Cotas raciais

Combate a fraudes é pretexto para acabar com as cotas

Esquerda apoia medida que aumenta o poder repressivo do Estado para "combater fraudes" nas cotas raciais

Conforme expedido pelo Conselho Universitário (CONSUNI) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em sua resolução nº 24 de 2020, publicada na última quinta-feira (26). A instituição constituirá uma “Comissão de Heteroidentificação” para a apuração de denúncias de fraudes às cotas raciais para o ingresso nos cursos de graduação.

Muito comemorada pelo Diretório Central dos Estudantes Mário Prata (DCE-UFRJ), a medida – tendo em vista as diversas injustiças e irregularidades relacionadas aos sistemas de cotas promovidas pelas universidades – por outras instituições públicas e pelo poder Judiciário já ocorridas no Brasil, impõe a este Diário a denúncia da constituição de mais este instrumento para facilitar os ataques das instituições e representantes do Estado burguês racista e reacionário à insuficiente reforma social das cotas.

Como está definido pela resolução nº 24, eventuais denúncias de fraude deverão ser encaminhadas à Pró-Reitoria de Graduação (PR-1) da UFRJ, que terá liberdade para convertê-las em processos administrativos ou arquivá-las. Caso uma denúncia seja convertida em processo, o aluno envolvido será intimado a se apresentar à Comissão de Heteroidentificação para ser comparado com os traços físicos característicos do povo negro, cabendo a esta Comissão decidir pela possível invalidação da matrícula do aluno se deliberado o seu não-enquadramento a estes traços físicos.

Vale lembrar o caso da candidatura da economista quilombola Rebeca Mello no concurso para analista técnico do Ministério Público da União (MPU) através de cotas raciais, que teve a sua candidatura embargada por um organismo de função semelhante à Comissão de Heteroidentificação da UFRJ envolvido no processamento de candidatos a estas cotas por “ser uma mulher bonita” que, por isso, não teria sofrido discriminação por conta de seus traços físicos e, assim, não deveria ser uma candidata às cotas. A economista conseguiu reverter este absurdo através de um processo judicial movido por seu pai, um advogado, uma exceção ilustrativa da regra que são as avaliações subjetivas e racistas que podem ser propagadas por este tipo de organismo burocrático ou judicial, especialmente em relação a cidadãos com menos conhecimento e mais desamparados socialmente do que Rebeca, que são a maioria.

A pretexto de coibir fraudes, a burocracia universitária gesta ferramentas para promover a restrição do acesso da população a um de seus direitos conquistados. O Partido da Causa Operária defende e organiza a luta da população e dos estudantes por uma conquista ainda maior – o acesso amplo e irrestrito da população à universidade, com base na expansão das instituições e da sua disponibilidade de vagas e no fim do vestibular, o alegado filtro intelectual que, na prática, serve como um filtro econômico para impedir o acesso da população pobre à educação para além do ensino médio.

Gostou do artigo? Faça uma doação!