Partido da Causa Operária

Leia informe político de Rui Pimenta a plenária nacional do PCO

Presidente nacional do Partido, Pimenta fez um panorama da política internacional e nacional

Em novo informe apresentado à plenária nacional do Partido da Causa Operária (PCO) realizada durante o 52º Acampamento de Férias da Aliança da Juventude Revolucionária (AJR), o presidente nacional do partido, Rui Costa Pimenta, ofereceu uma análise aprofundada da conjuntura política internacional e nacional. Ele destacou os impasses do imperialismo, a ilusão do multilateralismo promovida pelo governo Lula e os caminhos para uma verdadeira luta contra a dominação imperialista.

No informe, Rui Pimenta aponta que o cenário internacional, longe de caminhar para uma suposta “governança global” ou “mundo multipolar”, segue sendo marcado pela ofensiva dos países imperialistas que, mesmo enfraquecidos por sucessivas crises, se rearmam aceleradamente e organizam novas agressões contra países como Irã, Rússia, China e Coreia do Norte. Para ele, a crença difundida pelo PT de que seria possível reformar o sistema internacional por dentro, via ONU ou alianças como o BRICS, constitui uma perigosa ilusão que desarma politicamente a luta revolucionária.

O presidente do PCO também abordou os desdobramentos da crise interna do governo Lula, marcada pela derrota no Congresso sobre o IOF e pela recente ameaça de tarifas por parte de Donald Trump. Segundo o dirigente trotskista, o governo tenta reagrupar sua base com palavras de ordem nacionalistas e “em defesa da soberania”, mas sem mobilização real das massas e com objetivo meramente eleitoral. A política da frente ampla, diz, revela seus limites: “Lula reina, mas não governa”.

Abaixo, publicamos a íntegra do informe político apresentado por Rui Costa Pimenta, parte das discussões da plenária nacional do Partido.

Informe político, 13 de julho de 2025

A política internacional é um aspecto da situação política fundamental que vai determinar a nossa atividade aqui no Brasil e internacionalmente, porque, nessa altura do campeonato, já temos uma boa quantidade de iniciativas em escala internacional.

Vimos aí que foi realizada a reunião do BRICS. No Brasil, houve várias declarações otimistas do PT e a tônica geral da avaliação é de que nós estamos caminhando para o chamado multilateralismo. Quer dizer, ao invés da dominação exclusiva do imperialismo, teríamos agora vários poderes mundiais. Isso é uma avaliação totalmente infundada da situação política e ela se baseia numa concepção reformista da política internacional. Quer dizer, é a ideia de que você pode, por meio de iniciativas pacíficas, por meio de pequenas mudanças daqui e acolá, mudar o quadro internacional como se nós vivêssemos em uma democracia parlamentar de caráter internacional, o que não tem o menor respaldo na realidade.

A reunião do BRICS propôs uma mudança que eles estão chamando de governança mundial, que é um termo ilusório. Não existe nenhuma governança mundial, o que existe é o imperialismo. O imperialismo dá as cartas, faz e desfaz a seu bel-prazer tudo que ele acha que deve fazer na situação internacional. A ONU, que seria, digamos assim, o depositário dessa governança internacional, é uma fachada. Quando toma uma decisão progressista, nunca é executada. Quando o imperialismo quer fazer alguma coisa, passa por cima das resoluções da ONU e fica tudo por isso mesmo. O que mostra que uma organização como a ONU é um teatro onde as pessoas vão lá para fazer de conta que existe uma espécie de parlamento mundial. Não existe nada disso, isso é uma ilusão, inclusive, grotesca. Estamos vendo o que está acontecendo na Faixa de Gaza. Aí a ONU, o Conselho de Segurança da ONU, não conseguiu tomar uma decisão a respeito disso. A própria ONU não se posicionou energicamente pelo fim das hostilidades, do massacre, do genocídio, do sionismo e do imperialismo em Gaza. Israel atacou o Irã, os EUA atacaram o Irã e fica tudo por isso mesmo. Pelo contrário, quando o Irã reage ao ataque, os países imperialistas dizem que Israel tem o direito de se defender e o Irã não pode atacar Israel, que é uma coisa grotesca, um espetáculo grotesco.

