No artigo Bolsonarismo tem uma estratégia clara, publicado no portal Esquerda Online, Valério Arcary, dirigente da corrente Resistência, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), expressa toda a arrogância e a ignorância da esquerda pequeno-burguesa a respeito do fenômeno do bolsonarismo. Ao especular sobre o futuro do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ele alega que:
“Não é preciso ser lulista para perceber que Bolsonaro não tem a grandeza de Lula. Lula cometeu erros políticos em sua vida, alguns graves como a subestimação do golpe institucional que derrubou Dilma Rousseff em 2016, mas manteve a firmeza inabalável de quem confiava que a luta política e social iria absolve-lo. Bolsonaro pode ‘fraquejar, no seu próprio linguajar diante do risco evidente: ‘apodrecer’ na prisão. Esta é a dimensão inescapável do ‘papel do indivíduo’. Mesmo se sentindo fortalecido pela eleição de Trump, e o apoio internacional do movimento neofascista, não se deve desconsiderar a hipótese de uma desmoralização pessoal. Bolsonaro pode escolher o caminho da fuga ou de refúgio em uma embaixada para ‘dramatizar’ como perseguição a decisão da justiça.”
A questão é que o futuro do bolsonarismo e do lulismo nada têm a ver com uma questão moral. Ambos são expressões de movimentos em que estão envolvidas milhões de pessoas.
Goste Arcary ou não, Bolsonaro teve a segunda maior votação para presidente da República da história do País. A sua diferença para Lula, em 2022, foi de apenas dois milhões de votos. As eleições daquele ano mostraram um País completamente dividido.
Fica, então, a questão: de 2022 para 2025, essa situação mudou? A extrema direita recuou? Não, pelo contrário. A extrema direita cresceu, e muito. Ela teve uma vitória histórica nas eleições municipais de 2024, conquistando a maioria das prefeituras das grandes cidades. O partido de Jair Bolsonaro, o Partido Liberal (PL), foi o mais votado de toda a eleição.
O crescimento da extrema direita, por sua vez, está diretamente relacionado com a política levada adiante pelo governo Lula. O presidente, cercado por todos os lados, pelos banqueiros, pelos identitários e pelo próprio bolsonarismo, capitulou diante da extrema direita e se negou a partir para uma luta política contra o bolsonarismo. Em vez de enfrentar os bancos, desenvolver o País, gerar emprego e estatizar empresas como a Petrobrás, procurou se equilibrar entre as demandas populares e a pressão dos capitalistas. Resultado: o governo é um desastre.
Esse desastre se reflete sobretudo na economia. O governo não conseguiu, nem minimamente, reverter a piora nas condições de vida provocada pelo golpe de 2016. Esse cenário abriu o caminho para que a extrema direita se desenvolvesse. Nada ilustra melhor isso do que a chamada crise do Pix: na medida em que o governo Lula tomou mais uma medida impopular, que poderia levar ao aumento de impostos cobrados sobre uma parcela pobre da população, a extrema direita, com sucesso, se apresentou como representante dos interesses populares.
Nessa toada, a extrema direita vai crescer. É inevitável. A situação econômica irá piorar e a pressão sobre o governo vai aumentar, respondendo à crise do imperialismo. Assim, independentemente de qualquer questão moral, o bolsonarismo tende a crescer.
Suponhamos que Bolsonaro, por exemplo, fuja para uma embaixada. Como será que isso será visto pela população, como um ato de covardia do ex-presidente, como quer crer Arcary, ou como mais uma demonstração de que o mesmo Estado que quer roubar o salário do pobre agora quer perseguir o homem que denuncia o escândalo do Pix?
Não é difícil de responder a essa pergunta. Com uma política errada, não importa o que Bolsonaro faça, a tendência é que seu movimento se radicalize.
A conversa fiada sobre uma “desmoralização” de Bolsonaro preso é, no final das contas, uma cobertura criada por Arcary para esconder o seu apoio à política que poderá levar o ex-presidente de fato à cadeia. O dirigente do PSOL quer, com meio de tal malabarismo retórico, apresentar que a prisão de Bolsonaro, por métodos ilegais e arbitrários, será positiva para a esquerda.
Não será. Sem uma política combativa da esquerda, qualquer movimento contra Bolsonaro que parta do Estado apenas jogará mais água no moinho do bolsonarismo.