O governo Lula encerrou o exercício de 2024 com uma diminuição de 1,2% no total de famílias atendidas pelo Bolsa Família, acumulando um recuo de 3,7% desde o início do atual mandato. Tem sido amplamente repercutido na imprensa que o programa vem passando por um “pente-fino” desde 2023.
Austeridade para os mais pobres
No pacote de cortes fiscais, o ministro Fernando Haddad anunciou que o governo pretende reduzir os gastos públicos em R$70 bilhões nos próximos dois anos. Entre os cortes previstos estão políticas de atendimento à população, incluindo os benefícios sociais, como o Programa Bolsa Família (PBF).
Em 2024, o governo Lula encerrou o ano com 20,8 milhões de famílias beneficiadas pelo PBF, com um gasto médio de R$676 por família, totalizando R$168 bilhões no ano. Com o “pente-fino” aplicado em março de 2023, 673 mil famílias foram excluídas, reduzindo em 3,1% o total atendido.
O governo projeta reduzir o programa em R$2 bilhões por ano até 2026. Para alcançar essa meta, planeja evitar a inclusão de novas famílias e cortar 246 mil beneficiários adicionais.
No alvo
O foco dos cortes são principalmente as famílias unipessoais, que hoje somam 4,1 milhões entre os beneficiários. Desde o início do terceiro mandato de Lula, houve uma redução de 1,8 milhão de famílias nesse segmento.
Esse grupo cresceu significativamente durante o governo Bolsonaro, especialmente após a pandemia. À época, o número de famílias unipessoais atendidas passou de 1,8 milhão para 5,9 milhões.
Grande parte desses beneficiários foi composta por vítimas econômicas da pandemia. Assim, a política de austeridade do governo acaba atingindo justamente o setor mais desorganizado da classe trabalhadora, já gravemente prejudicado.
Demagogia eleitoral
Desde a criação do PBF, em 2003, todos os governos encerraram seus mandatos com um número maior de beneficiários do que o início. O programa, que começou atendendo pouco mais de 3 milhões de famílias, atingiu seu ápice em janeiro de 2023, com 21,9 milhões de famílias, um crescimento de seis vezes.
Essa expansão se intensifica principalmente nos períodos eleitorais. Todos os presidentes que buscaram a reeleição utilizaram a ampliação do programa para obter capital político.
“O governo não fará um corte expressivo no número de beneficiários por motivos políticos. É impossível um presidente fazer isso e se reeleger”, afirmou o economista Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre).
“Boom” no governo Bolsonaro
Houve dois momentos marcantes de expansão do programa. O primeiro ocorreu nos primeiros mandatos de Lula, quando o número de famílias atendidas passou de 3,6 milhões em janeiro de 2004 para 10,9 milhões em janeiro de 2007, um crescimento de quase três vezes.
O segundo grande salto ocorreu durante o governo Bolsonaro, com um aumento de 13,8 milhões para 21,9 milhões de famílias beneficiadas. Esse foi o maior crescimento nominal da história do programa, com 8,1 milhões de novas famílias incluídas.
PT acanhado
A política moderada do PT é exposta pela maneira como trata o Bolsa Família. Apesar de ser considerado o grande trunfo dos governos petistas, os números mostram que o programa pode ser implementado por qualquer governo, até mesmo de direita. Isso ocorre porque o Bolsa Família não representa um enfrentamento real com o neoliberalismo.
Bolsonaro do Bolsa Família
Outro aspecto desmoralizante para o PT é que os números do Bolsa Família durante o governo Bolsonaro superaram os três mandatos de Lula. Esse fato gera a impressão de que Bolsonaro foi mais favorável às políticas de assistência social do que os governos petistas.
Além disso, sob Bolsonaro, o valor do benefício também cresceu, reforçando a limitação da política do PT.
Teto de gastos e limitações
O principal motivo por trás desse cenário é a maior confiança da burguesia em Bolsonaro para extrapolar o teto de gastos. Essa relação permitiu que ele ampliasse o programa sem enfrentar maiores resistências.
Para atender às necessidades mínimas da população sem convulsões sociais, qualquer governo burguês é capaz de implementar políticas básicas de assistência, como o Bolsa Família.
Dinheiro público para os trabalhadores
Romper com a política de dívida pública e extrapolar o teto de gastos em favor dos trabalhadores exigiria uma verdadeira luta por parte do governo Lula e do PT. No entanto, essa batalha só seria possível com uma mobilização de massa e a organização da classe trabalhadora.
Sem espaço para hesitação
A hesitação e o medo do governo Lula em enfrentar a burguesia resultam em uma perda de apoio popular. Essa indecisão não apenas desmoraliza o governo, mas também joga a classe trabalhadora nos braços da extrema-direita.
Se o PT continuar adotando políticas de conciliação para atender a frente ampla, corre o risco de permitir que o governo Bolsonaro continue sendo visto como mais eficaz em assistência social, prejudicando ainda mais sua base política.