De um ponto de vista geral, temos que deixar claro que a solução da crise internacional que estamos vivendo, que se agrava a todo momento, não será pacífica e não será por acordo, não será por meio de reformas da ONU. Esse caminho é semear uma ilusão, e essa ilusão é uma ilusão perigosa porque não cria as condições para solucionar o problema que está criado.

No Brasil, o PT estimula muito essa ilusão do multilateralismo, o Lula falou muito em multilateralismo na ONU, e essa expressão multilateralismo acaba ocultando o fato de que os países que seriam os expoentes do multilateralismo são países brutalmente oprimidos pelo imperialismo. Tudo isso é uma coisa extremamente negativa.

Uma segunda conclusão que precisamos tirar é a seguinte: se bem seja importante a ação de alguns estados contra o imperialismo, a solução também não vai vir por essa via. É muito improvável que, mesmo com o imperialismo em crise, enfraquecido, países como a Rússia e o Irã venham a derrotar o imperialismo, é muito improvável. Devemos dizer que, na maioria dos casos, esses países têm uma série de fragilidades, debilidades diante do imperialismo. Embora apoiemos todas as iniciativas contra o imperialismo, não acreditamos que a via será a derrota do imperialismo na mão de países que procuram se libertar da influência do imperialismo. Essa luta desses países contra o imperialismo pode contribuir para a luta geral contra o imperialismo, mas devemos deixar absolutamente claro que só a revolução proletária pode derrotar o imperialismo. É importante dizer isso não como uma afirmação meramente declaratória, mas como uma perspectiva política. Nós não acreditamos que a formação de um bloco de países, que pode ser uma coisa bastante progressista em um dado momento, seja a via para derrotar o imperialismo. A via para derrotar o imperialismo é a revolução, a revolução dos países atrasados e a revolução nos países imperialistas. Sem a construção de partidos revolucionários, sem a luta de classes dentro desses países, ninguém vai ser derrotado. A derrota militar do imperialismo, que pode acontecer — aconteceu no Iraque, no Afeganistão etc. —, pode acontecer também na Ucrânia, nunca vai chegar num ponto tal que um país consiga impor uma derrota absoluta do ponto de vista militar ao imperialismo. São questões gerais que temos que deixar esclarecidas porque temos que ver qual a perspectiva estratégica que guia a nossa ação cotidiana.

Então, apoiamos a luta do Irã, do Hamas, que são lutas nacionais, apoiamos os russos contra o imperialismo e assim por diante, mas nós não achamos que, por meio da força militar ou econômica, no caso da China, o imperialismo será derrotado. O imperialismo é uma ditadura mundial muito poderosa, por mais que esteja muito debilitada através de crises sucessivas, não há motivo nenhum para acreditar que isso vai desaparecer por um processo gradual e um processo de reformas.

Do ponto de vista geral, do ponto de vista mais concreto, temos que dizer o seguinte: estamos assistindo a uma situação bastante contraditória. De um lado, as forças que lutam contra o imperialismo vêm conseguindo resultados importantes. Tivemos aí o Irã, que conseguiu frear totalmente a iniciativa agressiva dos EUA, do imperialismo norte-americano e europeu e do sionismo. As notícias que nós recebemos de Gaza são bastante positivas. É uma coisa que a gente precisa ainda ver com maior precisão, mas dá a impressão de que o exército sionista está se decompondo no enfrentamento com a resistência palestina em Gaza. Então, são notícias altamente positivas. Mas, ao mesmo tempo, temos que ver a iniciativa do próprio imperialismo, do que ele está fazendo. Por exemplo, ao mesmo tempo que aparecem essas notícias positivas em Gaza, começam a surgir rumores de que poderia haver uma guerra entre a Síria e o Líbano para tentar exterminar o Hesbolá. Os sírios exigiram a soltura de milhares de prisioneiros sírios no Líbano acusados de atos de terrorismo. Os libaneses concordaram em soltar uma parte das pessoas, uma parte pequena. Depois apareceu a pressão norte-americana dizendo que se o governo libanês não desarmasse completamente o Hesbolá, haveria uma invasão do Líbano pela Síria e talvez apoiado pela Turquia. Não são declarações oficiais, mas mostram que o imperialismo está muito longe de se colocar numa posição puramente defensiva.

