Renana, Marx e Engels demonstram que viam como um progresso a descoberta de ouro na Califórnia e sua anexação pelos Estados Unidos ─ concretizada sete meses depois.

Agora, após somente dezoito meses, podemos prever que essa descoberta terá muito maiores consequências do que o descobrimento da própria América. Por trezentos e trinta anos todo o comércio da Europa para o Oceano Pacífico foi conduzido por uma comovente e resignada paciência ao redor do Cabo da Boa Esperança ou do Cabo Horn. Todas as propostas de atravessar o canal do Panamá foram um desastre por causa do ciúme tacanho das nações comerciais. As minas de ouro da Califórnia foram descobertas apenas dezoito meses atrás e os americanos já construíram uma ferrovia, uma grande rota terrestre e um canal a partir do Golfo do México, navios a vapor já estão navegando regularmente de Nova Iorque ao Chagres, do Panamá a São Francisco, o comércio do Pacífico já está se concentrando no Panamá e a jornada pelo Cabo Horn já se tornou obsoleta. Um litoral que se estende por trinta graus de latitude, um dos mais bonitos e férteis do mundo e até agora pouco povoado está visivelmente se transformando em uma terra rica, civilizada e densamente povoada por homens de todas as raças, dos ianques aos chineses, dos negros aos indianos e malaios, dos criolos e mestiços aos europeus. O ouro da Califórnia está derramando em torrentes sobre a América e a costa asiática do Pacífico e está arrastando os relutantes povos bárbaros para o comércio mundial, para o mundo civilizado. Pela segunda vez o comércio mundial encontra uma nova direção. O que Tiro, Cartago e Alexandria foram na antiguidade, o que Gênova e Veneza foram na Idade Média, o que Londres e Liverpool têm sido até agora, o empório do comércio mundial ─ isso é o que Nova Iorque, São Francisco, San Juan del Norte, León, Chagres e o Panamá vão se tornar a partir de agora. O ponto focal do tráfico internacional ─ na Idade Média, a Itália; nos tempos modernos, a Inglaterra ─ é agora o sul da península norte-americana: a indústria e a riqueza de outros, que demandaram e ainda demandam uma distribuição de propriedade diferente ─ na verdade, a total abolição da propriedade privada.”

Sim, para o horror da esquerda pequeno-burguesa pseudomarxista, Marx e Engels concluíram que era uma etapa fundamental do desenvolvimento da sociedade a expansão territorial dos Estados Unidos, abocanhando parcela significativa do atrasado e miserável México. Estava-se levando o capitalismo, em sua época progressista, para além das antigas fronteiras norte-americanas. E, hoje, mesmo os identitários mais histéricos não podem negar que foi um progresso: a Califórnia é o estado mais industrializado dos EUA e se fosse um país ela teria o 5° PIB do mundo todo. Caso, no entanto, tivesse se mantido sob o poder do México, ela não seria muito diferente do resto do país latino, pobre e atrasado. 

Os Estados Unidos só são a maior potência que o mundo já viu devido à sua expansão territorial. A Inglaterra só alcançou esse status por causa do império ultramarino que construiu durante séculos. O mesmo vale para os mais desenvolvidos dos países atrasados, como o próprio Brasil, a Rússia, a China ou a Índia ─ todos países territorialmente grandes e muito populosos.

A Revolução Russa abalou o mundo não apenas porque foi a primeira revolução proletária da história, mas também porque ocorreu no maior país do planeta. Graças ao seu tamanho, a Rússia (e depois a URSS) se transformou em uma ameaça para o imperialismo, influenciando diretamente as lutas operárias na Europa e na Ásia (com quem faz fronteira) e indiretamente os povos do mundo todo. Algo semelhante aconteceu com a China ─ qual a revolução mais importante, a chinesa ou a vietnamita?

Se Cuba, uma ilha de 11 milhões de habitantes, pobre e isolada, conseguiu influenciar com sua revolução os movimentos populares de todos os países oprimidos e mesmo dos países ricos, então o que poderíamos dizer caso o Brasil tivesse uma revolução parecida? O continente viria abaixo e a dominação imperialista, a nível continental e mundial, viria-se fatalmente abalada. É famosa a posição preocupada do governo dos EUA sobre a possibilidade de o Brasil se transformar “em uma nova Cuba”, o que levou o imperialismo a executar o golpe de 1964. Os EUA nunca esconderam que o País é o mais importante do continente para os próprios interesses norte-americanos. Não é o Uruguai, não é o Paraguai, não é São Cristóvão e Neves. É o gigantesco Brasil, maior e mais populoso país da América Latina.

