Partido da Causa Operária

‘A dignidade está na vida, não na morte’, diz João Pimenta

Dirigente do PCO relata luta de Natália Pimenta contra o câncer e denuncia bloqueio do Estado, do Judiciário e da saúde privada ao tratamento

No ato em homenagem a Natália Braga Costa Pimenta, realizado neste domingo (30), na Biblioteca da Casa de Portugal, no bairro da Liberdade, em São Paulo, João Jorge Pimenta, membro da Direção Nacional do Partido da Causa Operária (PCO), fez um relato minucioso dos dez meses de tratamento de Natália e denunciou a atuação conjunta de diversas forças no bloqueio ao medicamento de que ela precisava em caráter de urgência.

Irmão de Natália, o dirigente afirmou logo no início que “a doença é mais a arma do crime do que o culpado”, situando o caso como expressão da “decadência total da sociedade capitalista” e da dominação do grande capital sobre o Estado. Segundo ele, a história da irmã “confirma na prática” a posição defendida pelo PCO contra a existência da saúde privada.

Ao se dirigir aos presentes, João Jorge explicou que pretendia relatar “o calvário que foram os últimos meses” de Natália. Ele lembrou que o diagnóstico de leucemia e câncer foi acompanhado, desde o início, por uma postura de desistência estimulada pelas equipes médicas.

“Durante dez meses, ela lutou contra a doença, mas também contra o domínio do capital, a expropriação capitalista e o controle deles sobre o Estado”, afirmou. Ao descrever a trajetória, destacou que essa luta não se deu apenas no plano clínico, mas também “contra a burocracia judiciária, contra a burocracia estatal e contra a máquina cruel e assassina da saúde privada”.

Para o dirigente, o conjunto da experiência reforça o programa defendido pelo partido:

“O nosso partido sempre advogou que não poderia existir uma coisa como a saúde privada. A história de vida dela provou que essa posição é absolutamente correta.”

João Jorge relatou que, assim que houve a confirmação do diagnóstico, os médicos classificaram a enfermidade como “terminal” e passaram a pressionar Natália e a família a desistir de qualquer tentativa de tratamento prolongado.

“Começaram a pressionar tanto ela quanto nós a desistir. Basicamente, queriam que a pessoa em vida fizesse as pazes com a morte”, contou. Ele afirmou ter ficado “profundamente espantado” com a situação e questionado qual seria a vantagem de antecipar essa desistência, lembrando que Natália tinha dois filhos pequenos e um amplo círculo de companheiros que seriam diretamente impactados por cada dia a mais de convivência.

O dirigente descreveu reuniões em que equipes médicas apresentavam essa política como um “tratamento humanizado”, apoiado em uma “psicologia barata”. Segundo ele, toda essa concepção tinha um objetivo bastante concreto: “ela serve para uma única coisa: economizar o dinheiro das empresas privadas e do Estado”.

Em uma dessas reuniões, ele foi informado de que a família deveria desistir do tratamento para garantir a Natália uma suposta “morte digna”. Ele contrapôs essa formulação resgatando uma resposta de Rui Costa Pimenta:

“Não há dignidade na morte. A dignidade está na vida, naquilo que você fez. E se há uma coisa profundamente revolucionária, é lutar até as últimas consequências, até o último segundo, para dar a sua contribuição ao progresso humano.”

João Jorge relacionou a resistência de Natália à concepção materialista defendida pelo PCO. “Nós, como ateus, defensores do materialismo dialético, não acreditamos em vida após a morte”, afirmou. Para ele, a questão central é que “a humanidade continua depois de você, isso é evidente, e o seu último ato marca, em algum grau, o resto da humanidade e, sobretudo, as pessoas à sua volta”.

A partir desse ponto de vista, explicou que a decisão de seguir lutando até o fim não tem um caráter apenas individual:

“Essa luta dura que ela travou deve servir de exemplo. Você não tem como saber se vai conseguir evitar dar a sua vida, mas a sua consciência e as suas convicções não podem ser entregues.”

Ao tratar da fase final do tratamento, João Jorge relatou que os prognósticos médicos davam prazos sucessivos e cada vez mais curtos de sobrevida. “Falaram em sete, doze, quinze dias. E em todas as vezes ela derrotou as estatísticas”, disse.

Natália permaneceu meses na UTI, ligada a respiradores, superando todos os prazos estabelecidos como “impossíveis” pela equipe médica. O dirigente descreveu esse período como um “bombardeio permanente” sobre a paciente, tanto do ponto de vista físico quanto psicológico, com a insistência para que aceitasse a interrupção dos procedimentos.