Uma coisa que contribui para gerar essa ilusão que o pessoal tem, de que o imperialismo vai entregar os pontos sem luta, é o governo Trump. O governo Trump, logicamente, é uma política, uma tentativa de um setor da burguesia norte-americana de organizar um recuo da política do imperialismo. Então, o Trump gostaria de diminuir a intervenção militar norte-americana em vários lugares, desmanchar bases norte-americanas e se concentrar na economia nacional norte-americana, que está em uma situação deplorável. Isso tem sido interpretado por algumas pessoas como sendo uma política geral do imperialismo, mas não é a política do imperialismo. A política do imperialismo não é uma política de recuo, é manter a situação atual, se reorganizar do ponto de vista militar e restabelecer integralmente sua dominação política e militar mundial.

Então, isso é uma confusão. A política do Trump não representa a política dos EUA, do imperialismo norte-americano propriamente dita. Enquanto todo mundo fala que o imperialismo não dá conta, que a OTAN está falida etc., o que estamos vendo é que, na Europa, há uma política acelerada de armamento. Destacamos em várias oportunidades que, em pouquíssimo tempo, a Alemanha se transformou no 4º país mais armado do mundo. E a Alemanha não é um caso isolado. Todos os países europeus estão se armando, até Portugal está investindo uma parte de seu produto bruto em armas. Na realidade, o que está acontecendo é o seguinte: a crise com o Trump e a crise russa demonstrou que, para impor o status quo internacional, a Europa precisa ter uma força considerável. O que está sendo superado é que, até o momento, eram as forças armadas norte-americanas que constituíam o papel de polícia do mundo. Havia um problema ali, os norte-americanos, às vezes numa coligação com outro país, intervinham. Essa situação está mudando. A Europa e o Japão já perceberam que os EUA sozinhos não têm condição de executar esse papel de polícia do mundo. Então, o que está acontecendo na verdade, não é que o imperialismo está recuando, ele está procurando se fortalecer. E a Europa, depois dos EUA, é a parcela do bloco imperialista mais importante. Mas o Japão também está se armando aceleradamente. E não é só o bloco imperialista. Os países satélites do bloco imperialista, países que estão bastante estreitamente aliados com a política militar do imperialismo estão se armando também, como Austrália e outros países. O imperialismo montou toda uma operação de agressão militar na Ásia contra a China. Eles estão numa política de agressão, estão se preparando para uma agressão.

Então, não devemos confundir determinadas contradições que aparecem na política imperialista com uma mudança no cenário em que o mundo é dominado pelo imperialismo.

Como partido, nós nunca partilhamos da ideia de que o mundo está dividido entre EUA e URSS ou coisa do gênero. Nossa compreensão é outra. O mundo é dominado pelo bloco de países imperialistas. Os EUA podem ser o mais importante de todos, mas os países imperialistas também são importantes de um modo geral. Quer dizer, não pode haver a menor dúvida de que o imperialismo está organizando, está executando uma contraofensiva para superar a sua situação de crise. Essa reorganização, essa iniciativa do imperialismo será bem-sucedida? Não sabemos, teremos que esperar para ver como se desenvolve a luta política internacional. O imperialismo será bem-sucedido? Não sabemos. O imperialismo será derrotado? Não sabemos. O que temos que ter claro é que a coisa não vai se dar pela via do acordo.

