Nesta terça-feira (3), o presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, decretou uma lei marcial no país durante um pronunciamento surpresa em rede de televisão. Yoon afirmou que a decisão era necessária para proteger o país das forças comunistas da Coreia do Norte e proteger a “ordem constitucional liberal da República da Coreia”.
A declaração de lei marcial é a primeira desde 1979, quando foi implementada após o assassinato do então ditador Park Chung Hee. Yoon, que tem enfrentado baixos índices de aprovação devido a escândalos envolvendo seu governo, justificou a medida afirmando que era essencial para restaurar a ordem diante de forças que estariam tentando paralisar o país. Após o anúncio, o exército sul-coreano impôs restrições significativas, incluindo a suspensão de todas as atividades parlamentares. A agência de notícias Yonhap informou que os membros da Assembleia Nacional foram proibidos de acessar o prédio do parlamento. Além disso, a polícia foi deslocada para bloquear a entrada da Assembleia Nacional em Seul.
A oposição, liderada por Lee Jae-myung, presidente do Partido Democrático, condenou a declaração de lei marcial, chamando-a de inconstitucional. Lee pediu que os membros de seu partido se reunissem na Assembleia Nacional para tentar reverter a medida. Ele também convocou manifestações públicas em frente à Assembleia. O Partido do Poder Popular (PPP), ao qual o presidente Yoon pertence, também se opôs à declaração, com o líder do partido, Han Dong-hoon, descrevendo a medida como “errada” e prometendo bloquear a sua implementação.
Com a implementação da lei marcial, o governo tomou medidas que permitem a prisão sem mandato para aqueles que violarem a lei. Todos os meios de comunicação e publicações ficaram sob o comando da lei marcial. Além disso, o pessoal médico, incluindo médicos em treinamento, foi ordenado a retornar ao trabalho em até 48 horas.
Segundo a lei sul-coreana, o presidente deve suspender imediatamente a lei marcial se o parlamento exigir por maioria de votos. Os parlamentares se reuniram para votar a lei marcial em clima bastante tenso. Imagens de televisão ao vivo mostraram tropas com capacetes aparentemente encarregadas de impor a lei marcial tentando entrar no prédio da Assembleia Nacional. Assessores parlamentares foram vistos tentando empurrar os soldados para trás pulverizando extintores de incêndio.
“Esta declaração é ilegal e constitui um ato criminoso, violando diretamente a Constituição e outras leis”, disse o Partido Democrata. “É essencialmente um golpe de estado”.
Pouco depois de Yoon fazer seu anúncio, as pessoas começaram a se reunir do lado de fora do prédio do parlamento, algumas delas gritando: “retirem a lei marcial de emergência!”, “prendam Yoon Suk Yeol”.
Todos os 190 legisladores que participaram da votação apoiaram a suspensão da lei marcial. Imagens de televisão mostraram soldados que estavam estacionados no parlamento deixando o local após a votação. Até o fechamento desta edição, ainda não havia uma definição se a lei marcial seria cumprida pelos militares ou não. O premiê, no entanto, prometeu cancelar a medida quando reunir seu gabinete, promessa que não possui nenhuma garantia de que será cumprida.
A crise política ocorre em meio a um cenário instável, no qual o presidente Yoon tem enfrentado dificuldades para aprovar leis e lida com escândalos envolvendo sua esposa. Recentemente, a oposição cortou o orçamento proposto pelo governo e iniciou um processo de impeachment contra membros do gabinete, incluindo o chefe da agência de auditoria do governo, devido à alegada falha em investigar as acusações contra a primeira-dama.
A suspensão dos direitos políticos da oposição, por parte do presidente Yoon, é o que pode ser chamado de um “autogolpe”. Isto é, um golpe de Estado vindo de dentro do próprio governo para suprimir as instituições e adquirir um poder de tipo ditatorial.
O caso mostra, em primeiro lugar, que a situação interna da Coreia do Sul é bastante grave. E não se trata de qualquer país: a Coreia do Sul é uma peça-chave do imperialismo para manter a sua pressão sobre a Coreia do Norte e sobre a China. O autogolpe de Yoon é, no final das contas, uma demonstração de fraqueza do regime sul-coreano em meio ao crescimento das hostilidades com a Coreia do Norte, indicando que o imperialismo terá muita dificuldade de levar adiante uma campanha contra os seus inimigos na Ásia.
Há pouco mais de um mês, a Coreia do Norte explodiu rodovias e pontes que ligavam o país à Coreia do Sul, em reposta às provocações do governo de Yoon. No mesmo período, a Rússia fortaleceu a sua aliança com o governo de Kim Jong-Un, explicitando a participação da Coreia do Norte no embate entre o imperialismo e o bloco comandado por Rússia e China.
O autogolpe também comprova que os golpes de Estado são uma tendência geral da situação política. Essa é a orientação do imperialismo, que se encontra em uma contraofensiva no mundo inteiro. Nos últimos meses, ocorreram golpes e tentativas de golpes em dezenas de países, como Honduras, Colômbia, Bangladexe, Geórgia, Moldávia, República Democrática do Congo, Venezuela e Turquia.
A tendência golpista põe às claras que o imperialismo nada tem de democrático. Chamou a atenção, inclusive, que, diante do golpe escancarado de Yoon, a Casa Branca emitiu um mero comunicado afirmando que estava “acompanhando de perto” os acontecimentos. Fosse na Venezuela, já teria enviado tropas para invadir o país.