No artigo Anistia para um projeto golpista e assassino, publicado pelo Brasil 247, o jornalista Gustavo Tapioca recorre ao velho método da imprensa burguesa para defender medidas antidemocráticas: a do pânico moral. O próprio título já indica isso. É como se dissesse: se você é a favor da anistia, você é cúmplice de um assassinato e de um golpe de Estado (ou, pelo menos, de tentativas disso).
O autor começa dizendo que:
“O julgamento de Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal não é apenas o processo de um ex-presidente que repercutiu ao redor do mundo. Trata-se da análise de um projeto autoritário de longa duração.”
Não, senhor Tapioca. Em um julgamento em um regime pretensamente democrático, o que se julga é a prática de um determinado delito, praticado por uma determinada pessoa, em determinado local, em determinado momento. Não existe o crime de “projeto”.
É possível analisar um “projeto”? Sim. Mas isso não cabe ao Judiciário. O jornalista tem todo o direito, na condição de articulista, de dizer o que pensa sobre as falas e atitudes de Bolsonaro. Pode escrever um livro inteiro para condenar aquela que seria a sua doutrina política. Mas Bolsonaro está sendo julgado pelo Poder Judiciário — o que, por seu turno, exige um outro tipo de consideração.
Ao defender que Bolsonaro seja julgado por um “projeto”, o jornalista está atentando contra os direitos democráticos do povo brasileiro como um todo. Está defendendo um regime jurídico bárbaro, no qual alguém pode ser condenado sem que tenha sido comprovado, factualmente, que tenha cometido um crime.
Não é preciso ter muita imaginação para entender isso. Acaso não passa pela cabeça do jornalista que um juiz seria capaz de considerar o comunismo um “projeto golpista e assassino”?
Não houve “golpe” nenhum. Houve uma manifestação de uns flagelados que sequer estavam armados. Ainda que houvesse, seria necessário vincular as pessoas ao tal golpe. Qual a prova de que Bolsonaro teria ordenado o fechamento do Congresso ou qualquer coisa do tipo?
Obviamente, o autor não entra no debate jurídico. Ele insiste, assim, em apresentar argumentos políticos.
O primeiro e mais absurdo deles é o que se segue:
“O que hoje o Supremo julga não é uma conspiração pontual. É um golpe continuado, planejado, testado e reatualizado ao longo de quase uma década. Seu ponto de partida pode ser identificado no impeachment de Dilma Rousseff, em 2016. No dia da votação, Jair Bolsonaro, então deputado, deixou clara a natureza do projeto que viria a encarnar:
‘Nesse dia de glória para o povo brasileiro, tem um nome que entrará para a história. Parabéns, presidente (da Câmara) Eduardo Cunha. Eles perderam em 64, perderam agora em 2016, contra o comunismo, pela nossa liberdade, contra o Foro de São Paulo, pela memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, meu voto é sim’.”
Ainda que as provas num debate político tenham natureza distinta daquelas em um debate jurídico, o autor precisaria comprovar o que está dizendo, para que tenha validade. Por que o suposto “projeto golpista” seria uma continuidade do golpe de 2016? Apenas citar um discurso do ex-presidente não prova absolutamente nada.
O autor deveria se perguntar? Por que ocorreu o golpe? Quem organizou o golpe? E, desta forma, traçar as comparações com o momento atual.
Acontece que o golpe de 2016 foi organizado e promovido pelo grande capital, pelo imperialismo. E teve no Judiciário o seu principal pilar institucional. Hoje, de que lado está o grande capital? De que lado está o Judiciário? Estão, inequivocamente, do lado da ditadura de toga que está proscrevendo Bolsonaro.