O presidente Lula expressou claramente, no BRICS, essa via do acordo. “Vamos democratizar o mundo”. Não vai acontecer, isso é uma ilusão. No Brasil não aconteceu, a democratização do Brasil, em grande medida, é uma fachada. Tanto que vemos agora, esse último governo Lula deixou claro, que o Lula reina, mas não governa. Então, não há a tal redemocratização, não há a imposição da vontade popular, não há o acordo que leva a uma mudança geral da situação. Isso são ilusões, e devemos dizer que são ilusões não apenas de um ponto de vista geral, mas de um ponto de vista imediato. Quer dizer, não vai durar muito esse sonho cor de rosa que o pessoal está expressando, o mundo caminha para um enfrentamento. Não pode haver dúvida de que o imperialismo está preparando guerras de grandes proporções contra Irã, China e Coreia do Norte, Rússia. Não pode haver a menor dúvida disso.

Esse é o panorama geral. Temos que acompanhar e temos que entender que esse panorama de conflito não é um panorama negativo para o desenvolvimento da luta de classes no Brasil. Pelo contrário, a fluidez da situação política mundial tende a afetar a situação política brasileira. A desestabilização da situação política mundial com certeza levará a uma instabilidade ainda maior do regime político no Brasil. E, logicamente, que a instabilidade, os sinais de debilidade do imperialismo, as derrotas que o imperialismo vem a sofrer ou já sofreu, elas impulsionam a ação das massas em escala mundial. Então, temos que entender que estamos trabalhando nesse marco e não alimentar nenhuma ilusão sobre a via pacífica para a superação da dominação imperialista mundial porque isso é a pior fantasia que poderia existir.

No Brasil, temos o governo Lula com duas crises de grandes proporções que precisamos não apenas analisar em seu conteúdo e seus desdobramentos, mas também traçar uma política diante desses acontecimentos. A primeira é o que aconteceu no Congresso com o IOF — embora tudo tenha se misturado numa campanha política liderada pelo PT. O acontecimento do IOF foi uma derrota muito importante do governo Lula. Ele meio que assinalou o fim do namoro do PT com a burguesia. De repente, os aliados do PT no Congresso foram lá e impuseram uma derrota numa questão chave que, inclusive, é uma exigência da burguesia. Porque o que é o aumento do IOF? É uma política de ajuste fiscal, não vamos nos deixar levar pela propaganda do PT que fala que o aumento do IOF é um ataque ao bolso dos ricos, não se trata de nada parecido com isso. É uma política de ajuste fiscal. O governo, depois de ter adotado inúmeras medidas de ajuste fiscal, percebeu que a conta, que o saldo da conta bancária do governo estava no vermelho e que precisava tirar mais dinheiro da sociedade brasileira para encher o cofre, que é uma exigência do mercado financeiro internacional. Não é uma exigência do Brasil, é uma tentativa de tirar dinheiro da sociedade para colocar na mão dos bancos internacionais. Aí o Congresso vetou essa iniciativa do governo. Fica a pergunta: por que o Congresso vetou essa iniciativa do governo se é uma iniciativa que interessa aos banqueiros internacionais? Primeiro porque o Congresso, dominado pelo mercado financeiro, não está disposto que o Lula coloque nem mesmo uma pequena taxa sobre os banqueiros. Parte da questão do IOF é que atinge a movimentação financeira internacional e, portanto, um setor dos especuladores teria que pagar o IOF. Perto dos ganhos que eles têm, isso é uma esmola.

Ao mesmo tempo, uma parte da classe média também vai ter que pagar IOF, a que faz qualquer tipo de transação internacional. O governo do PT e o próprio PT ocultam essa parte do problema, de que não é um ataque aos ricos, é uma medida fiscal que atinge a classe média e atinge um setor do mercado financeiro.

