O diretor da Fundação Perseu Abramo e membro da Direção do PT, Alberto Cantalice, assinou um artigo intitulado O sucesso da economia nacional derrotará a extrema direita e publicado no portal de esquerda Brasil 247, defendendo a política econômica de terra arrasada do ministro da Economia, Fernando Haddad, dedicada a cortar despesas com a mitigação da miséria no País e, por isso mesmo, em atendimento aos interesses dos banqueiros.
Em seu artigo, o dirigente diz que “toda a preocupação do presidente da República e do seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é com o equilíbrio das contas públicas”, uma declaração surpreendente, uma vez que, nas eleições presidenciais, o partido do qual Cantalice é dirigente defendia outra política, “colocar o pobre no Orçamento e o rico no sistema tributário”. O petista, no entanto, destaca:
“Em recente entrevista ao Programa Fantástico, da Rede Globo, o presidente Lula asseverou: ‘Ninguém no mercado tem mais responsabilidade fiscal do que eu’. Mais do que uma frase de efeito, o que Lula disse para a jornalista Sônia Bridi é a expressão da verdade.
Basta cotejar as realizações de seus governos, tanto na área econômica quanto na área social, para se vislumbrar a sua assertiva. Toda a preocupação do presidente da República e do seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é com o equilíbrio das contas públicas. Essa preocupação foi o que motivou, ainda no final de 2022, a aprovação da PEC da Transição.”
Em primeiro lugar e para evitar confusões, é preciso lembrar que a PEC da Transição foi feita durante o governo Bolsonaro, sob um orçamento que não foi elaborado pelo governo Lula, portanto. Se é verdade que o governo Bolsonaro tornou necessário uma PEC para garantir a continuidade dos programas assistencialistas, é de se questionar se esse é o parâmetro de Cantalice: um governo golpista, inimigo dos trabalhadores e dedicado à manutenção do esquema criminoso do assalto aos cofres públicos, realizado pelos banqueiros contra a população, sob o pretexto de garantir o pagamento dos juros da dívida pública, custe o que custar.
Essa, concretamente, é a política por trás do “equilíbrio das contas públicas” defendido pela direita, incluindo os setores direitistas do PT, onde se localizam o ministro Fernando Haddad e também Cantalice. Atualmente, cerca de metade do Orçamento Federal é destinado a essa rapina. Para manter a sustentabilidade dessa mamata, a direita derrubou a presidenta Dilma Rousseff em 2016, prendeu Lula e o tirou das eleições presidenciais em 2018 e, hoje, assedia o Palácio do Planalto pelo corte das despesas que garantam um suposto equilíbrio, dedicado única e exclusivamente a permitir que tal pirataria se mantenha.
Quando fala em “ajuste nas contas para cumprir o binômio responsabilidade e previsibilidade, que tem sido a tônica do atual governo desde a posse, em janeiro de 2023”, é exatamente essa política que Cantalice defende, a mesma, por sinal, que empurrou tanto Michel Temer quanto Jair Bolsonaro à Presidência da República.
Ocorre que não foi para “cumprir o binômio responsabilidade e previsibilidade” que a classe trabalhadora elegeu Lula em 2022. O que garantiu a vitória do presidente foi a defesa dos interesses populares como salários maiores, um programa de desenvolvimento econômico que aumente a oferta de empregos, direitos como a aposentadoria e garantias contra a miséria produzida pelos seis anos de governos golpistas. Interesses que, se forem atendidos, fatalmente produzirão um choque com os banqueiros, donos da outra metade do orçamento. Quando a direita e papagaios direitistas na esquerda falam em “responsabilidade”, é contra esse segundo conjunto de interesses que se posicionam.
É óbvio, porém, que o “mercado” (eufemismo usado pela direita e a esquerda pequeno-burguesa para se referir aos banqueiros), mesmo atendido pelo Plano Haddad, manterá sua pressão contra o governo Lula, que, sabidamente, não tem condições políticas de atender aos interesses dessa corja de criminosos. O direitismo de Cantalice, porém, é tamanho que até para identificar quem são esses inimigos do povo, seu artigo falha:
“O mercado financeiro, ao especular contra o real, flerta com a insatisfação popular. Entretanto, como um setor minoritário da sociedade civil e, inclusive, do mundo empresarial, eles sabem que a hora de coçar o bolso se aproxima — e é isso que eles temem.
Já o extremismo direitista, envolvido até o último fio de cabelo na trama golpista, se agarra na especulação rentista como tábua de salvação. Não adiantará! A solidez da economia os derrotará.”
Não é o “extremismo direitista” o inimigo do governo Lula, mas a direita de conjunto, especialmente a ala centrista, falida politicamente, mas ainda não enterrada devido à loucura de uma parte da esquerda, que dá guarida a esse setor sob o rótulo da Frente Ampla. Sendo um defensor dessa aliança derrotista, Cantalice não faz outra coisa além de defender o programa do “mercado”, que, finalmente, é o programa da direita tradicional e é o que foi proposto pelo Plano Haddad.
Ao contrário do que fantasia o dirigente petista, porém, a manutenção desse alinhamento político não produzirá a derrota da direita, mas a do governo Lula, que segue travado na tentativa de aplicar o seu próprio programa, uma situação que permanecerá enquanto essa política econômica não for derrotada e der lugar a um programa que satisfaça os interesses dos trabalhadores.