Na última quarta-feira ocorreram dezenas de manifestações contra a ditadura militar de ontem e de hoje. De norte a sul milhares de pessoas se mobilizaram, foram às ruas, para não permitir a comemoração do regime militar brasileiro que se iniciou com o golpe de 1964, mas também se opor e reivindicar o fim do governo ilegítimo de Jair Bolsonaro.
Oficialmente, o único partido que aderiu ao chamado de atos nas ruas foi o PCO. A Aliança da Juventude Revolucionária (AJR), sua juventude, por sua vez, iniciou um processo de mobilização e convocação geral para os atos.
Os presentes nos atos devem ter reparado que a maior parte dos presentes eram jovens. Isso de forma geral comprova que a juventude é a parcela da população que é mais insatisfeita com a situação social atual, se manifesta, se rebela.
No passado a situação era da mesma forma. As organizações que se opuseram ao regime militar eram formadas por muitos militantes jovens. Não foi por acaso a ditadura militar se preocupou em esmagar o movimento estudantil em todas as universidades brasileiras e também em destruir a União Nacional dos Estudantes (UNE).
Na realidade, a perseguição e vigilância ao movimento estudantil se inicou muito antes do golpe de Estado propriamente dito, ocorrido no dia 31 de março para o dia 1º de abril. A vigilância já ocorria em anos anteriores para identificar e cortar a cabeça das organizações populares, políticas e estudantis que pudessem se opor ao golpe e desestabilizar o regime.
Na Universidade de São Paulo (USP), a maior do Brasil e que possui importante movimento estudantil, sofreu bastante com o regime militar. Diversos órgãos foram criados nas universidades para se ter esse controle e perseguição. Na USP um órgão que ligava diretamente a Reitoria da Universidade ao DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) foi criado. Trata-se da Assessoria Especial de Segurança e Informação (AESI ).
A criação da AESI , data de 23 de maio de 1973 e foi formalmente comunicada em ofício distribuído a todos os ministérios militares, Polícia Federal, Polícia Militar, SNI, unidades do Exército em São Paulo e Dops. Seus documentos — que terão sempre a mesma rubrica a acompanhá- los— adotarão um padrão visual facilmente identificável: o timbre da Universidade de São Paulo/Reitoria, em sua abertura. E essa primeira comunicação prima pela simplicidade, mas também pelo conteúdo revelador:
“Esta assessoria acaba de completar sua instalação. É órgão que funciona diretamente junto à USP, mas se integra, também, na Divisão de Segurança e Informação do MEC, dentro do Plano Setorial de Informações. Solicitamos correspondência a AESI/USP- Reitoria Universidade de São Paulo, Gabinete do Reitor”
(trecho de O Controle Ideológico na USP (1964-1978), Adusp, 2004)
Durante a ditadura, 10% dos mortos e desaparecidos oficiais, isto é, os que foram reconhecidamente mortos pelo regime, eram ligados à USP. No entanto, é de conhecimento público que a ditadura assassinou muitos mais opositores do regime. Alguns anos atrás, por exemplo, foram encontradas ossadas em armários da Universidade de Brasília (UNB) que provavelmente são de mortos pelo regime e que foram escondidos na universidade mesmo.
Na USP, a decisão de criar um órgão desse tipo partiu diretamente de seu reitor na época, Miguel Reale. Que em seguida colocou Krikor Tcherkesian como chefe do departamento, cidadão que mantinha contato regular e próximo com o Dops.
A Comissão da Verdade da USP, por exemplo, provou essa ligação com documentos como o livro de entrada e saída do Dops, foto abaixo:
Ao longo do período militar a AESI produziu muitos informes que eram compartilhados com o Serviço Nacional de Informações, as Forças Armadas, o Dops e as polícias.
Em outras universidades organismos similares foram criados.
Neste período de nova ameaça militar, considero um escárnio que as organizações de juventude não respondam a altura a ameaça. A União Nacional dos Estudantes, em especial, demonstrou a sua completa falência.
O presidente ilegítimo Jair Bolsonaro decidiu comemorar oficialmente o golpe militar neste último dia 31 de março. Isto é, comemorar os 21 anos de terror político contra a juventude brasileira. Essa ação não é uma mera comemoração, mas uma ameaça direta a todas as organizações estudantis e juvenis e movimentos de juventude.
A UNE, que em outro período foi duramente perseguida e esmagada, nada fez ou respondeu. É um absurdo que uma organização com a história que a UNE possui nada faça diante da situação colocada.
Dos militantes e ativistas que responderam o chamado dos comitês de luta e da AJR para os atos de rua uma parcela expressiva era juventude, que participaram a revelia de suas direções.
A UNE, sob o comando da UJS/PCdoB, está paralisada, mesmo diante das ameaças diretas que sofre por parte da direita e da extrema-direita nacional. Essa inação só será vencida pela sua reconstrução pela base, uma mobilização geral dos estudantes que passe por cima da burocracia estudantil e coloque as organizações dos estudantes em mobilização.
O fascismo está nas ruas e deve se combatido nas ruas. Não devemos permitir que se repita o que ocorreu nos anos de terror político no Brasil.