O Congresso vetou essa iniciativa porque quer forçar o governo a atacar mais duramente a população pobre. Quer dizer, a derrota do governo no Congresso é uma medida política e pegou de surpresa os sapientíssimos estrategistas do PT, que achavam que a coisa já estava toda resolvida, que o PT fazendo o ajuste fiscal tinha incorrido nas boas graças de toda a burguesia. Aí, ele é surpreendido porque um setor da burguesia vai lá e veta mais uma proposta de ajuste fiscal. Quer dizer, o Congresso meio que mandou a seguinte mensagem: estamos preparando a eleição e o governo Lula tem que atacar o bolso popular como tem feito até agora. Nada de IOF sobre a classe média e, principalmente, o mercado financeiro.

Quer dizer, é uma ruptura do pacto e ela se dá de uma maneira muito clara no momento certo porque o governo Lula é um governo que a burguesia tolerou, mas não é o governo que a burguesia desejava. E agora vamos para a eleição e a burguesia não quer um segundo governo Lula. Então, começou uma iniciativa de sabotagem pelo Congresso Nacional, ou seja, pela própria burguesia. Acabou aquela situação de que o governo tinha apoio da burguesia para fazer ajuste fiscal, arcabouço fiscal, reforma tributária, coisas que não interessam à população. É possível prever, se não acontecer nada de muito diferente, que o Congresso vai vetar todas as iniciativas do governo que visem arrecadar dinheiro a partir de agora, exceto aquelas que atingem diretamente o bolso da população.

Então, o governo Lula, em certo sentido, está entre a cruz e a espada. Ou ele promove o ajuste fiscal e incorre no desagrado da população, como ocorreu com a taxa das blusinhas, com o arcabouço fiscal, com o ajuste fiscal do Haddad, com o Pix, ou ele parte para uma política que vai acabar pressionando — e a burguesia vai pressionar nesse sentido — pelo aumento da inflação. Se o governo optar pelo aumento da inflação, a burguesia vai exigir um governo que seja um governo de duro ajuste para conter a inflação. Então, é uma situação meio “se ficar o bicho corre, se ficar o bicho pega”. Aí o governo falou de chamar um ato contra a medida do Congresso, apesar de que a política do governo não é pressionar o Congresso pela via da mobilização popular. A política do governo era recorrer ao STF para anular a decisão do Congresso, uma medida profundamente antidemocrática. Porque um governo democrático é assim: o Congresso é uma porcaria, mas se ele decidiu, decidiu, fazer o quê? Você pode chamar a pressão popular sobre o Congresso, para mudar a opinião do Congresso. Agora, chamar o STF para cancelar uma decisão do Congresso Nacional é uma coisa muito antidemocrática.

Quando estávamos no meio dessa crise, surge a ameaça do Trump de impor tarifas às importações brasileiras para os Estados Unidos. Essa política abriu uma segunda frente de crise com o governo.

Primeiramente, qual nossa posição política em relação à medida do Trump? Somos totalmente contra, é uma ingerência na política nacional brasileira da parte do governo dos Estados Unidos. Porque o Trump não está simplesmente adotando uma política alfandegária, ele está usando a política alfandegária para pressionar a política nacional. Ele está fazendo exigências ao Judiciário brasileiro, essa maravilha que temos aqui, para que mude a sua conduta em relação ao Bolsonaro. Se o Trump simplesmente fizesse críticas dos Estados Unidos ao que está acontecendo no STF, seria normal, todo mundo tem o direito de criticar qualquer coisa. Mas o que ele está fazendo é inadmissível, ele tem que ser repudiado totalmente.

Segundo, qual seria o resultado disso? De um lado, a medida do Trump acendeu umas brasas nacionalistas, que estão debaixo de vários quilos de cinza no PT, e aí todo mundo começa a falar de soberania. Se lembraram de soberania nessa hora, sendo que a soberania do Brasil está sendo arrastada na lama. Isso deu um certo alento ao governo, foi realizado um ato público em São Paulo, na semana passada, que foi um ato público um pouco maior que o normal que o governo tem chamado.