Por outro lado, não há como ignorar os esforços do imperialismo para desmembrar os grandes países, como as já citadas Rússia e China. A desintegração da União Soviética em 15 países, da Iugoslávia em seis países, a divisão da Checoslováquia ─ bem como da Alemanha, ao final da II Guerra Mundial ─ foi uma política do imperialismo. Mesmo sem a URSS, a Rússia continua sendo um entrave para a dominação imperialista, por isso a política açougueira continua (tentativas de separar a Chechênia já levaram a guerras). A Sérvia, como coração da ex-Iugoslávia, perdeu ainda Montenegro e o Cossovo. Até 20 anos atrás, a China esteve separada de Hong Kong e Macau e ainda hoje não recuperou Taiwan.

Os imperialistas dividiram o Vietnã em dois e a luta pela reunificação foi uma das forças propulsoras da luta pela independência e pela revolução naquele país. Caso semelhante é o da Coreia, que ainda hoje permanece dividida devido à intervenção imperialista. A Guerra da Coreia foi travada pela Coreia do Norte com o objetivo de livrar o sul da invasão norte-americana e reunificar o país e até os dias atuais o estado operário norte-coreano tem como uma de suas principais bandeiras a reunificação.

Para o imperialismo, é muito mais fácil dominar um país pequeno do que um país grande. É a velha política de dividir para conquistar.

Por sua vez, os países imperialistas impedem de todas as maneiras a divisão de seus territórios. Catalunha, País Basco e Galícia na Espanha; Irlanda do Norte, País de Gales e Escócia na Grã-Bretanha ou Córsega na França e Flandres na Bélgica são conhecidos exemplos de movimentos independentistas que até hoje nunca conseguiram grandes resultados, porque esses países, todos imperialistas, não largam o osso. Sabem que a unidade territorial é peça chave para a sobrevivência da sua condição de potência imperialista. Sua desintegração territorial poderia inclusive agilizar a decomposição de todo o sistema imperialista mundial.

Mas Pomar ignora a importância da luta pela unidade nacional como parte da luta geral da classe operária nos países atrasados por sua emancipação do imperialismo e pela revolução socialista. E no caso dos países oprimidos a unidade nacional não tem o mesmo significado da “unidade nacional” apregoada por essa mesma esquerda ─ isto é, a união com a direita, com a burguesia, deixando a classe trabalhadora a reboque de seus opressores. Para os povos oprimidos, a verdadeira unidade nacional é produto da luta histórica das classes exploradas e do desenvolvimento das forças produtivas ─ em determinados períodos, produzido pelas classes exploradoras e seus representantes. A unidade nacional, aqui, é a unidade territorial do Brasil, a unidade da população que aqui vive em um território único. É uma das mais fundamentais maneiras de se resistir ao assédio incessante das potências e dos monopólios imperialistas.

Em uma época de total desintegração do regime imperialista, na qual as contradições se acentuam de maneira acelerada, fica cada vez mais aguda a polarização política entre as duas classes antagônicas: o proletariado e a burguesia. Nos países oprimidos essa polarização se torna evidente quando percebemos que essa luta é expressa pelos trabalhadores de um lado ─ que carregam atrás de si os interesses da nação, seja da pequena burguesia ou mesmo de setores da burguesia ─ e pelo imperialismo de outro lado.

Portanto, os trabalhadores, ou seja, a classe revolucionária da época imperialista, são os que tomam para si os interesses da nação oprimida, são os únicos que podem levar às últimas consequências a luta pela independência e a libertação nacional dos países atrasados. A nação brasileira, assim, pertence cada vez mais ao povo brasileiro, aos trabalhadores e demais setores oprimidos. Da mesma forma lhes pertence a cultura e a história nacionais. Logo, um ataque à cultura e à história do Brasil ─ independentemente se essa história é “boa” ou “má”, afinal, ela é o que é, não o que gostaríamos que fosse ─ é um ataque ao povo brasileiro. E, novamente, um ataque ao povo brasileiro, como um povo oprimido, um ataque ao Brasil como um país oprimido, serve única e exclusivamente aos interesses de dominação, submissão e espoliação imperialistas.

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