Uma coisa que não faltou no governo Bolsonaro foram crises políticas no interior da burguesia. O candidato improvisado para impedir que o PT voltasse ao governo federal dois anos após o golpe de 2016 vem acumulando atritos com os setores mais importantes da classe dominante. A disputa em torno do auxílio emergencial é mais um capítulo dessa história.
Auxílio emergencial e eleitoral
Da parte do atual e ilegítimo presidente, a estratégia de adotar medidas de apelo social a cerca de um ano das eleições é natural e não causa surpresa nenhuma. Nada de novo na política burguesa, que o diga João Doria em São Paulo. Diante da miséria que atinge milhões de brasileiros atualmente, esse auxílio de 400 reais tende a garantir um enorme contingente de votos em 2022.
É importante já destacar que esse valor passa muito longe do que seria digno destinar à população mais carente de recursos nessa crise. Segundo levantamento do próprio governo esse auxílio comprometerá apenas 30 bilhões do orçamento anual, uma quantia magra diante do orçamento federal e da pornográfica fatia que vai para os parasitas do sistema financeiro.
O grande problema dessa manobra do governo Bolsonaro para a burguesia é que fará o Estado gastar com o povo. Isso é inaceitável. Num cenário onde a burguesia já estivesse unificada no apoio ao atual mandatário, o governo faria apenas o que lhe cabe na democracia burguesa dos dias de hoje: repassar o máximo possível do dinheiro arrecadado na sociedade para os bancos. Mas Bolsonaro sabe que não é a opção preferencial e tenta se garantir como pode.
O teto de gastos
A discussão sobre o criminoso teto de gastos veio à tona nessa discussão, pois o montante destinado ao auxílio emergencial extrapolaria esse limite. Não é por acaso que essa medida foi apresentada ainda em 2016, no governo golpista de Michel Temer com Henrique Meirelles na economia.
Sob o conhecido e recorrente argumento do “controle das contas públicas” e mirando um baixo nível da taxa de juros Selic, o governo que herdou o Brasil no golpe de Estado assinou um compromisso com o capital financeiro que transformou em lei não investir o dinheiro do povo em serviços para o próprio povo. Nada mais ilustrativo de como funcionam as “democracias” no capitalismo.
Se trata de um estrangulamento dos investimentos públicos, que limita o crescimento de uma enorme porção dos gastos públicos à inflação do período anterior. Uma medida violentamente neoliberal, que inviabiliza novos investimentos de interesse público e amarra os governos futuros a esse arrocho.
O tortuoso governo do Chicago Boy
Colocado no Ministério da Economia para tutelar o governo Bolsonaro e garantir o pacote neoliberal, Paulo Guedes vem apresentando dificuldades para realizar as tarefas para as quais foi enxertado no governo. As disputas entre os setores da burguesia que apoiam o bolsonarismo e aqueles que tentam uma estabilização do golpe de 2016 têm feito o Chicago Boy oscilar entre posições e não satisfazer a contento os tubarões do capital financeiro.
Constantemente ameaçado de substituição no ministério, Guedes adota medidas impostas pelo presidente e desagrada aqueles que o colocaram como garantidor dos seus interesses nesse governo. O pregador neoliberal tem desagradado o “mercado” por não reduzir ao mínimo os gastos públicos e não conseguir privatizar com mais velocidade os patrimônios públicos.
O veto da burguesia a Lula
Outro assunto que vem à tona diante dessa briga interna da burguesia é o fator Lula nas eleições. Setores da esquerda pequeno-burguesa, pretensamente radicais, têm propagado insistentemente que Lula é o candidato da terceira via, ou seja, a pessoa que tem o apoio dos setores mais importantes da burguesia.
Ora, se um auxílio tão miserável como o proposto atualmente já encontra enorme resistência e produz uma crise ministerial num governo de direita, como é possível imaginar que Lula viveria um governo tranquilo?
Para não perder completamente sua base política, Lula teria que no mínimo fazer mais do que Bolsonaro no que diz respeito a programas sociais. No mínimo. Independentemente da postura conciliadora e moderada de Lula, seu mínimo possível já é demais para a burguesia em meio à crise econômica mundial.