O sociólogo Oliveiros Marques foi um dos primeiros governistas a se manifestar após o voto do ministro Luiz Fux no julgamento de Jair Bolsonaro (PL). No texto intitulado Fux e a democracia, publicado pelo Brasil 247, Marques inicia o artigo dizendo que “Fux escolheu o seu lado da história. E tem esse direito”. Óbvio, cada um, cada um. O que chama a atenção é o tratamento dispensado a um ministro que, segundo a tese da esquerda pequeno-burguesa, teria se alinhado ao “golpismo”. Fosse Bolsonaro ou algum de seus apoiadores, seria xingado por Marques. Mas, como Fux é ministro do Supremo Tribunal (STF), o autor defende o seu “direito” de escolher o seu “lado na história”.
O mais interessante é que, na tentativa de defender Fux, Marques acaba defendendo os réus:
“Não depuseram o governo democraticamente eleito. Pode-se concordar ou não com seus argumentos. O que não se pode é imaginar um país em que ele não tivesse o direito de se manifestar. Um país sem Suprema Corte. Não concordo com os argumentos apresentados pelo eminente ministro. Tampouco com seus acrobáticos paralelismos. Mas, felizmente, ele mantém o direito de fazê-los.”
Ou seja, segundo Marques, já que os réus não depuseram o governo eleito, não há golpe. E, portanto, quem defende que eles não sejam punidos não é, necessariamente, cúmplice de um golpe de Estado.
Ocorre que a acusação contra Jair Bolsonaro e seus aliados é fundamentalmente uma acusação por um conjunto de opiniões. Não há provas de que o ex-presidente tenha planejado assassinar alguém, nem mesmo que tenha ordenado que manifestantes invadissem as sedes dos Três Poderes. O fio que liga os fatos e documentos amontoados pela acusação e Bolsonaro é tão-somente que ele, segundo a Procuradoria-Geral da República, seria favorável a essas ações.
O autor segue, então, dizendo que “um segundo aspecto que merece atenção é a reafirmação do imaginário – na maioria das vezes refletido na realidade – de que a Justiça vale para os ricos e poderosos”. É fato. O próprio Fux concordou com muitas das arbitrariedades cometidas com os réus menores da chamada “trama golpista”. No entanto, deixando de lado a incoerência de Fux, é também de se esperar que ele desse maior atenção ao caso, pois se trata de um ex-presidente da República. O que acontecer neste julgamento terá consequências importantes para todos os brasileiros.
Ignorando este problema, Marques conclui assim o seu artigo:
“Contudo, olhemos pela ótica do copo meio cheio – se é que isso seja possível. O voto do ministro Luiz Fux, inegavelmente, afasta qualquer ideia de perseguição política contra os golpistas. Afinal, ele foi indicado à Suprema Corte pela ex-presidenta Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores.”
Na verdade, o voto de Lula reforça e muito a ideia de perseguição política. O fato de ter sido indicado por Dilma Rousseff, na verdade, é favorável a esta ideia. Afinal, por um longo período, o bolsonarismo ficou muito isolado na Corte, tendo como apoiadores apenas aqueles que ele mesmo indicou, Kássio Nunes e André Mendonça. A absolvição de Fux traz o seguinte recado: a perseguição é tão flagrante que até um ministro que não é bolsonarista votou contra a condenação.
Mas mais importante do que isso é que Fux não apenas votou para absolver Bolsonaro, mas realizou um espetáculo de demolição das teses de Alexandre de Moraes. Ele abriu uma dissidência na Corte, que irá enfraquecer a atuação de Moraes.
Fux sabia que seria derrotado na votação do STF. Mas, da maneira como votou, abriu uma brecha jurídica para a anulação do julgamento e ainda abriu uma brecha política para que a ditadura de Moraes seja contestada por todos os ministros.




