Em uma edição diminuta e local da política de frente ampla, partidos da burguesia e da esquerda no Distrito Federal juntaram-se para entrar com uma representação junto ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) supostamente “contra atos e manifestações públicas que atentem contra o regime democrático, a separação dos poderes e a saúde pública, convocados por pessoas diversas”. Uma política que expressa a direitização da esquerda, que é, não obstante, o resultado necessário da frente ampla.
A representação é assinada pelos líderes distritais do PT, Psol, PSB, Rede, PV e PDT. O requerimento se faz sob o pretexto de combater a extrema-direita, resguardar a democracia e proteger a saúde da população ante a pandemia – um dos motivos do pedido é o impedimento dos atos e do acampamento de extrema-direita em frente a Congresso, chamado “300 do Brasil”, um grupo fascista que defende a ditadura e o extermínio da esquerda.
A medida não cumpre o intento e atua no sentido contrário: reforça a ditadura contra o povo e fortalece a extrema-direita, demonstrando o grau de confusão e direitização da esquerda. É uma medida totalmente antidemocrática e que pode voltar-se violentamente contra a esquerda. A manifestação pública, individual ou de organizações representativas etc., é um direito dos trabalhadores e de todo cidadão para defender seus direitos e se contrapor à tirania do Estado burguês. Caso contrário, estaremos diante de um poder totalitário contra os trabalhadores e o povo, pois a manifestação pública é uma das poucas formas de luta contra a tirania do Estado burguês e a utilização dos veículos e instituições do próprio Estado.
Assim, para exemplificar, se um jovem negro é torturado e morto pela PM, seus familiares e a comunidade não poderiam protestar contra a PM, paralisar uma via, queimar pneus, exigir o fim da PM assassina, pois tudo isso poderia enquadrar-se facilmente como atentado contra o regime democrático e contra a saúde pública. A própria campanha “Fora Bolsonaro” poderia ser enquadrada como atentado ao regime democrático. É perceptível o alcance que tal medida pode ter no reforço da repressão ao povo e às organizações de trabalhadores.
Eliminar o direito fundamental do povo de protestar publicamente em defesa dos interesses e dos direitos democráticos, protestos esses fundamentais para na assunção de todos os direitos, para, com isso, impedir que a extrema-direita proteste é como decepar a própria cabeça na intenção de evitar a enxaqueca.
A medida revela também a profunda e nefasta ilusão que essa esquerda tem no Estado burguês e no putrefato regime político dito democrático. No Brasil, a democracia sempre foi uma máscara, mas o regime político golpista despiu-se dessa máscara há pelo menos quatro anos. O Estado, como é sabido, não é um ente imparcial na luta de classes. Ao contrário, no fundamental é a organização que exerce e garante a dominação de uma classe sobre as outras. No caso, da burguesia contra o povo. Sendo assim, adotar uma política que dá mais poder de repressão ao Estado burguês sob qualquer pretexto é, naturalmente, contrário aos interesses da população oprimida sobre quem recairá no final essa repressão.
Outra ilusão comumente veiculada na esquerda, uma capitulação em relação à pressão da burguesia contra qualquer mobilização, é crer que as instituições mais reacionárias da República como o MPF e o próprio Judiciário, que são uma espécie de corporação medieval totalmente imunes a qualquer apelo popular, vão conter a extrema-direita fascista.
São instituições profundamente reacionárias e antidemocráticas, cujos membros, guardadas as exceções, constituem uma burocracia para atuar contra o povo, isso quando os membros não são fascistas declarados.
A direita tem que ser combatida pelos trabalhadores e suas organizações nas ruas e não pelas instituições dominadas pela direita bolsonarista e golpista.