Nesta sexta-feira (19), o Poder360 publicou um artigo do jornalista Janio de Freitas intitulado No reino da impunidade. Sob o pretexto de combater a “impunidade”, o jornalista assina uma peça que é, em essência, um ataque frontal à soberania popular e uma defesa servil da ditadura de toga. Ao classificar como “impunidade” qualquer tentativa do Congresso Nacional de limitar o arbítrio do Supremo Tribunal Federal (STF), Janio revela um desprezo profundo pelas instituições eleitas e um apego perigoso ao poder de uma casta não eleita composta por ministros intocáveis.
A tese de Janio é de que “a Câmara e o Senado restauraram, em votações separadas, o domínio da impunidade para as classes privilegiadas, como componente essencial da tirania social”. O que o autor chama de “restauração da impunidade” é, na verdade, o exercício da imunidade parlamentar e da prerrogativa legislativa de dosimetria das penas. A imunidade parlamentar não é um “privilégio de classe”, mas um direito histórico fundamental, conquistado a duras penas pela mobilização do povo brasileiro contra a ditadura militar de 1964-1985. A imunidade existe para que o representante do povo não seja calado, preso ou perseguido pelo Poder Judiciário ou pelo Executivo por suas opiniões e votos. Ao se colocar contra essa garantia, Janio de Freitas pede, na prática, o retorno ao tempo em que o arbítrio de um juiz podia anular a vontade das urnas.
O articulista chega ao cúmulo do autoritarismo ao afirmar que “punição para ministro do Supremo seria um desatino que só ocorre a deputado e senador – justamente os patronos da impunidade”. Para o articulista, portanto, o representante eleito pelo povo deve ser punido, mas o ministro que decide a vida de 200 milhões de pessoas sem ter recebido um único voto deve gozar de uma infalibilidade papal. Tratar o controle sobre o Judiciário como um “desatino” é defender a existência de uma monarquia judiciária acima da lei e da sociedade. Enquanto deputados e senadores são os “patronos da impunidade” na visão distorcida do autor, os ministros que participam de eventos patrocinados por empresários seriam os “paladinos da justiça”.
Janio ainda lamenta que as sentenças do STF seriam “derrotadas” pela voz do Congresso, que soaria “em uníssono” com as classes privilegiadas. Ele usa o fantasma do 8 de janeiro para justificar penas absurdas e abusivas, como a de 27 anos aplicada a Jair Bolsonaro, e se revolta quando o Parlamento tenta trazer racionalidade ao sistema penal. Ao dizer que “a voz da maioria congressista e a voz das classes privilegiadas soavam em uníssono”, ele ignora que a verdadeira tirania social é exercida pela política repressiva do Estado, da qual o STF é o braço armado. O que Janio de Freitas defende não é a justiça, mas o encarceramento em massa e a supressão do debate político pela via judicial.
A verdade é que, ao classificar o controle do Parlamento sobre o Judiciário como um “desatino” e demonizar as prerrogativas dos representantes eleitos, o articulista flerta com o espírito do Ato Institucional nº 5, da ditadura militar, que cassou mandatos, suspendeu o habeas corpus e amordaçou o Congresso para dar poderes absolutos ao arbítrio dos detentores da força. Janio, que se pretende um defensor da “democracia”, acaba por mimetizar a política dos generais de 1968, para quem o voto do povo seria um obstáculo para a “limpeza” moral do país e que a única autoridade legítima seria aquela que não presta contas a ninguém.
