Polêmica

Não existia crime antes do celular?

Colunista da Folha compara pais que dão celular às crianças com traficantes

Desde a publicação do vídeo “Adultização” do youtuber Felca, a burguesia no Brasil tem intensificado sua cruzada contra os direitos democráticos da população brasileira na internet, tendo como desculpa os supostos males que o meio de comunicação apresenta para as crianças.

No dia 24, seguindo essa linha, o colunista da Folha de São Paulo e membro da Academia Brasileira de Letras, Ruy Castro, publicou um texto intitulado “Digitar antes de saber ler”. Trata-se de mais uma peça de propaganda a favor da censura na internet.

O texto, no entanto, é confuso e não apresenta um ponto central claro. Por exemplo, logo no começo, o autor fala sobre como o celular, mesmo desligado, é capaz de escutar as conversas que temos e, assim, alimentar o algoritmo das redes sociais com a propaganda de diferentes mercadorias, algo que praticamente todos com celular já perceberam que realmente acontece.

A espionagem, no entanto, não é novidade. Sabe-se que os Estados Unidos fiscalizam a vida de todos seus cidadãos e de todos os seres humanos com conexão com internet há muito tempo. Edward Snowden, por exemplo, vazou documentos da NSA em 2013 comprovando e detalhando o funcionamento dessa espionagem.

Na sequência, porém, é que o autor começa a falar das crianças e a nos ensinar sobre a periculosidade do celular:

E finalmente começa a se atentar para o caso das crianças. Um celular na mão delas é mais perigoso que uma navalha, uma granada ou uma pistola com seis balas no pente —com o agravante de que essas armas só se voltam contra elas. A tragédia não se limita aos sites de exploração de menores por pedófilos de todos os tipos, hoje sendo flagrados e denunciados. O diabólico é que esses sites estão aprendendo a se defender —conseguindo detectar sinais de “perigo”, como a presença de pais ou responsáveis na proximidade da criança.

Seria por esse motivo, talvez, que Ruy Castro, preocupadíssimo com as crianças, mesmo com a publicação de várias colunas de assuntos diversos, não tenha se preocupado em publicar nada sobre as milhares de crianças assassinadas por “Israel” em Gaza, já que, mais perigoso do que as armas, as granadas e as bombas que caem em suas cabeças, seria um celular que pudesse gravar o acontecimento e denunciar para todo o mundo o genocídio.

É uma afirmação sem qualquer base na realidade. Qual é o próximo passo? Falar que os livros são mais perigosos do que bombas nucleares? O único perigo real dos celulares nas mãos das crianças é o da informação, já que a internet é o meio de comunicação mais rápido já criado pela humanidade, o que coloca o controle da informação por parte da burguesia em risco total.

Fora isso, os perigos que a internet impõe às crianças são os mesmos que já existiam desde muito tempo antes da internet ser inventada. Uma rápida pesquisa na internet mostra inúmeras matérias, incluindo essa, da Folha de São Paulo, que atribui aos pais o maior número de abusos sexuais contra as crianças no Brasil. Sem entrar no mérito de se os dados são verdadeiros ou não, fato é que os riscos de abusos sexuais contra as crianças é algo tão antigo quanto a própria sociedade humana, e que não é culpa da internet.

A internet, nesse caso, é como um espelho da própria sociedade. Existem os crimes, a dor, o sofrimento, assim como existem as coisas boas. Na internet, o que vemos é uma distorção dessa realidade, mas, ainda assim, vemos somente aquilo que já existe em nossa sociedade. Quem luta a favor da censura da internet, portanto, não luta contra a pedofilia, os abusos, os crimes e todos os males dos seres humanos, mas luta para que essa realidade horrível não salte aos olhos de todos.

Na sequência do texto, mais críticas ao uso da internet:

Pesquisas recentes afirmam que o brasileiro passa o absurdo de três horas por dia nas redes sociais. Outras calculam em 140 bilhões nosso número de interações diárias com o ChatGPT. Somos o terceiro país que mais usa a “ferramenta”, atrás só dos EUA e da Índia.

Ou seja, segundo o colunista, o correto para o Brasil seria voltar à época das cavernas, abdicando de qualquer tipo de tecnologia e avanço científico, sem qualquer motivo para isso.

Qual seria o problema de se utilizar as redes sociais e as chamadas inteligências artificiais, como é o caso do ChatGPT?

A resposta é simples: o problema, novamente, é o acesso à informação. Da mesma forma que hoje se reclama da internet, em que uma quantidade inimaginável de conteúdo está disponível nas mãos de todas as pessoas, durante os séculos XVIII e XIX, os reacionários da aristocracia europeia lutavam contra a Enciclopédia de Diderot e D’Alembert por esta difundir a informação para todos os seres humanos que a possuíssem em mãos.

São inúmeros os exemplos de casos do tipo, desde a Ditadura Militar de 1964, passando pela Inquisição e pelos nazistas, todos os movimentos reacionários lutaram contra os meios de comunicação mais avançados.

A prova, no entanto, de que a preocupação com a internet não tem nada a ver com as crianças está no último parágrafo do texto:

E já ouvi falar também de crianças que aprenderam a usar o teclado do celular muito antes de aprender a ler. Se o celular pode ter o efeito de uma droga, seus traficantes são seus pais.

Primeiro, qual seria o problema de aprender a digitar antes de aprender a ler? Vivemos em um país em que o direito a aprender a ler é negado para a maioria das crianças. Os métodos atuais de alfabetização, a progressão continuada e a negação da alfabetização são temas recorrentes de críticas de educadores e cidadãos que estudam o assunto. É possível, por exemplo, entrar em uma sala de terceiro ano do ensino médio com 40 alunos e não conseguir encontrar sequer um aluno que seja plenamente alfabetizado.

Se algo tem feito com que as crianças e os adolescentes tenham interesse pela leitura, entretanto, se trata da internet e de suas redes sociais, que, além de divulgarem conteúdos que despertam o interesse dos jovens, proporcionam ambientes em que é necessário ler e escrever para poder interagir, caso de jogos e sites de notícias.

Em segundo lugar, está a comparação sem sentido de que os pais seriam como traficantes de drogas para as crianças. A afirmação busca, somente, criar o clima para a censura e para a criminalização do uso da internet.

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