O governo tem trabalhado muito a propaganda. Está chegando a eleição e logicamente que o PT está se preparando para as eleições. Algumas pessoas inclusive falaram que pela primeira vez a esquerda teve mais visualizações nas redes sociais que a extrema direita. Não sei como é isso, mas é um produto eleitoral, não é o resultado de uma luta política geral, é com vistas às eleições. E esse dado, de que é com vistas à eleição, é muito importante. Aí chamaram o ato, o ato teve muita declamação em favor de que os ricos devem ser taxados, de que a soberania nacional brasileira deve ser defendida etc.

O Trump, ao fazer isso daí, logicamente ele está pressionando não apenas o governo brasileiro, está pressionando a burguesia brasileira. Um resultado negativo da política é que o povo brasileiro não tem muita simpatia pelos Estados Unidos. Por isso também que o ato do PT já foi maior, falou que os Estados Unidos estão atacando o Brasil, já cria um clima. Mas, por outro lado, é uma pressão do Trump sobre os empresários. Hoje, por exemplo, na imprensa, vi as declarações dos principais governadores, o Zema, o Tarcísio, o Caiado etc., e o discurso deles é um discurso todo igual: que o Lula está criando uma crise para a economia brasileira, que a política errada do Lula está criando uma crise para a política brasileira. Primeiro, essa alegação deles é falsa, não foi o Lula que criou essa crise. Se alguém criou essa crise, foi o STF. Tudo bem, o Lula apoia o STF, mas ele não é o STF. Se se deveria apontar o dedo para alguém, seria para o STF, o STF criou a crise. Mas, logicamente, os governadores direitistas preferem apontar para o PT por causa da eleição, tudo gira já em torno da eleição.

Se o Trump impuser essas tarifas, vai haver uma perturbação na economia brasileira, e a burguesia de conjunto e a direita vão procurar voltar essa perturbação ao governo Lula. Quer dizer, é uma situação bastante contraditória. O PSOL se transformou, transitoriamente, numa espécie de departamento do PT. Eles dizem que é preciso defender a soberania, acusam o Bolsonaro de ser antipatriótico, o Lula faz declarações bombásticas etc. A princípio, dada a relação de forças do País, a burguesia deveria prevalecer nesse enfrentamento. Alguns setores dizem que essa política do Trump e a política do Congresso vão empurrar o governo à esquerda, essa em geral é a expectativa de setores do PT que estão insatisfeitos com a política do Lula. Por exemplo, no 247, tem uma entrevista com o Genoino e ele fala o seguinte: “vivemos um momento histórico, que une a questão social à questão nacional e à questão democrática”. A questão social seria o IOF, a questão nacional seria o Trump e a questão democrática não sei o que é, possivelmente a defesa das instituições democráticas brasileiras. O próprio Brasil 247 tirou um editorial falando “União nacional contra o tarifaço de Trump em defesa do Brasil, da democracia e da reeleição de Lula. Não há espaço para neutralidade diante de um ataque dessa gravidade”. Então, o PT está procurando agrupar e progredir com base nessa retórica da soberania nacional, defesa da questão social e tal, que foi, mais ou menos, o cardápio do ato público na Paulista essa semana.

Antes da gente analisar a realidade disso, que perspectiva política tem isso? A princípio — logicamente que temos que acompanhar porque a situação é fluida — isso serve para o governo Lula reagrupar a sua base que estava se esfacelando com a política social, com a política fiscal negativa. A declaração do Genoino é sintomática porque ele era crítico da política do PT, do governo Lula. Então ela ajuda, pelo menos temporariamente, a botar ordem na casa. O PT é um partido que muda facilmente de posição porque o pessoal fica entusiasmado com uma iniciativa desse naipe. Há declarações, por exemplo, do Alexandre Padilha, que fala: “taxar os super-ricos é fortalecer o SUS e aliviar 99% da população”. Não vai acontecer isso. Em grande medida é demagogia e está voltado para a base do PT. Aí acusa o Bolsonaro de ser traidor da pátria, aquele negócio todo. Um cidadão fala: “bolsonarismo assinou seu atestado de óbito”. Diria que é muito otimismo para pouca coisa, precisaria se desenvolver muito mais para chegar nesse nível de otimismo.

