É preciso muito esforço para acreditar no título, bem como do conteúdo, do artigo A retomada do protagonismo pela esquerda, de autoria de Alberto Cantalice, publicado nesta quarta-feira(24) no sítio Brasil247.
Para desmentir Cantalice, Paula Lavigne, ligada à Rede Globo, ex-mulher de Caetano Veloso, e uma das articuladoras junto à burguesia para a promoção do ato/show de 21 de setembro, veio a público dizer que “Não foi ato da esquerda, mas da sociedade civil”. Sociedade civil é uma dessas expressões-valise, dentro delas cabe de tudo, todo tipo de oportunista que acabam aparecendo para os olhos do público como de esquerda ou progressistas.
Cantalice inicia dizendo que “o verdadeiro tapa na cara da sociedade brasileira partiu da Câmara dos Deputados. A pressão do centrão e da extrema direita pela PEC da Blindagem e pela proposta de anistia aos golpistas, serviu para impulsionar as maiores manifestações do campo progressista em muitos anos”. [grifo nosso].
Como destacamos, foi utilizado também o termo “campo progressista”, que serve para ocultar a direitização da manifestação, convocada pela Rede Globo, grande imprensa, e ONGs ligadas à CIA e a George Soros.
Para quem não se lembra, a expressão “campo democrático” foi muito utilizada durante a última campanha presidencial. Dentro desse “campo” estavam figuras como Ciro Gomes, João Dória, MBL, e toda sorte de golpista que, por algum motivo, tinha desgarrado do bolsonarismo.
Bolsonarice
Segundo Cantalice, “a mobilização do movimento sindical, dos estudantes e, em especial, do mundo da cultura, congregou multidões em todos os estados brasileiros. A reação progressista foi emblematizada pela presença da bandeira brasileira no ato da avenida Paulista, em detrimento da vexaminosa ostentação da bandeira dos Estados Unidos, na manifestação da extrema direita, no Sete de Setembro”.
A primeira pergunta a ser feita é: por que praticamente não havia manifestantes no 1º de Maio, nos atos em prol da resistência Palestina, da Venezuela e no último 7 de Setembro? Os sindicatos e o estudantado não se mexeram, é isso? Talvez essas lutas não sejam importantes.
O importante para essa esquerda é copiar o que fez a direita em 2013, reivindicar a bandeira do Brasil e o verde-amarelo; ou imitar o que fazem os bolsonaristas, desfilando com pixulecos, bonecos de presidiários, e exigindo cadeia.
Demagogia
Tentando se afastar da comparação inevitável, Cantalice sustenta que “diferente da farsa das Jornadas de junho de 2013, não houve espaço para a captura do sentimento popular por pautas que diferem do entendimento dos variados ramos das lutas populares. Além da defesa da democracia, ganhou tração a reivindicação do fim da escala 6X1, a taxação dos ricos e a defesa da isenção do imposto de renda para quem ganha entre 5 e 7,5 mil reais/mês”.
O fim da “escala 6×1” é uma farsa, trata-se de uma iniciativa da própria burguesia que quer deixar a escala de trabalho flexível e com isso escapar dos custos da remuneração mais alta nos finais de semana e pagamento de horas-extra.
Quanto à taxação dos ricos, ninguém vai acreditar que uma manifestação chamada pela burguesia deixará isso ir adiante. E a isenção de impostos de renda já foi prometida até por Bolsonaro. Ninguém acredita ou leva a sério.
Direitização
Para entender o quão direitista foi a convocação do ato, basta ler a seguinte frase de Cantalice: “ficou fortemente marcada a defesa das instituições republicanas e a exigência das punições aos golpistas que tentaram desmontar o Estado de Direito e eliminar adversários políticos”. A defesa das instituições e o pedido de punição é o que mais se vê por parte da direita.
Aliás, é preciso dizer que não se tratou da defesa de instituições republicanas, foi exatamente o contrário. Pretendia-se que uma das instituições do Estado, o Judiciário, tenha poder supremo sobre as outras, o que fere o republicanismo e a divisão de poderes.
O fortalecimento do Judiciário, conforme já escreveu este Diário, é uma reivindicação do imperialismo, que tem utilizado preferencialmente essa instituição para dar golpes e controlar a política nos mais diversos países.
O verdadeiro golpe
Segundo o articulista, “a presença de Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Paulinho da Viola, velhos combatentes da ditadura instaurada em 1964, deu o tom do repúdio ao golpismo por parte daqueles que foram suas vítimas diretas”. Trata-se de um golpe, pois aqueles que convocaram o ato, Rede Globo, Folha de São Paulo, etc., foram fiéis apoiadores do regime militar, e que aparecem agora como defensores da democracia.
No mesmo parágrafo, Cantalice afirma que “ilustra esse fato [o repúdio ao golpismo], a fala do cantor e compositor Caetano Veloso que no alto do carro de som em Copacabana disse: ‘Nós só estamos aqui porque o Lula é presidente’. Afirmação que denota o perigo que correra o povo brasileiro se o golpe cujo ápice foi o 08 de janeiro tivesse sido consumado”.
O que foi dito, na verdade, serve para o acobertamento do golpe de 2016, que contou com a participação dos grandes meios de comunicação e do STF. É quase uma jogada de mestre, pois os golpistas entram em cena como inimigos do golpe e como amigos de Lula, governo que nunca deixaram de sabotar.
Tirar Bolsonaro e Lula da frente e emplacar um candidato da terceira via, ou do “campo democrático”, é este o plano do imperialismo.
Esquerda capturada
Falando sobre o ato massivo, embora não tenha superado os bolsonaristas, Cantalice escreve que “massiva também foi a participação da juventude. O que remonta às tradições progressistas brasileiras desde a célebre passeata dos 100 mil, no Rio de Janeiro em 1968”. É uma clara tentativa de tirar o foco do golpe de 2016. A menos, é claro, que ele também, como Fernando Haddad, considere que “golpe é uma palavra um pouco dura” para se referir à retirada de Dilma Rousseff do poder.
Tentando puxar a brasa para a própria sardinha, Cantalice se vangloria dizendo que “como não poderia ser diferente, destaca-se a presença da estrutura petista em todos os atos”. Mais uma vez é preciso perguntar: onde esteva essa estrutura nos últimos anos? Por que não conseguiram levar gente para as ruas mesmo em um 1º de Maio com a presença de Lula?
A verdade é que esse ato contou com a estrutura golpista da Rede Globo e da burguesia. Os principais atores de 2013 estão dando as cartas e capturando para si o protagonismo das ruas. Essa gente é especialista em revoluções coloridas, e não custa nada se voltarem contra Lula, o próximo alvo, uma vez que o primeiro da lista, Jair Bolsonaro, já foi atingido.




