Coluna

Enchentes promoveram direitização nas prefeituras do RS

8 das 10 cidades mais atingidas têm prefeitos direitistas em 2025

Até agora, em janeiro de 2025, muitos devem estar perplexos sobre como um prefeito conseguiu se reeleger no Rio Grande do Sul após o desastre das enchentes em maio de 2024. Evidentemente, isso não é culpa apenas dos prefeitos, mas também do governador Eduardo Leite, que merece um outro artigo apenas para detalhar sua culpa. Fato é que dentre as 10 cidades mais atingidas pela enchente, quatro reelegeram prefeitos ou seus candidatos indicados, mostrando que não foi só Porto Alegre que manteve o grupo político que estava na prefeitura durante a enchente.

Mais importante ainda é que, quando houve mudança na prefeitura, a mudança quase sempre foi à direita. Dentre essas seis cidades mais afetadas que não reelegeram o mesmo grupo político, em cinco o candidato eleito foi do PL, partido de Bolsonaro. Assim, a enchente fez com que dentre as dez cidades mais afetadas, metade seja comandada pelo PL a partir de 2025 (Canoas, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Alvorada, e Esteio), duas sejam comandadas pelo PT (Pelotas e Rio Grande), uma seja comandada pelo MDB (Porto Alegre), uma seja comandada pelo PSDB (Eldorado do Sul), e uma pelo PDT (Guaíba). A rigor, oito prefeituras direitistas entre as 10 mais afetadas.

É seguro dizer que a enchente promoveu uma direitização política. Por que isso aconteceu? Principalmente por dois motivos: falta de chapas de esquerda combativas e ajudas dadas por direitistas durante a enchente. Analisemos o caso de Porto Alegre. A chapa que disputou o segundo turno contra Sebastião Melo (MDB) foi composta por Maria do Rosário (PT) e Tamyres Filgueira (PSOL). Dificilmente poderia haver uma chapa menos competitiva. Todos sabem que Maria do Rosário tem uma rejeição muito alta não só entre os gaúchos, mas em toda a população brasileira.

A cúpula petista que decidiu lançá-la como candidata apostou na vinda de Lula ao sul. Apostaram que a vitória de Lula na capital gaúcha em 2022 se converteria em vitória de Maria em 2024. Banho de água fria: Lula não veio para Porto Alegre nenhuma vez durante a campanha. Tentaram vender o papo furado de que Lula não veio, pois Sebastião Melo é do MDB, partido que está na base aliada do governo nacionalmente, e isso poderia gerar estremecimentos em Brasília. Conversa para boi dormir. O que de fato aconteceu foi que Lula rapidamente percebeu que Maria do Rosário perderia a eleição e ele não quis ser contaminado pela impopularidade tóxica dela.

A impopularidade dificilmente poderia ser revertida, especialmente porque Maria do Rosário se apresenta como candidata de esquerda, mas focou em pautas verdadeiramente direitistas durante todo o ano de 2024. Por exemplo, pouco antes da disputa pela prefeitura, ela votou no Congresso Nacional contra o direito dos presidiários de terem saída temporária, uma posição alinhada ao bolsonarismo. Logo ela, que ficou nacionalmente conhecida como “Maria do Presidiário” por sua suposta defesa dos apenados, dessa vez votou junto com o bolsonarismo. Será que ela achou que os bolsonaristas porto-alegrenses iriam escolhê-la como prefeita por causa desse voto?

Maria do Rosário também ficou reiteradamente acusando seu opositor de, pasmem, corrupção. Ela, mais que ninguém, deveria saber que essa pauta não teria efeito, pois ela só tem impacto quando alguém de direita acusa alguém de esquerda. A situação é mais surpreendente porque o partido de Rosário foi durante anos trucidado por campanhas supostamente anticorrupção, que diariamente veiculavam notícias nos principais jornais dizendo que o PT era um esgoto corrupto. Será que ela achou que o povo brasileiro iria esquecer toda essa propaganda e simplesmente levar a sério alguém do PT acusando outro político de corrupção?

Inúmeras outras tentativas de Maria do Rosário de ir à direita durante a eleição poderiam ser mencionadas. Ela reiteradamente defendeu a farsa do “empreendedorismo nas escolas”, não falou das arbitrariedades cometidas pela guarda municipal, não falou das benesses que o atual prefeito dá às grandes construtoras, não defendeu a regularização das ocupações na cidade, deixou de defender o passe-livre na capital gaúcha, enfim, mais parecia uma candidata do PSDB. Quem vai votar em alguém que se apresenta como de esquerda, mas tem esse discurso?

Além da estratégia eleitoral fracassada, o resultado também foi influenciado pelas ajudas que foram fornecidas durante a enchente. Muitas pessoas foram salvas de suas casas e apartamentos alagados através de barcos e jet skis. A maior parte desses barcos e jet skis não foram fornecidos pela prefeitura, estado, defesa civil ou qualquer outro órgão público, mas sim por pessoas comuns que tinham esses meios de transporte. Vale a pena refletir sobre a pergunta: quem possui barcos ou jet skis em casa? Seguramente não são pessoas pobres, mas sim pessoas com algum capital que, de forma não surpreendente, já estavam alinhadas ou foram cooptadas pelos apoiadores de Sebastião Melo.

Não são poucos os relatos de pessoas que foram resgatadas, e cooptadas politicamente. Durante a campanha eleitoral, cinco meses após as enchentes, muitos resgatadores fizeram chantagens para os resgatados votarem no Melo, com falas do tipo “salvei seu filho durante a enchente, você não vai votar em quem eu estou pedindo?”. É preciso muita convicção ideológica para não sucumbir ao pedido.

A pior parte é que não há futuro melhor à vista. Não temos nomes competitivos de esquerda nacionalmente além do Lula, tampouco temos no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre. A questão que deve nos preocupar é se a direitização das prefeituras levou também a uma direitização da população. É possível. Para combater isso precisamos fazer uma ampla campanha enérgica de mobilização popular, pois caso contrário, a esquerda seguirá sem rumo e os barcos nos levarão ao precipício.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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