O Tribunal Supremo de Justiça da Bolívia (TSJ) anulou a sentença de dez anos de prisão que a ex-presidente interina Jeanine Áñez cumpria. A decisão, tomada poucos dias depois da derrota eleitoral do Movimiento al Socialismo (MAS), expõe a nova correlação de forças no país: a direita volta a ganhar fôlego, agora com uma aparência de legitimidade eleitoral e respaldo institucional.
Em 2019, Evo Morales foi reeleito democraticamente, mas a oposição, com apoio da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do governo norte-americano, deflagrou uma campanha de denúncias de “fraude eleitoral”. Sob pressão da polícia e das Forças Armadas, Evo foi forçado a renunciar e deixar o país, em um dos golpes de Estado mais violentos daquele período.
Jeanine Áñez — então uma senadora de direita sem qualquer respaldo legal — se autoproclamou presidente. Seu governo foi marcado por repressões sangrentas, como os massacres de Sacaba e Senkata, onde dezenas de Índios que se manifestavam nas ruas foram assassinados.
A vitória de Luis Arce em 2020 foi vista por muitos como a derrota do golpe. No entanto, na realidade, os próprios golpistas entenderam que era preciso “colocar o pé no freio” diante da mobilização popular que ameaçava explodir o país. A convocação das novas eleições foi uma manobra calculada: serviu para conter o avanço das massas e preservar o regime de 2019, agora com uma fachada “democrática”.
Evo Morales foi impedido de concorrer e pressionado a apoiar a candidatura de Arce. Desde então, o governo do MAS continuou sendo alvo de uma pressão contínua da direita, da burguesia e do imperialismo. Essa ofensiva chegou ao ponto de Evo Morales, líder histórico do partido, ser expulso do MAS e, posteriormente, impedido de disputar a presidência. O caso marcou a traição de Arce ao partido e a seu padrinho político.
A derrota eleitoral recente do MAS é o resultado direto dessa ofensiva. Enfraquecido e, isolado pelas concessões feitas à direita, o governo Arce acabou entregando o país novamente às mãos dos mesmos setores que promoveram o golpe. Agora, com a vitória eleitoral da direita, o regime golpista ganha nova roupagem, tendo sido formalmente eleito.
A libertação de Jeanine Áñez é um máximo dessa nova etapa. Ela representa a reabilitação política dos golpistas.
Diante da nova ofensiva da direita, a política defendida por Evo Morales de chamar o voto nulo nas eleições mais recentes revelou-se correta. O voto nulo serviu como denúncia e resistência frente à farsa eleitoral montada para legitimar um regime que nasceu do golpe e continua subordinado aos interesses estrangeiros. Embora a direita tenha vencido numericamente, sua legitimidade é uma farsa.





