No final de 2024, dois artigos publicados em jornais diferentes, com 24 horas de diferença de um para o outro, chamaram bastante a atenção. O mais antigo deles é o da Folha de S.Paulo, publicado no dia 25 de dezembro, de título Lava Jato tem ano com série de derrotas no STF e derrubada de atos no atacado. O segundo deles, publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo no dia seguinte, carrega como título Livre, leve e solto.
O conteúdo é o mesmo. Trata-se de uma lamentação pelo fato de que a Operação Lava Jato, que teve seu auge entre 2014 e 2018, caiu na total desmoralização. Em uma narração calhorda, mostrando-se indignado com a restituição dos direitos políticos de José Dirceu (PT), o Estadão culpa os promotores pela ruína da Lava Jato:
“Ninguém minimamente bem informado sobre o que aconteceu no Brasil nos últimos anos haverá de negar que os procuradores da Lava Jato decerto cometeram muitos erros processuais, para dizer o mínimo, em nome do que entendiam ser um “bem maior”, qual seja, a purgação da política por meio do enfrentamento à corrupção com todos os instrumentos que tinham à mão, fossem legais ou não. Aí está o resultado desse messianismo. Sem que a culpabilidade de condenados por corrupção, muitos deles réus confessos, fosse posta em xeque do ponto de vista factual, quase todos os criminosos envolvidos no “petrolão” foram exonerados de prestar contas à Justiça e hoje podem posar de inocentes. Dirceu é a face mais conhecida desse tapa na cara do Brasil honesto.”
Nenhuma preocupação, portanto, com a destruição da presunção de inocência, com a legalização da tortura por meio da delação premiada ou com a devastação econômica. Para o Estadão, o único erro da Lava Jato teria sido o de não tomar cuidado com o rito processual e, assim, permitir que os processos fossem anulados.
A matéria da Folha vai no mesmo sentido. No entanto, se preocupa menos em culpar os promotores e mais em acusar diretamente o Supremo Tribunal Federal (STF) pelos reveses sofridos pela Lava Jato. Para isso, o jornal cita uma tal de Luisa Ferreira, professora de direito penal e processo penal da FGV Direito SP: “o que me parece estranho dessa atuação mais recente do ministro Dias Toffoli são essas canetadas que me parecem muito largas, essas afirmações que me parecem um pouco exageradas”.
A lamentação da imprensa burguesa não deixa margem para dúvidas do que a burguesia pensa acerca dos métodos antidemocráticos da Lava Jato: eles deveriam ser parte do regime político. Essa constatação, no momento pelo qual o País passa, é bastante perigosa.
Com tantas coisas com o que se preocupar, não haveria sentido em a burguesia sair em defesa da Lava Jato se não tivesse um plano para o futuro próximo. Na medida em que a pressão contra o governo Lula chega a níveis inéditos, escancarada na questão do pacote fiscal e da taxa de juros, os elogios à Lava Jato só podem ser um mau sinal do que pode vir pela frente.