Apesar disso, ela manteve a disposição de seguir lutando: “cada vez que diziam que não ia dar tempo, ela continuava. E nós continuamos com ela”.

O dirigente também elencou obstáculos concretos enfrentados durante os dez meses de tratamento. Segundo ele, a família e os companheiros tiveram de lidar com atrasos na liberação de medicamentos pelos convênios privados, “erros crassos” de equipes médicas e, por fim, um “bloqueio absoluto” do Estado na liberação de um remédio considerado essencial pelos médicos para aquela etapa da doença.

“Nós sofremos com atrasos, sofremos com erros grosseiros, tudo isso terá de ser detalhado depois. E sofremos, finalmente, com o bloqueio do Estado em fornecer um medicamento que ela precisava em caráter de urgência”, relatou.

Ele fez questão de registrar o papel dos militantes na tentativa de garantir condições mínimas para que o tratamento pudesse prosseguir. Agradeceu nominalmente companheiros que atuaram na organização de recursos e no enfrentamento da burocracia, ressaltando que essa solidariedade foi decisiva para “manter o mínimo de humanidade” em meio ao processo.

A parte mais dura do relato foi dedicada à decisão judicial que negou o fornecimento do medicamento pedido em caráter emergencial. João Jorge explicou que, após ingressar com ação judicial, a Natália aguardou 26 dias até que fosse expedida uma ordem de pagamento — até que falecesse.

A decisão, da juíza de primeira instância Anita Villani, foi descrita como o momento em que ficou mais claro “o que estava em jogo” na disputa. De acordo com o dirigente, a magistrada afirmou, em sua decisão, que não havia evidências científicas suficientes da eficácia do medicamento, colocando-se como avaliadora técnica do tratamento.

Em seguida, prosseguiu João Jorge, a juíza passou a tratar da questão do custo do remédio:

“Logo depois de negar o pedido, ela escreveu que era importante pensar na sustentabilidade financeira do Sistema Único de Saúde.”

O dirigente tirou consequências políticas diretas dessa formulação:

“Se a sustentabilidade financeira do SUS depende de matar pacientes, então algo muito errado está acontecendo com o Sistema Único de Saúde.”

Ele destacou que, ao negar o fornecimento, a decisão acabou por atribuir um valor monetário à vida de Natália: “um milhão, dois milhões de reais, esse foi o valor que ela fixou para não fornecer um medicamento essencial”.

João Jorge relatou ainda a conversa com advogados que atuam na mesma vara federal em que o processo de Natália tramitou. Segundo esses profissionais, a negativa ao pedido não foi um fato isolado.

“Eles me informaram que aquela vara, virou uma espécie de câmara de gás: ninguém ganha. Só na última semana, foram 68 pedidos semelhantes ao nosso, todos negados.”

De acordo com o dirigente, esse número expressa a política aplicada de maneira sistemática em favor do capital financeiro: “porque, no fim das contas, os banqueiros, os grandes capitalistas, precisam ter o dinheiro deles, doa a quem doer.”

Mesmo submetida a um tratamento prolongado e doloroso, Natália manteve o interesse pela política internacional e pela situação da Palestina. João Jorge lembrou uma visita em que um companheiro a aconselhou a não acompanhar as notícias naquele momento, por considerá-las “tristes demais”.

“Ela ignorou olimpicamente o conselho e quis saber como estava a situação na Palestina, a resistência, tudo isso”, relatou, lembrando que a companheira era uma das vozes mais firmes do partido em defesa do povo palestino.

Para sintetizar o sentido dessa postura, João Jorge comparou a atitude da irmã com a dos dirigentes da resistência que enfrentam perseguições e prisões:

“Cada um no seu campo de batalha. Ela teve o dela, que representa o conjunto da vida dela. E, à maneira dela, fez como faz Iahia Sinuar: lutou até o último segundo possível e imaginável.”

Ao final, o dirigente afirmou que o martírio de Natália recoloca, em termos concretos, o programa levantado pelo PCO para a saúde e para a luta contra o domínio dos bancos sobre o Estado. A experiência, segundo ele, mostra que não se trata de um problema individual, mas de uma política voltada a preservar os interesses do capital financeiro às custas da vida da população.

Encerrando sua fala, João Jorge resumiu o legado da militante:

“Foi um prazer imenso ter tido uma irmã como ela e uma companheira de partido como ela. Tenho certeza de que a memória e o trabalho da minha irmã vivem na revolução proletária.”

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