Logo que Lula venceu as últimas eleições, seus amigos do portal progressista Brasil 247 repetiam, sempre que surgia uma oportunidade, que a prisão lhe tinha feito bem. Em geral, atribuíam ao período de reclusão um novo hábito adquirido pelo presidente: ele teria lido muito durante os dias de solidão. Elogiar a prisão por seus supostos efeitos benéficos, que teriam proporcionado a Lula uma espécie de retiro espiritual ou intelectual, parecia uma coisa boa de dizer ao público, que, por sua vez, nunca reclamou. O que parece um detalhe sem importância pode, porém, ser um sinal de alerta. O Lula 3, que emergiu do retiro prisional, é, ao que parece, um sujeito reconciliado com seus algozes, mas essa história tem tudo para acabar mal.
Num curioso rearranjo, figuras públicas como o influenciador Felipe Neto e o jornalista Reinaldo Azevedo, inventor do termo “petralha”, largamente usado na imprensa lava-jatista para atribuir aos petistas a alcunha de ladrões do erário, fizeram uma espécie de “mea culpa” e, ao lado de Lula, viraram todos best friends.
Mais importante que isso, Geraldo Alckmin, ex-PSDB, Simone Tebet, representante do latifúndio brasileiro, Marina Silva e Sônia Guajajara, ícones do onguismo ambiental-identitário, Anielle Franco, mulher negra identitária, que luta contra o buraco negro e caixa-preta, e Haddad, o petista amigo do mercado, entre outros, formaram uma frente ampla para governar o país. Não para por aí a lista de novos amigos de Lula. Lá no topo estão Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e demais ministros do STF.
À exceção de Haddad, nenhuma das figuras dessa curiosa colcha de retalhos se contrapôs à deposição de Dilma Rousseff, cujo cargo foi usurpado por Michel Temer, ali posto para implantar o programa derrotado nas urnas, mas mesmo ele, como o próprio Lula, se curva à pressão da burguesia. O que poderia unir todas essas pessoas em torno do outrora líder operário? Certamente não serão seus laços de amizade nem a vontade de fazer um governo bom para o povo.
A burguesia, que é quem define quem merece passar uma temporada na prisão, tem sabido manipular Lula e seu eleitorado para transferir a força política da esquerda ao Judiciário, que, pelo “poder da lei”, pode tirar Bolsonaro de seu caminho nas próximas eleições. Que fique claro: Lula não está entre amigos.
Os planos da burguesia, como sabemos, podem mudar ao sabor dos acontecimentos. Bolsonaro tem sido um inimigo difícil de combater. Diferentemente dos apoiadores de Lula, que, em um acampamento em Curitiba, lhe davam bom-dia e boa-noite, a turma do Bolsonaro é bem menos tímida. Eduardo Bolsonaro disse, no passado, que um jipe e dois soldados seriam suficientes para acabar com o STF. Talvez estivesse menos longe da verdade do que ele mesmo poderia supor à altura, visto que o corte do cartão de crédito (pela aplicação da Lei Magnitsky) de Moraes parece estar preocupando – e muito – os demais ministros e a burguesia de modo geral.
Recentemente, a imprensa recebeu com espanto a notícia da demissão de duas jornalistas da Globonews, a tucana Eliane Cantanhede e Daniela Lima, as duas, principalmente a segunda, muito deslumbradas com sua intimidade com os ministros do STF, de quem se tornaram porta-vozes, sendo até – pasmem – identificadas como “esquerdistas”. A burguesia mandou descer o pau no Bolsonaro, mas não era para “acreditar” no que estavam fazendo. O discurso da imprensa precisa parecer relativamente neutro para que possa mudar ao sabor dos interesses de seus donos, ou seja, a burguesia. E pode ser que a burguesia esteja achando o Bolsonaro um osso duro de roer, o que pode mudar tudo.
Se o vento mudar, que a esquerda não se espante. Os amigos de Lula 3, amanhã ou depois, podem sair por aí dizendo que Bolsonaro não era tão ruim assim.




