Entre diversos outros acontecimentos, o ano de 1982 foi marcante para a história dos povos árabes e do Oriente Médio contra a ocupação imperialista da Palestina, afinal, em abril desse ano, ocorreu a devolução da Península do Sinai ao Egito por parte de “Israel”. Este episódio foi resultado direto dos Acordos de Camp David, encerrando uma ocupação que remonta à Guerra dos Seis Dias de 1967. A devolução, entretanto, representou muito mais do que um simples ajuste territorial: simbolizou uma capitulação do Egito ao imperialismo e consolidou uma virada autoritária na política egípcia, cujos reflexos perduram até hoje.
A história da ocupação israelense no Sinai teve início em 1956, durante a Crise de Suez. Naquela ocasião, “Israel”, em coordenação com França e Reino Unido, invadiu a região em resposta à nacionalização do Canal de Suez pelo então presidente egípcio Gamal Abdel Nasser. O evento causou uma divisão no imperialismo e levou os EUA a se posicionarem contra a operação realizada pela ditadura sionista, obrigando “Israel” a retirar suas tropas em 1957.
Dez anos depois, em 1967, eclode a nova tentativa do nacionalismo árabe de por um fim ao enclave imperialista com a Guerra dos Seis Dias. O Sinai volta a ser ocupado em um movimento expansionista que resultou também na tomada da Faixa de Gaza, da Cisjordânia, de Jerusalém Oriental e das Colinas de Golã. A ocupação foi marcada pela construção de 18 colônias israelenses, abrigando milhares de civis, e pela instalação de bases militares.
A posição geográfica do Sinai, conectando África e Ásia e abrigando o crucial Canal de Suez, fez do território um ponto nevrálgico para o controle regional e também, para o comércio mundial. Durante os anos de ocupação, “Israel” promoveu intensos ataques contra cidades egípcias na região do canal, provocando destruição massiva e deslocando 700 mil egípcios nas estimativas mais conservadoras. Ao mesmo tempo, a exploração de recursos naturais, como o petróleo, serviu para financiar o esforço militar israelense.
As tentativas do Egito de recuperar o Sinai culminaram em uma guerra de atritos entre os anos 1967 e 1970, e posteriormente, na Guerra do Yom Kippur em 1973. Embora esta última tenha demonstrado a capacidade militar egípcia e não tenha sido ganha por “Israel”, mas interrompida por pressão dos países árabes que em retaliação, cortaram a produção de petróleo e jogaram o mundo na Primeira Crise do Petróleo, a derrota foi decisiva para o nacionalismo egípcio, que nunca mais se recuperará.
Com o regime egípcio já profundamente desmoralizado, seis anos depois, o presidente norte-americano Jimmy Carter consegue a que talvez seja a única vitória de seu governo: submeter o Egito a um acordo com “Israel”, firmado em Camp David. Pelo tratado, o Egito reconheceu formalmente o enclave imperialista como um país e comprometeu-se a manter o Sinai desmilitarizado, enquanto “Israel” concordou em retirar suas tropas e colônias da região.
Durante os 15 anos de ocupação, “Israel” construiu 18 assentamentos no Sinai, distribuídos ao longo da costa mediterrânea e do Golfo de Aqaba. Um dos principais assentamentos, Yamit, foi projetado para abrigar até 200 mil pessoas, mas sua população nunca ultrapassou 3 mil. Outros assentamentos notáveis incluíam Ofira (atual Sharm El-Sheikh), Di Zahav (Dahab) e Neviot (Nuweiba), que foram posteriormente incorporados ao turismo egípcio após a devolução.
A retirada dos colonos israelenses do Sinai foi um processo conturbado. Muitos resistiram à evacuação, com alguns colonos se recusando a sair voluntariamente.
Em Yamit, por exemplo, seguidores do rabino Meir Kahane chegaram a ameaçar suicídio em protesto contra a retirada. O exército israelense precisou demolir diversos assentamentos, incluindo toda a região de Yamit, para evitar qualquer possibilidade de retorno.
Além disso, bases aéreas, instalações militares e recursos petrolíferos foram desmantelados ou destruídos. O processo trouxe não apenas o fim da ocupação, mas também as tensões internas em “Israel”.
Apesar de ter garantido a devolução do Sinai, os Acordos de Camp David representaram um golpe fatal ao pan-arabismo promovido por Nasser e selaram o isolamento do Egito no mundo árabe. Países como a Síria e o Iraque condenaram o tratado, considerando-o uma traição à causa palestina e um alinhamento às potências imperialistas. O Egito, que antes liderava o movimento de resistência contra o sionismo, tornou-se um instrumento árabe da política sionista.
Internamente, o acordo consolidou uma nova fase de autoritarismo no Egito. O presidente egípcio responsável por assinar o acordo, Anwar Sadat, seria assassinado pouco depois e, em seu lugar, o governo egípcio cairia nas mãos do marechal Hosni Mubarak, responsável por reorganizar o país com uma ditadura militar criminosa. As derrotas do nacionalismo árabe culminaram em um regime repressivo, marcado por censura, prisões políticas e violência estatal. A Primavera Árabe de 2011 brevemente desafiou essa ordem, mas o golpe de 2013, liderado por Abdul Fatah Khalil Al-Sisi, restaurou o controle militar, mantendo o país em um ciclo de repressão e estagnação.