O problema é que, para isso se desenvolver, você precisa ter uma política de mobilização. O Lula precisaria decididamente entrar no caminho da mobilização. A pergunta é: a política do Lula e do PT é entrar no caminho da mobilização? Não. Isso é uma política, também, que busca pressionar os setores da frente ampla para manter a Frente Ampla. Reagrupar a base, pressionar a base, pressionar a esquerda que olha para o governo Lula com muito desagrado. Na sexta-feira, no 247, alguém falou que o PCO faz ato para países estrangeiros mas não vai no ato para defender o Brasil. Quer dizer, querem pressionar até a gente. Eu acho que a política do PT não vai por esse caminho, mesmo com essa situação crítica. Acho que tudo isso é muita fumaça para pouco fogo. Muita propaganda, muita retórica para pouco fogo. Mas vamos ver o que acontece porque temos que ter claro que, como a situação é crítica, muita coisa pode acontecer. Não devemos descartar de imediato que uma política como essa, apesar das intenções do PT e do governo, pode levar a alguma mobilização de algum grau. Mas essa, devemos ter claro, não é a intenção desse tipo de coisa que estamos vendo agora. Isso aqui é 90% retórica, 10% vontade de fazer alguma coisa séria.

Qual nosso posicionamento diante desses acontecimentos? Não devemos embarcar nessas ilusões que o pessoal está disseminando. O pessoal fala que é uma luta entre o imperialismo e a esquerda brasileira, o governo Lula, as instituições etc. Como campanha a favor da soberania, é muito pouca coisa. O Trump está atacando o Brasil, principalmente o empresariado brasileiro? Sim, não há dúvida. Mas aqui já houve ataques muito mais ferozes e não vimos toda essa reação. O imperialismo derrubou o governo da Dilma Rousseff, não aconteceu nada, não houve todo esse entusiasmo dessa gente. Chamo atenção a isso porque as coordenadas dessa luta política são não contra o imperialismo, mas contra o Trump. A política do PT continua sendo de aliança com o imperialismo, e não de ruptura com o imperialismo. A exaltação toda é porque é o Trump, em primeiro lugar temos que dizer. Anti-trumpismo não é anti-imperialismo, não é a mesma coisa. Pelo contrário, o anti-trumpismo, numa grande medida, é uma política que se harmoniza perfeitamente com uma política de aliança com o imperialismo dito democrático. Não há contradição, não é uma luta contra imperialismo, mas uma luta contra o Trump. Num certo sentido, expressa, aqui, uma luta de um lado do imperialismo contra o outro do ponto de vista da estratégia política do PT, não dos fatos no Brasil. Sobre os fatos no Brasil, somos contra esse tipo de ação porque, em grande medida, é uma ação política dentro do Brasil, uma tentativa de condicionar a política brasileira.

Segundo, não é uma verdadeira política de mobilização, é uma política eleitoral. O grande objetivo dessa política é armar um bloco que vai apoiar a candidatura de Lula nas eleições de 2026 se o Lula chegar com essa bola toda na eleição — o que também não é seguro. E depois, tudo isso daqui pode ser fogo de palha. Então, nós não podemos comprar essa ideia de que, como diz o Genoino, “momento histórico”, não tem momento histórico; “questão social”, não tem questão social. Eles introduziram no ato a escala 6×1, mas isso é aquela história que o cara põe um brinde para atrair o freguês. E depois ninguém sabe o que significa escala 6×1. Li uma matéria que diz que se abriu uma discussão em outro país, no Chile, sobre a redução da jornada para 40 horas. Só que a lei introduz aquilo que falamos que é o perigo da escala 6×1: a jornada flexível de trabalho. Então eles apresentam a redução da jornada, mas introduzem a jornada flexível.

