Em artigo intitulado Bolsonaro já admite o óbvio: não escapará da cadeia e publicado no último dia 10 no portal de esquerda Brasil 247, o colunista do órgão Aquiles Lins defende que “condenar e prender Jair Bolsonaro por crimes contra a democracia não é apenas um ato de justiça; é um marco no fortalecimento das instituições”. Diz o autor:
“Condenar e prender Jair Bolsonaro por crimes contra a democracia não é apenas um ato de justiça; é um marco no fortalecimento das instituições brasileiras. Ao responsabilizar um ex-presidente por liderar uma tentativa de golpe, o Brasil reafirma que a lei vale para todos, independentemente de cargo ou influência política.”
Ora, e quais seriam esses crimes? Isso precisaria ser demonstrado. A Lei nº 14.197/2021, que supostamente revogou a famigerada Lei de Segurança Nacional (na prática, atualizou-a), estabelece em seu capítulo II, “crime contra as instituições democráticas”, o seguinte:
“Abolição violenta do Estado Democrático de Direito
Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.
Golpe de Estado
Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.”
À luz do que diz a lei, seria preciso à acusação provar algum dos cenários abaixo: 1) uma manifestação com idosos defecadores concretamente, impediu ou restringiu “o exercício dos poderes constitucionais”, lembrando que a manifestação ocorreu em Brasília e em um domingo; 2) a manifestação de idosos defecadores ocupou prédios públicos vazios em um domingo para destituir o recém-empossado governante que nem lá estava, ainda que terminada a manifestação e seguindo o roteiro normal de todas as manifestações, os participantes tenham ido embora para suas casas após um determinado horário.
Muito se tem dito sobre planos mirabolantes ao melhor estilo “Plano Cohen”, porém concretamente, o Brasil não viu nada além de um grupo de direitistas radicalizados fazendo uma manifestação, como centenas de outras manifestações já ocorridas. É preciso destacar ainda que não são apenas a grande massa despolitizada ou os bolsonaristas, mas mesmo entre apoiadores do presidente Lula, a ideia de que no dia 8 de janeiro de 2023 houve algo além de um ato mais radicalizado não faz sentido.
Passados dois anos desde o ocorrido, poucas pessoas fora um círculo muito limitado de esquerdistas pequeno-burgueses acreditam que houve uma tentativa frustrada de golpe de Estado na ocasião. Ocorre que dessa percepção destoante, temos um desenvolvimento que traz o problema mais impactante para a luta política e que aparece no parágrafo a seguir:
“A história recente de outros países mostra que punições rigorosas a líderes que atentam contra a democracia ajudam a consolidar as bases democráticas, mas também podem gerar polarizações. No caso brasileiro, a eventual prisão de Bolsonaro poderá fortalecer a credibilidade das instituições e enviar uma mensagem clara de que não há espaço para aventuras autoritárias.”
Mais uma vez, Lins deveria demonstrar o que está dizendo de maneira mais concreta. Ele não o faz e nem poderia, porque a única coisa real (embora problemática para seu argumento) no que diz é o fato de que essa tática radicaliza o campo atingido acontecem.
Isso já foi positivo para a esquerda, quando o alvo da “punição rigorosa a líderes” era o presidente Lula, que em 2018, teria vencido as eleições presidenciais de dentro da cadeia caso não fosse ilegalmente proscrito da disputa, mas também está no centro da vitoriosa campanha eleitoral do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, que ganhou as eleições de levada no país, entre outros motivos, por causa da perseguição sofrida, responsável inclusive por um apoio histórico da população negra norte-americana ao futuro mandatário.
Mesmo no Brasil, tivemos uma demonstração de quão acertada está a tese de Lins, de que uma “eventual prisão de Bolsonaro poderá fortalecer a credibilidade das instituições e enviar uma mensagem clara de que não há espaço para aventuras autoritárias”, observado nas eleições municipais deste ano. Enquanto a direita tradicional e a esquerda conquistaram basicamente os grotões brasileiros (com o PT conquistando apenas uma capital), ao passo que o bolsonarismo governará todas as capitais do Centro-Sul brasileiro, a região mais economicamente mais dinâmica e por isso mesmo, com maior capacidade de influenciar o resto do País.
“No próximo dia 8 de janeiro de 2026, espera-se que Jair Bolsonaro esteja preso, cumprindo pena por seus crimes contra o Estado Democrático de Direito. Essa data, que já é simbólica, pode marcar não apenas a lembrança de um ataque, mas também a reafirmação de que o Brasil não tolera atentados à democracia. Uma democracia forte é aquela que pune seus transgressores, independentemente de sua posição ou passado. Que esse futuro se concretize como um marco da justiça e da resiliência democrática brasileira.”
Dado o que a realidade do mundo e das eleições municipais brasileiras têm apresentado, se por acaso acontecer de termos um “8 de janeiro de 2026” com Bolsonaro “preso”, a esquerda deve se preparar para uma conjuntura similar a de 2018, porém com uma esquerda desmoralizada e uma extrema direita fortalecida pelo fator “mártir”. Lins e os setores da esquerda que por acaso querem ver Bolsonaro atropelando o País nas eleições de 2026, por outro lado, devem fazer exatamente o que estão fazendo: abandonar completamente a luta política, a mobilização popular e reivindicar a ação do corrupto poder judiciário contra ele e a extrema direita. No Brasil e no mundo, deu certo para a extrema direita até aqui e não há razão para acreditar que será diferente agora.