No ano de 1876 o Imperador D. Pedro II do Brasil fez uma viagem à Palestina. Ele sempre foi um admirador do Oriente Médio pois seu pai possuía uma grande coleção de artefatos, inclusive múmias do Egito, em seu palácio. Eles estavam expostos no Museu Nacional antes da destruição neoliberal do golpe de Estado gerar um incêndio catastrófico que destruiu esse acervo. D. Pedro II então decidiu viajar para o Egito e aproveitou para conhecer a terra santa, a Palestina.
Seus relatos são muito bonitos e mostram, contra a versão dos sionistas, como o país já possuía uma cultura riquíssima antes da dominação dos ingleses no século XX. Em determinado momento ele escreve o que viu no mais alto pico da Palestina.
“O caminho é apenas praticável para as pernas destes cavalos. Gastei ¾ até o cimo. Que vista admirável desse ponto, o mais elevado da Palestina! Está a 1.000 pés acima da planície.
No cimo, com ½ km de comprimento e 600 a 800 m de largura, há ruínas de fortificações de diversas épocas, sendo as mais antigas dos romanos e de uma igreja do tempo de Santa Helena, de que me deram pedaços de mosaico. Há bastante a estudar em todos estes restos. Descendo-se nos da igreja, chega-se a uma cripta por uma escada de 12 degraus.
Acha-se pegada a pequena capela dos frades de Nazaré. Fiz oração aí e depois percorri tudo, gozando sobretudo da vista, que se estende até parte do Mediterrâneo por detrás das montanhas do Carmelo. Girando para a esquerda, enxergam-se as aldeias de Naim e de Endor, os montes de Galaad perto do lago de Genezaré, as montanhas do Hermon e, ao longe, Safed, dependurada e coberta de nuvens.”
É um belissimo relato desta terra que ainda não havia passado pela monstruosidade que foi a limpeza étnica sionista em 1948. Naquele momento os europeus, principalmente cristãos, tinham muito interesse em descobrir onde foram os locais em que aconteceram as histórias da Bíblia. Abraão, por exemplo, viveu em Hebrom, hoje na Cisjordânia ocupada. Já Josué adentrou a Palestina por Jericó, próxima ao rio Jordão.
O imperador cita isso em seu diário: “vi, a leste, o Tabor, sobre o qual Jeremias diz: ‘juro por mim mesmo, diz o rei que se chama Senhor dos Exércitos, que Nabucodonosor, em sua vinda, assemelhar-se-á ao Tabor entre as montanhas e ao Carmelo, que olha para o mar’. (Jer. 47,18)”
Em determinado momento ele se encontra com a comunidade judaica, que sempre viveu na Palestina ao lado dos cristãos e dos muçulmanos, e diz: “cheguei à sinagoga, encravada entre as casas da cidade. É pequena. Fiquei à porta enquanto homens e meninos, todos vestidos de branco, rezavam dentro. Poucos minutos depois, convidaram-me a entrar. A sinagoga, menos que modesta, recebe luz de cima por dois óculos gradeados. A meu pedido, trouxeram o Torá para fora da sinagoga, onde havia mais claridade. Examinei bem o manuscrito, feito em pele de gazela, já meio rasgado e com as letras bastante apagadas”.
E logo em seguida ele relata que: “depois, vi uma porta de pedra original, notável sobretudo por um capitel adornado com um leão e uma espécie de ave — infelizmente pintada de diversas cores. Essa porta dá entrada a uma mesquita de colunas, também besuntadas de tinta, e que pertenceram à igreja erguida no local durante o tempo das Cruzadas”. Só por esse curto relato fica claro a coexistência das religiões, mesmo sob o domínio muçulmano, e como a terra tem uma longa história de diversos povos que por lá passaram.
Em diversos momentos ele passa por Jerusalém: “Pela manhã, acompanhei as muralhas de Jerusalém, observando a Porta de Damasco, por onde entrei ontem. Dobrei a torre chamada de Godofredo de Bulhões, assim nomeada por ter sido ali aberta a brecha que lhe permitiu ingressar na cidade. De longe, avistei as portas de Santo Estevão e Auser, deixando à direita o túmulo pontiagudo de Absalão. Pouco antes das 7, avistei, abaixo desse pequeno terraço, o lugar onde estaria a figueira amaldiçoada por Cristo. Curiosamente, outra figueira ali presente exibia suas folhas encarquilhadas”.
Todos esses relatos estão disponíveis no portal do Museu Imperial nos volumes 17, 18 e 19 dos relatos de viagem do imperador. Toda a obra é muito interessante e a impressão de D Pedro sobre a Palestina é muito bonita. Ele elogia muito a terra, a beleza das planícies e dos montes. Há também o aspecto religioso do cristão que visita a Terra Santa. É talvez o relato mais antigo de um brasileiro que viajou à Palestina.
Quando D. Pedro II está para sair da palestina após dias de viagem ele descreve como já em 1876 o país adentrava o mundo moderno: “quando o vapor seguiu pela primeira vez, ouvi o assobio de um barco que vinha em sua direção, mas logo retornou. O vapor parou e assobiou, porém o barco pareceu não ter nada de importante a comunicar, pois não voltou, apesar dos repetidos assobios do vapor. Em Jafa, há um farol cuja luz intermitente, à primeira vista, me pareceu luz elétrica. O vapor navega estável, e espero que cheguemos a Port-Said [Egito] antes do meio-dia de amanhã, sem o menor incômodo. Foi na planície de Saron — mais precisamente nos limites entre Israel e a terra dos filisteus — que Sansão, para incendiar-lhes as searas, soltou raposas com fachos acesos amarrados às caudas”.
O sionismo é um movimento tão reacionário e nazista que criou a ideia de uma “terra sem povo para um povo sem terra”. A divulgação dos relatos de D Pedro, 70 anos antes da criação do Estado de “Israel” se tornam uma arma contra o sionismo.