A redução da jornada, levando em consideração que estamos vivendo uma época de completa instabilidade das empresas, não é um ataque verdadeiro contra a burguesia porque a produção faz assim: sobe e desce, sobe e desce. E a jornada flexível resolveria o problema da redução da jornada. Então você faria o pessoal trabalhar mais quando tem mais produção e trabalhar menos quando não tem nada, e o salário também seria um salário flexível. Então esse problema da jornada 6×1 é um problema muito sério. A questão do IOF não vamos nem falar. Se isso é uma proposta social, faça-me o favor.

Na questão nacional, é um ataque do Trump contra o Brasil, mas vamos ter claro: é um ataque até meia-boca. Uma coisa que o pessoal não se dá conta é que o Trump quer forçar o Brasil através de tarifas. Mas o Brasil já é forçado, no marco de política de embargo, de bloqueio econômico, de sanções dos países imperialistas contra vários países do mundo. O caso mais escandaloso é o caso de Cuba. Aqui, fica oculto esse fato, mas o Brasil não tem nem uma empresa aérea que faça voos daqui para Cuba apesar de que muitos brasileiros vão para Cuba. Por que não tem uma empresa aérea? Porque o imperialismo não permite comprar de Cuba, vender para Cuba. As empresas brasileiras não podem fazer isso, é uma ditadura. Aí o Trump aumenta a tarifa e pronto, grande questão nacional. Então, numa certa medida, é uma farsa isso, e o PT está usando, apesar de que tem que se opor. Então, a nossa posição não é favorável a alimentar demagogia.

Então, o que temos que fazer? Primeiro, se o PT impulsionar uma mobilização, ainda que limitada, temos que participar dessa mobilização. Mas temos que participar da mobilização com nossa própria pauta de reivindicações. Então, por exemplo, nenhum imposto sobre o consumo, imposto sobre as grandes fortunas e os lucros. Não vamos aceitar uma política de mera enganação. 6×1? Não. 35h semanais, fim de semana livre, sem redução do salário. Sobre o imperialismo, fora base de Alcântara, ruptura dos tratados do imperialismo. Quer dizer, vamos apresentar nosso programa, que é um programa de verdade, um programa para valer. Vamos para a mobilização com esse programa, e não com o programa da mobilização. Então vamos lutar por reivindicações reais, efetivas. Não vamos lutar aqui por reivindicações que são mera aparência política. Quer dizer, vamos apoiar o que eles dizem que estão fazendo, mas não vamos apoiar exatamente o que estão fazendo.

Por que vamos fazer isso? Porque qualquer iniciativa para mobilização, mesmo limitada, como essa do PT, que é muito limitada, deve ser aproveitada por um partido revolucionário para ir mais além. Se olharmos e falarmos: isso tudo é algo meia-boca, não vamos participar. Simplesmente vamos ficar de fora de uma atuação que pode ser limitada, mas é alguma coisa. Temos condição de fazer mais do que eles estão fazendo? Não, então vamos participar com nossas palavras de ordem. É um passo no sentido de uma verdadeira mobilização. Vamos colocar o problema da dívida pública, da estatização do petróleo e assim por diante. Vamos colocar todo o nosso programa. Acho que temos que elaborar uma declaração do PCO colocando um programa sério contra o imperialismo, um programa sério da democracia — nada de censura, defesa das liberdades democráticas —, um programa anti-imperialista sério, um programa de reivindicações econômicas e sociais sério e reivindicações democráticas sérias.

Na segunda parte da nossa plenária, vamos discutir um plano de trabalho, e temos que prestar atenção no desenvolvimento que ainda é pequeno, mas que já chama atenção, de greves principalmente no setor público. Temos que ver a possibilidade de impulsionar esse tipo de greve, de participar, de ver se isso abre caminho para se transformar num movimento mais geral. Porque, no final das contas, o mais importante para nós é a consciência geral das massas trabalhadoras. Impulsionar a luta é um esforço para fazer evoluir a consciência das massas trabalhadoras no sentido de uma mobilização geral.

Esse seria o conjunto da nossa política.

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