O artigo de Jorge Folena, Os 37 anos da Constituição de 1988 e a retomada da cidadania, publicado no Brasil247 neste sábado (4), prova pelo menos duas coisas: 1) uma Constituição é apenas um amontoado de palavras se não houver força social para que seja real e efetiva; e, 2) não existe nenhuma retomada da cidadania.
Para Folena, “Com toda razão, Ulisses Guimarães referiu-se à Constituição promulgada em 05 de outubro de 1988 (que ora completa 37 anos), como a Constituição Cidadã, que veio para proteger o povo pobre e sofrido do Brasil, massacrado, humilhado e maltratado desde o início da colonização portuguesa”. Não é, mas essa discussão fica para outra ocasião, é preciso focar agora em outros aspectos.
No segundo parágrafo, o texto diz que “os constituintes de 1987/1988 tiveram o cuidado de colocar na parte inicial da Carta Política os princípios fundamentais da República e da garantia dos direitos do homem, inseridos nos artigos 1º, 3º, 5º, 6º e 7º, em respeito ao povo brasileiro, anteriormente sempre colocado na parte final das Constituições”.
O artigo 1º trata dos Fundamentos da República;
• Soberania
• Cidadanina
• Dignidade Humana
• Valores sociais do trabalhado e da livre iniciativa
• Pluralismo politico
No Brasil de hoje, soberania é apenas uma palavra da moda, uma resposta pífia a uma tentativa de ingerência dos EUA na nossa política. No plano político, temos a Base de Alcântara nas mãos dos americanos; e o Brasil se declarou ‘neutro’ diante de uma ameaça militar real dos Estados Unidos à Venezuela e à Amazônia.
Pulando para a livre iniciativa, o brasileiro está praticamente vivendo de bicos; fazendo bolo para vender nos semáforos, e a isso se deu o nome pomposo de empreendedorismo. Mas a renda do “empreendedor” é de até dois salários mínimos, R$ 2.640. Isso sem férias, dias de descanso, fundo de garantia etc.
Quanto ao pluralismo político, o Tribunal Superior Eleitoral é um entrave ao funcionamento dos partidos. Todo dia se inventa uma regra nova que favorece apenas partidos grandes, enquanto os partidos menores, como o PCO, são ameaçados de cassação, justamente por lutarem pela pluralidade, pelo direito de defender suas ideias.
O artigo 3º trata dos Objetivos da República;
1) Construir uma sociedade livre, justa e solidária;
2) Garantir o desenvolvimento nacional;
3) Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir desigualdades sociais e regionais:
4) Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer formas de discriminação.
Liberdade no Brasil é cada vez mais uma ficção, desde o advento do ‘politicamente correto’, e com a infiltração do identitarismo na esquerda, o que mais se fala é em cadeia e aumento de penas.
O desenvolvimento nacional vai mal. Desde a destruição da indústria promovida por FHC, até hoje, as privatizações fizeram com que as riquezas nacionais, como o petróleo, fiquem nas mãos de investidores super-ricos e dos bancos, que mordem mais da metade do orçamento.
O artigo 5º trata dos Direitos e garantias fundametais;
• Igualdade de todos perante a lei (sem distinção de qualquer natureza)
• Direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade
• Liberdade de expressão, de crença e de associação
• Direito de reunião pacífica
• Direito à privacidade, honra e imagem
• Garantias como habeas corpus, mandado de segurança e direito de petição
• Proteção contra censura e discriminações
• Direito de acesso à Justiça.
Começando pela liberdade de expressão, esse direito foi abolido pelo Supremo Tribunal Federal, que apesar de ser um tribunal, usurpou as prerrogativas do Legislativo e começou a legislar. Hoje, no País, dependendo do que uma pessoa disser, poderá ser presa ou multada.
O direito de reunião pacífica é outra ficção. O PCO marcou uma manifestação para comemorar a Operação Dilúvio de Al-Aqsa, da resistência palestina, mas toda a direita está tentando impedir. Sem mencionar as inúmeras repressões policiais contra manifestações que o Brasil tem assistido.
Não existe proteção contra a censura, ela está cada vez mais abrangente, graças à ação ilegal do STF, que burla a Constituição.
Direito de acesso à justiça é outra fantasia. Basta pra isso mencionar o Mensalão, a Lava-jato, e o julgamento de Jair Bolsonaro, onde cidadãos comuns foram julgados coletivamente pelo Supremo em um julgamento-farsa, pois um dos juízes atuava figurava como vítima.
O artigo 6º trata dos Direitos sociais;
• Educação;
• Saúde;
• Alimentação;
• Trabalho;
• Moradia;
• Transporte;
• Lazer;
• Segurança
• Previdência social
• Proteção à maternidade e à infância
• Assistência aos desamparados.
Todos esses itens estão petição de miséria. É preciso dar destaque ao ponto “Proteção à maternidade e à infância”. O médico Ric Jones, que já fez mais de dois mil partos, está preso, apesar de ainda poder recorrer, acusado de homicídio de uma criança. Ric, militante do PCO, é vítima da indústria da cesariana, uma vez que milita pelo parto humanizado.
O artigo 7º trata dos Direitos dos trabalhadores;
• Salário mínimo digno
• 13º salário
• Jornada máxima de 8h diárias e 44h semanais;
• Repouso semanal remunerado;
• Férias anuais + 1/3;
• Licença-maternidade (120 dias) e paternidade;
• Proteção contra despedida sem justa causa;
• FGTS;
• Proibição de diferença de salário por sexo, idade, cor ou estado civil;
• Adicional noturno, insalubridade, periculosidade;
• Seguro-desemprego;
• Proteção do trabalho do menor e proibição do trabalho infantil.
Desde o golpe de 2016, orquestrado pelo imperialismo e levado adiante pela burguesia, “com Supremo, com tudo”, os direitos trabalhistas e previdenciários, pode-se dizer que inexistem. E a coisa pode ainda piorar, a depender de decisão do STF sobre o trabalho terceirizado.
Letra morta
O texto de Folena comemora o aniversário da Constituição justamente em um momento em que a esquerda acaba de servir de massa de manobra para a burguesia ameaçar o Legislativo.
A Rede Globo, ou o imperialismo, convocou uma manifestação de rua no dia 21 de setembro contra o Congresso, que pretendia fazer valer seus direitos constitucionais, a chamada PEC das Prerrogativas, uma medida para tentar barrar o Supremo, que tem cassado e prendido deputados por coisas que disseram, inclusive no exercício de suas funções.
Com a pressão, a PEC não passou no Senado, o que só aumenta o poder só Supremo, ferramenta fundamental do imperialismo para controlar a política brasileira.
Segundo Folena, “a Constituição promulgada em 05/10/1988 não pôde, até os dias de hoje, ser executada na sua plenitude, pois para isso era necessária a eleição imediata de um presidente comprometido com seus ideais avançados”. Mas isso não pode ser garantido por nenhum presidente, especialmente se este não busca apoio na classe trabalhadora.
Para o articulista “mais do que nunca, é necessário que o presidente Lula seja reeleito em 2026”. No entanto, o que foi feito até agora em benefício dos direitos dos cidadãos? O governo está refém do Supremo, a instituição mais reacionária do Estado. Aquela que pisoteia a Constituição. E, como se não bastasse, tudo isso com apoio da maioria da esquerda.




