A obra clássica mais conhecida no planeta Terra é o Bolero de Ravel. O que há de tão interessante nela? Ora, sua orquestração. Se alguém quer saber como se combina timbres, o Bolero é uma aula.
A obra toda gira em torno de apenas duas frases musicais, um ritmo único, e um constante crescendo que finaliza com uma súbita mudança de tom, um recurso necessário para finalizar a infindável repetição dos dois temas. Caso contrário, a obra prosseguiria infinitamente.
E há um momento no Bolero que é excepcionalmente interessante. Acontece aos 6:29 minutos do vídeo abaixo. É quando o pícolo toca num tom diferente do tom da música. Você poderia dizer que dois instrumentos tocando em tons diferentes causaria uma dissonância insuportável. Não necessariamente. Quando você toca apenas uma corda de seu violão, as outras vibram em tons diferentes. É o que chamamos de harmônicos. Os harmônicos (mesmo em tons diferentes) não agridem o ouvido humano. Pelo contrário, tudo que vibra produz harmônicos, e estamos acostumados com isso, e até achamos confortante e familiar. Sabendo disso, Ravel colocou o pícolo tocando numa das harmônicas do tom da música, criando uma “sensação orgânica” de estarmos escutando algo “natural”.