Em artigo publicado no portal Poder360 e intitulado O crime organizado ganhou com o recuo do governo no Pixgate, o auditor fiscal da Receita Federal e vice-presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil Kleber Cabral afirma que o recuo do governo, no caso Pix, foi “marcado por desinformação e erros de comunicação”, beneficiando “criminosos que se aproveitam de brechas no sistema financeiro para lavar dinheiro e movimentar recursos ilícitos”. Essa colocação é uma verdadeira pérola do pensamento burocrático.
Não apenas ignora os custos políticos da tentativa de ampliar a fiscalização sobre o Pix, mas também se sustenta em uma premissa reacionária: a de que a medida visava combater o crime organizado. E daí? Mesmo que fosse verdade, de que forma a população seria beneficiada com a lupa da Receita sobre suas movimentações financeiras?
Desde a infame “taxa das blusinhas”, a política econômica de Fernando Haddad tem sido nada menos que uma investida contra o bolso dos trabalhadores, enquanto o governo luta por reajustes salariais irrisórios e corta gastos sociais. Nesse cenário, é inevitável que a população desconfie de qualquer medida que, na prática, acaba prejudicando ainda mais os mais pobres.
A confusão nas justificativas apresentadas para a fiscalização do Pix é, por si só, uma prova de que nem Cabral e nem a equipe econômica têm clareza sobre os objetivos reais da medida. O que se sabe, contudo, é que a ojeriza popular contra Haddad chegou ao paroxismo. Se é verdade que notícias falsas ajudaram a criar um clima de pânico em torno do tema, isso é ainda mais grave para o ministro, pois evidencia como sua política rapace transformou o governo em alvo fácil de boatos. A permanência de Haddad no Ministério da Fazenda não é apenas um problema para o governo Lula, mas uma ameaça à sua própria estabilidade.
Kleber Cabral também tenta justificar a medida argumentando que “o Pix já faz parte das informações enviadas pelos bancos à Receita Federal por meio da E-Financeira desde 2020”, e que a novidade seria incluir bancos digitais e fintechs no monitoramento. Não seria essa mais uma demonstração de como a Receita Federal, como toda a burocracia, atua sem transparência para a população?
Mais importante, o inciso X do artigo 5º da Constituição Federal garante o sigilo bancário, direito que aparentemente não vale o papel em que foi escrito, a julgar pela naturalidade com que Cabral trata sua violação. A verdadeira tarefa de um governo democrático é garantir o respeito ao sigilo bancário e aos direitos democráticos da população, não acabar com eles sob pretexto de combater o crime, tal como faz a direita de conjunto, centrista ou extrema.
Diante das contradições geradas pelo capitalismo decadente, a vida social tende à violência. Caso o governo escolha atacar direitos democráticos sob o argumento de coibir crimes, não há outro destino que não o absurdo, como a solução à “analista de Bagé”: prender toda a população. Ao invés de se render a esse tipo de política autoritária, o governo deveria priorizar a criação de empregos, a melhoria das condições de vida e o respeito aos direitos fundamentais do povo brasileiro.
Cabral finaliza defendendo que “é crucial que o governo reconstrua a narrativa sobre o tema, destacando que o Pix sempre esteve sob monitoramento da Receita e explicando, de forma clara, que a inclusão de bancos digitais e fintechs é uma medida necessária para combater o crime organizado”. Para ele, “a sociedade precisa ser educada sobre como essas políticas não representam uma ameaça aos cidadãos de bem, mas um mecanismo para proteger o sistema financeiro brasileiro”.
Essa defesa burocrática ignora completamente a crise gerada pela tentativa de fiscalização, que não passa de mais um reflexo da política neoliberal adotada pelo governo. A pressão exercida sobre a classe trabalhadora, que já mal suporta a carga de impostos regressivos e a alta do custo de vida, é o verdadeiro fator desestabilizador.
Um pequeno-burguês pode se dar ao luxo de considerar essas medidas moralmente justificáveis, mas a classe trabalhadora brasileira sabe que o verdadeiro problema é a política rapace de Haddad, Simone Tebet, Geraldo Alckmin e Gabriel Galípolo. O que o Brasil precisa é de uma política econômica que ataque o neoliberalismo e garanta condições dignas para as famílias operárias, não de medidas que apenas ampliem a repressão e a exploração.